TORONTO, CANADÁ (FOLHAPRESS) – As maiores mineradoras do mundo têm expandido seus interesses pelo Brasil. O país abriga vários dos principais metais estratégicos para as próximas décadas e, aos poucos, as concorrentes da Vale estudam formas de ampliar presença no mercado brasileiro, seja na extração ou na comercialização de minerais.

A anglo-australiana Rio Tinto, por exemplo, a segunda maior mineradora do mundo, pesquisa a presença de lítio e titânio em Minas Gerais, além de níquel na Bahia e cobre em Mato Grosso. A empresa opera hoje no país por meio de suas joint ventures Mineração Rio do Norte e Alumar, que respectivamente extrai bauxita no Pará e produz alumina no Maranhão. A Rio Tinto tem 22% da MRN e 10% da Alumar.

A mineradora tem expandido suas operações na América do Sul para diversificar seu portfólio. Na quinta-feira (6), a empresa terminou o processo de compra de US$ 6,7 bilhões da Arcadium Lithium, que tem minas de lítio na Argentina. A empresa também opera uma joint venture para operar um projeto de cobre no Peru e outra com a BHP para extrair cobre no Chile.

“Há um esforço da Rio Tinto Exploration, que é nosso outro escritório no Brasil, para essencialmente explorar e encontrar bons projetos que se encaixem no perfil e no futuro da empresa”, diz Jamile Cruz, diretora de joint ventures da Rio Tinto e responsável pela mineradora no Brasil. “O Brasil, junto com Chile, Peru e Argentina, são países que estamos observando para o futuro.” Ela diz que o Brasil é estável e tem uma das melhores mão de obra do setor.

Segundo ela, porém, a Rio Tinto ainda não bateu o martelo sobre de onde virá a diversificação do portfólio da empresa no Brasil. Ela aponta que a indústria brasileira de lítio, por exemplo, está em fase inicial para que uma empresa do porte da Rio Tinto entre no mercado.

Por outro lado, a mineradora tem aumentado seu foco em cobre, um mineral essencial para resfriamento de data centers e eletrificação. Mas não há hoje muitos registros na ANM (Agência Nacional de Mineração) sobre pesquisas da empresa para encontrar o metal no Brasil, ainda que eventual extração pudesse vir de parcerias com outras companhias que já têm autorização do órgão regulador.

De qualquer forma, o caminho para essa fronteira não é fácil. Até porque as maiores jazidas conhecidas de cobre no país estão em Carajás, região paraense dominada pela Vale. Assim, a entrada de uma outra grande empresa na região dificilmente seria possível sem a anuência da mineradora brasileira, que é dona da infraestrutura necessária para exportar os minerais extraídos na região, como cobre, níquel e minério de ferro.

“Quando tratamos de expansão ou criação de um projeto ainda inexplorado, também temos que olhar para o custo de montar tudo isso. Podemos encontrar um corpo de minério incrível no Pará, mas para tirá-lo do solo, processá-lo e levá-lo a um porto é necessário um outro processo de licenciamento, além de um compromisso financeiro pesado”, diz Jamile. Na operação de minério de ferro da Vale, por exemplo, toda a infraestrutura é feita pela Vale no Pará, como ferrovia e portos.

Sua presença dominante no mercado brasileiro, aliás, não impediu que a maior mineradora do mundo, a australiana BHP, tentasse comprar no ano passado a Anglo American, dona de uma das maiores operações de minério de ferro do Brasil.

A oferta, que acabou sendo recusada pelos britânicos, aconteceu poucos meses após a Vale adquirir 15% das operações brasileiras de ferro da Anglo American, que extrai o minério em Conceição do Mato Dentro (MG) e o escoa para o porto do Açu por meio de um mineroduto próprio. Até por isso, a tentativa de compra foi classificada como audaciosa por um membro do conselho de administração da Vale por ter ocorrido “na nossa porta”.

Agora, o foco da Anglo American, uma das maiores mineradoras do mundo e segunda maior pagadora de royalties minerários no Brasil, está justamente nessa parceria com a mineradora brasileira. Em troca dos 15% (que podem chegar a 30% ao longo dos anos), a Vale cedeu aos britânicos o direito minerário de uma região ainda em exploração próxima ao complexo da Anglo, o que pode dobrar a capacidade de produção dos britânicos no Brasil para 50 milhões de toneladas de minério de ferro.

