Presidente chegou a dizer anteriormente que considerava ‘grave’ negociação sigilosa com líderes políticos
MARIANNA HOLANDA E RENATO MACHADO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Apesar das seguidas declarações de que só faria negociações “à luz do dia”, o presidente Lula (PT) passou a adotar algumas táticas para esconder reuniões em que trata da reforma ministerial, em particular com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Esses encontros têm ocorrido à noite, fora da agenda dos dois chefes de Poderes, que chegam a dispensar seus comboios de segurança e a usar carros “à paisana” para não serem notados.
A atitude lembra a do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que enviava comboios de vários carros a determinados locais, sem que estivesse presente, para despistar a imprensa. Bolsonaro era criticado por petistas pela falta de transparência nas agendas.
Os procedimentos adotados pelo Palácio do Planalto contrariam declarações de Lula, que sempre afirmou que faria todas as negociações com transparência e que não queria “conversa secreta”.
“No momento certo, nós vamos conversar [com Lira e líderes partidários] da forma mais tranquila possível. Eu não quero conversa escondida. Eu não quero conversa secreta”, afirmou o presidente em entrevista à TV Record, no dia 13 de julho.
“Na hora que voltar o Congresso Nacional, que for juntar os líderes dos partidos que eu vou conversar, toda a imprensa vai ficar sabendo o que que eu conversei com cada um, o que foi ofertado para a participação do governo e o que o governo quer estabelecer de relação com o Congresso até o final do mandato”, completou o presidente na mesma entrevista.
Lula então acrescentou que é “grave” quando os encontros não são feitos com transparência. E ainda disse que preferia fazer as tratativas à luz do dia, até para que todos soubessem da verdade e alguns jornalistas não precisassem “ficar inventando fonte”.
“O que é grave é quando você passa a ideia de que é secreto. Aí você já cria a tese da suspeição. E nunca é bom você viver sob suspeição. Por isso, é importante a gente fazer acordo à luz do dia”, completou.
O presidente repetiu essa defesa pela transparência no dia 25 de julho, durante a sua transmissão semanal, o Conversa com o Presidente. Disse que tem interesse que “toda a imprensa saiba” quando ele se reunir com lideranças para tratar de cargos no governo federal.
Lula ainda disse na mesma transmissão que “não tem conversa sigilosa na minha vida política”.
O encontro mais recente aconteceu na noite de quarta-feira (16), na residência oficial da Câmara dos Deputados. Foi confirmado nos bastidores por assessores palacianos, mas oficialmente os dois lados silenciaram. Nem confirmaram nem negaram.
A reunião aconteceu em meio às negociações para destravar a reforma ministerial, que Lula pretendia concluir antes de viajar para a África do Sul, para a cúpula dos Brics. O mandatário embarcou no domingo (20) à noite.
A dificuldade está em encontrar um lugar para André Fufuca (PP-MA) e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), que já foram confirmados oficialmente no governo, mas sem definição em quais pastas. A semana terminou sem desfecho para a novela.
Naquele dia, o presidente deixou o Palácio do Planalto no início da noite, por volta das 19h20, mas não seguiu para o Palácio da Alvorada um trajeto que levaria menos de cinco minutos.
Jornalistas que estavam em frente à casa de Lira viram entrar e sair um único carro, de um modelo parecido ao usado pela Presidência para as principais autoridades. Cerca de 15 minutos após a saída desse veículo, o comboio presidencial finalmente chegou ao Alvorada, por volta das 20h40.
Assessores palacianos confirmam que o encontro aconteceu nesse intervalo de tempo. Embora não revelem como foi a operação, a suspeita é de que Lula tenha trocado de veículo em algum lugar no meio do caminho.
O chefe do Executivo também recebeu o presidente da Câmara e principal interlocutor do centrão duas vezes no Palácio da Alvorada à noite. Em nenhuma das vezes os encontros estiveram nas agendas das autoridades.
No último dia 2, a reunião chegou a ser negada inicialmente pela assessoria do presidente. Lula recebeu Lira em casa, discutiram política, tomaram uísque, o petista deu sua palavra de que entregaria ministérios ao PP e ao Republicanos mas não disse quais.
Lira também chegou ao Palácio da Alvorada sem o seu tradicional comboio de segurança.
No início do ano, o primeiro encontro do chefe do Executivo com o presidente da Câmara aconteceu na casa do ministro da Secom, Paulo Pimenta, com os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Rui Costa (Casa Civil) e o líder do governo na Câmara, José Guimarães. No evento também informal, beberam e comeram churrasco.
O chefe do Executivo também já participou de um jantar na casa do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), com a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, e o então ministro indicado à corte Cristiano Zanin. O encontro ocorreu na véspera da posse do advogado do petista no Supremo, em 2 de agosto.
O Palácio do Planalto foi procurado, mas não se manifestou até a conclusão desta edição.