SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A relação entre Tarcísio de Freitas (Republicanos) e seu principal aliado político em São Paulo, Gilberto Kassab, presidente do PSD e secretário estadual de Governo, está desgastada.
A avaliação entre aliados do governador é que Kassab se expôs demais nas articulações para as eleições do ano que vem, contrariando o esforço de Tarcísio para se manter afastado publicamente do calendário eleitoral.
O governador vem dizendo, segundo relatos, que o presidente do PSD se vende como proprietário de uma influência no governo que ele não tem. No mês passado, o desprestígio ficou evidente durante um evento de Tarcísio com 600 prefeitos, em que o nome de Kassab foi omitido.
Tarcísio havia convidado os prefeitos paulistas recém-eleitos para um encontro no Palácio dos Bandeirantes, para transmitir a mensagem de que o governo está aberto a parcerias. Embora estivesse no palco, em meio aos demais secretários, o aliado não foi citado no discurso do governador.
Como secretário de Governo, é sua pasta que deve ser procurada para viabilizar convênios e parcerias com prefeituras.
O desgaste teve início depois das eleições municipais, nas quais Kassab saiu fortalecido. Seu partido levou 205 das 645 prefeituras paulistas e, segundo aliados, ele passou a buscar de forma mais enfática o posto de vice em uma chapa de reeleição de Tarcísio.
Até meados do ano passado, Kassab defendia que Tarcísio tentasse a reeleição em 2026, com ele como vice. O plano era que, em 2030, Tarcísio saísse para disputar a Presidência e Kassab assumisse o governo estadual, um projeto visto como seu grande objetivo político. O governador sempre evitou discutir a ideia em público, embora afirme que tentará a reeleição.
Já neste ano, contudo, o cenário eleitoral mudou. A queda de popularidade de Lula (PT) e a denúncia e a possibilidade de prisão de Jair Bolsonaro (PL) por liderar a tentativa de golpe levaram diversas lideranças políticas a apostar em uma candidatura presidencial de Tarcísio –o que desagrada Kassab.
Deputados estaduais e federais paulistas usam clichês como queimar a largada para descrever o momento atual de Kassab, que sempre foi considerado um habilidoso articulador político. Eles apontam que, agora, são nulas as chances de ele conseguir se manter como opção de vice, mesmo que Tarcísio tente a reeleição.
O apoio dado a Tarcísio em 2022 havia trazido recompensas a Kassab e o deixado em posição favorável. Além de chefiar a Secretaria de Governo, pasta responsável por liberar recursos para prefeituras, sua sigla ficou com secretarias estratégicas como Saúde, Habitação e Educação.
Foi com esse poder, na interpretação de uma série de deputados ouvidos pela Folha, que Kassab venceu em tantas cidades. Os prefeitos avaliaram que, no PSD, teriam mais facilidade de acesso aos cofres estaduais para seus projetos locais.
Contudo, tanto espaço criou atritos entre Tarcísio e os demais partidos já na largada do governo. PP, PL e Republicanos reivindicavam fatias da gestão sob controle do PSD e até legendas como União Brasil e PSDB pediam espaço.
Tarcísio, até aqui, defendia o aliado, destacando que Kassab lhe abriu uma série de portas na campanha. Aos interlocutores o governador ainda se refere ao aliado como uma pessoa que “comprou seu projeto”, que joga com o restante da equipe e por quem tem gratidão.
Mas, após o resultado das eleições municipais do ano passado, Tarcísio deu aval a aliados para conterem o crescimento de Kassab.
No fim do ano passado, após movimentações do PL e do Republicanos, a base governista na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) cortou de R$ 2,2 bilhões para R$ 900 milhões a verba da Secretaria de Governo.
Com a medida, segundo um deputado envolvido na articulação, se precisar de mais recursos, a secretaria terá de recorrer à Casa Civil, pasta controlada por Arthur Lima, braço direito de Tarcísio que, segundo aliados, tem uma disputa de poder com Kassab –algo que ambos negam.
Já no mês passado, Kassab criou um embaraço involuntário para Tarcísio, o que também contribuiu para o momento de desgaste.
Durante uma palestra em um banco de investimentos, comentando a queda de popularidade de Lula, Kassab chamou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), de “fraco” e disse que o PT perderia a eleição. A declaração foi interpretada como um indicativo de uma possível candidatura de Tarcísio ao Planalto.
Aliados bolsonaristas de Tarcísio questionaram se o próprio governador estava se movimentando nesse sentido, algo que ele nega enfaticamente. Na semana seguinte, Kassab teve de recuar. Ao jornal O Estado de S. Paulo, disse que era muito cedo para avaliar as chances de Lula e negou até que quisesse ser vice em São Paulo.
À Folha Kassab não comentou o desgaste com Tarcísio, mas negou que tenha usado sua influência no governo paulista para crescer e procurou destacar o perfil “de centro” do PSD, partido que nasceu quando o secretário era prefeito de São Paulo, não sendo “nem de esquerda, nem de direita”.
“As filiações ao PSD em São Paulo, como tem acontecido em todo o Brasil, não têm relação com minha participação no governo”, disse Kassab, em nota.
Ele disse que sua secretaria trabalha “sem preferência a prefeitos deste ou daquele partido”. “Somos um partido que se orgulha em ocupar o centro da política, com propostas e convicções, que não busca aderir a todos os governos a qualquer custo”, afirmou Kassab. Ele disse que pretende apoiar o governador do Paraná, Ratinho Junior, que se coloca à Presidência.
No texto, Kassab disse ainda que a candidatura de Tarcísio em 2022 também era de centro.
“A apuração [da Folha] é precisa ao afirmar que não tenho influência no governo e sobre o governador. Jamais disse isso”, continua Kassab.
Ele disse que Tarcísio “vai liderar o processo eleitoral em 2026, com total autonomia na definição das chapas”.