“Essa parceria é boa para vários aspectos. Primeiro para a região, porque ter duas empresas de mineração operando concomitantemente seria muito ruim, uma vez que a comunidade já nos conhece, sabe a cor do nosso uniforme e já sabe aonde ir para conversar”, diz Ana Sanches, CEO da Anglo American Brasil.

“Mas também ganha a Anglo, porque a gente tem a possibilidade de operar a mina por muitos anos. E ganha a Vale, porque seria muito difícil para ela licenciar e começar esse processo sozinha, numa região onde ela não tem nenhuma pegada”, acrescenta.

Em fevereiro, a Anglo American Brasil vendeu seus ativos de níquel em Goiás para uma empresa chinesa, se concentrando agora apenas no minério de ferro. “A Anglo sempre foi conhecida por ser uma mineradora diversificada, mas tomou a decisão de ter um portfólio mais reduzido, com foco em minério de ferro de alto teor, cobre e fertilizantes”, diz Ana.

Já a BHP, que ouviu a recusa da Anglo no ano passado, quer vender para agricultores brasileiros o potássio extraído em seu novo projeto no Canadá -o mineral é um dos principais insumos de fertilizantes. Hoje, a BHP está presente no Brasil por meio da Samarco, a joint venture com a Vale responsável pelo rompimento da barragem de Mariana em 2015, e pela OZ Minerals, dona de minas de cobre no Pará (os ativos da última estão sob revisão estratégica).

A mineradora quer diversificar seu portfólio, bastante atrelado a minério de ferro e cobre, e vê o potássio como principal alternativa. A ideia da BHP é vender entre 1 milhão e 2 milhões de toneladas de sulfato de potássio para o mercado brasileiro, que importa quase todo seu consumo do mineral.

O potássio será extraído em Saskatchewan, de onde a empresa espera produzir até 8,5 milhões de toneladas até 2031 –o que a colocaria como uma das maiores fabricantes do mundo.

“O potássio é muito ligado ao crescimento da população e à melhoria do padrão de vida, então ele traz um mistura interessante para o nosso portfólio. No Brasil, o foco é ter acesso ao setor de agricultura e formar parcerias com empresas que já estão atuando no mercado de fertilizantes”, diz Karina Gistelinck, presidente do setor de potássio da BHP. Ela aponta que a estratégia também permitirá à empresa diversificar sua base de clientes, hoje concentrada na China.

A venda de potássio para o Brasil faz parte da campanha da BHP para melhorar sua imagem no país, hoje bastante atrelada à tragédia de Mariana. “Ainda há muito trabalho a ser feito com a Samarco, mas acho que a gente vai poder ir para o próximo capítulo da BHP no Brasil”, diz Karina.

Produção e receita dos principais minerais extraídos

RIO TINTO

Minério de Ferro: 288 milhões de toneladas (US$ 29,3 bi)

Alumínio, alumina e bauxita: 69,6 milhões de toneladas (US$ 13,7 bi)

Cobre: 872 mil toneladas (US$ 9,3 bi)

A mineradora não divulga a receita específica de borato, diamante, ouro, lítio e titânio

ANGLO AMERICAN

Cobre: 773 mil toneladas (US$ 7,6 bi)

Platina: 3,5 milhões de onças (US$ 6 bi)

Minério de ferro: 60,8 milhões de toneladas (US$ 3,8 bi)

Diamante: 24,7 milhões de quilates (US$ 3,3 bi)

Níquel: 39 mil toneladas (US$ 646 milhões)

BHP

Minério de ferro: 260 milhões de toneladas (US$ 28 bi)

Cobre: 1,9 milhão de toneladas (US$ 18,6 bi)

Carvão: 60 milhões de toneladas (US$ 7,6 bi)

Níquel: 81,6 mil toneladas (US$ 1,5 bi)

Ainda não há produção de potássio

VALE

Minério de ferro: 307 milhões de toneladas (US$ 31,4 bi)

Níquel: 155 mil toneladas (US$ 3,7 bi)

Cobre: 250 mil toneladas (US$ 3,1 bi)

*Dados de 2024

O jornalista viajou a convite da Adimb