SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nesta terça-feira (4), a guerra comercial envolvendo estados Unidos, China, Canadá e México escalou, relembrando os conflitos tarifários do presidente americano Donald Trump em seu primeiro mandato (2017 a 2020).

Na atual disputa comercial, os EUA sobraram para 20% as tarifas sobre produtos chineses e impuseram tributo de 25% sobre importados dos dois países vizinhos, China e Canadá retaliaram os EUA, enquanto o México prometeu anunciar novas medidas no próximo domingo (9).

Em sua reposta, o governo chinês impôs tarifas de 15% sobre as importações de frango, trigo, milho e algodão americanos, e tarifas de 10% sobre outros alimentos, incluindo soja e produtos lácteos. Além disso, o Ministério do Comércio afirmou que 15 empresas dos EUA não poderiam mais comprar produtos da China, exceto com permissão especial, incluindo a Skydio, que é o maior fabricante americano de drones e um fornecedor para o exército dos EUA e serviços de emergência.

A atual guerra tarifária é uma reedição da guerra comercial que Trump travou com a China em sue primeiro mandato. Neste ano, Pequim repetiu sua resposta às tarifas que Trump impôs durante seu primeiro mandato. A China impôs tarifas sobre a soja americana em 2018 e transferiu grande parte de suas compras para o Brasil.

No entanto, a estratégia acabou se revertendo: Trump respondeu impondo mais tarifas sobre produtos chineses. Como a China vende muito mais para os Estados Unidos do que compra, rapidamente se esgotou o número de produtos americanos sobre os quais poderiam ser aplicadas tarifas. E os agricultores americanos tiveram algum sucesso em encontrar outros mercados para suas colheitas.

As tarifas da China em 2018 também tiveram menos impacto político nos Estados Unidos do que os líderes de Pequim esperavam. Nas eleições para o Senado de 2018 em três estados produtores de soja, os eleitores demonstraram pouca evidência de que atribuíram à China a culpa pelas ações de Trump ou do Partido Republicano. Todos os três estados viram senadores democratas serem substituídos por republicanos naquele ano, já que questões sociais se mostraram mais atraentes para muitos eleitores do que disputas comerciais.

No entanto, a China possui armas comerciais além das tarifas sobre alimentos. No início de fevereiro, Pequim implementou restrições às exportações de certos minerais críticos para os Estados Unidos, utilizados na produção de semicondutores e outros produtos tecnológicos.

Bloquear materiais essenciais para chegar aos Estados Unidos, uma tática conhecida como “guerra de cadeia de suprimentos”, traz riscos consideráveis para a China. Pequim está tendo dificuldades para atrair investimentos estrangeiros. Os líderes chineses também afirmaram que tentar fortalecer a economia doméstica do país, prejudicada pela queda do setor imobiliário, é uma prioridade.

Pequim poderia dificultar ainda mais o comércio de empresas americanas na China, mas isso também poderia prejudicar os investimentos estrangeiros. Além de efetivamente impedir que 15 empresas comprassem produtos chineses, o Ministério do Comércio da China adicionou outras 10 empresas americanas à sua “lista de entidades não confiáveis”, impedindo-as de fazer negócios na China.

Muitas das empresas penalizadas pela China na terça-feira são contratantes militares. Mas o Ministério do Comércio também bloqueou as importações da empresa de biotecnologia Illumina. Acusou a Illumina, com sede em San Diego, de violar regras de transações no mercado e discriminar empresas chinesas.

Os reguladores do mercado chinês afirmaram, no início de fevereiro, após Trump ter imposto tarifas, que haviam iniciado uma investigação antitruste sobre o Google. O Google está bloqueado da internet na China há mais de uma década, mas essa ação pode atrapalhar os negócios da empresa com empresas chinesas.

Lou sinalizou a emergente estratégia do país em lidar com as tarifas de Trump, pedindo relações comerciais mais estreitas com a Europa.

“A China e a Europa podem complementar as forças uma da outra e alcançar benefícios mútuos em muitas áreas de cooperação”, disse ele em uma coletiva de imprensa antes da abertura, na quarta-feira, da sessão anual de uma semana da legislatura chinesa.

Mas a Europa tem suas próprias disputas comerciais com a China, notadamente sobre veículos elétricos. Políticos e líderes empresariais europeus expressaram preocupação sobre como lidar com a esperada inundação de exportações da China este ano, que iniciou um programa abrangente de construção de fábricas.

A ascensão rápida da China desde 2000 à preeminência global na manufatura, com um terço da produção mundial, ocorreu em grande parte à custa da participação americana na produção industrial global, segundo dados das Nações Unidas. Os países europeus têm receio de fechar fábricas e depender de importações de baixo custo da China.

Galeria Produtos importados chineses sobretaxados nos EUA Veja alguns produtos da China que foram alvo de tarifas por parte dos EUA https://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/nova/1603369251880869-produtos-chineses-tarifados *** Trump agiu muito mais rápido nas tarifas sobre a China durante seu segundo mandato do que fez no primeiro. Em 2018 e 2019, impôs tarifas de até 25%, de forma gradual, sobre importações no valor de cerca de US$ 300 bilhões por ano. Ele então concluiu um acordo comercial com a China em janeiro de 2020, mantendo as tarifas de 25% sobre muitos produtos industriais, enquanto reduzia as tarifas de 15% sobre alguns produtos de consumo para 7,5% e cancelava algumas outras tarifas.

Em contraste, Trump agora impôs tarifas de 20% sobre todos os produtos que os Estados Unidos importam da China, no valor de cerca de US$ 440 bilhões por ano. Isso inclui alguns produtos, como smartphones, que ele havia deixado de fora durante seu primeiro mandato.

As ações de Trump neste ano elevaram as tarifas médias sobre as importações chinesas afetadas para 39% — em comparação com apenas 3% antes de ele assumir o cargo em 2017. Além da China, Canadá e México, os Estados Unidos impõem tarifas médias de cerca de 3% sobre a maioria dos parceiros comerciais.

As tarifas médias da China sobre produtos da maioria do mundo são o dobro disso, e muito mais altas sobre as importações dos Estados Unidos.

No primeiro mandato de Trump, o governo chinês reduziu os impostos que cobra de seus exportadores. Isso deu a eles espaço para reduzir os preços e compensar pelo menos parte das tarifas para seus clientes, incluindo muitas pequenas empresas americanas, bem como grandes varejistas como Walmart, Amazon e Home Depot.

Como outra maneira de contornar as tarifas, alguns exportadores chineses transferiram a montagem final de seus produtos para países como Vietnã, Tailândia ou México, mantendo a produção dos componentes principais na China. Trump agora está tentando impedir parte desse comércio através do México, o que críticos das exportações chinesas veem como uma “porta dos fundos” para o mercado dos EUA.

Muitos exportadores chineses recorreram à chamada exceção de minimis para as tarifas: dividindo os embarques em várias pacotes, cada um com valor inferior a US$ 800. Cada embarque fica isento de tarifas e taxas de processamento de alfândega e é, na maioria das vezes, omitido das inspeções de alfândega e dos dados de importação dos EUA.

Pelo menos US$ 1 de cada US$ 6 em importações americanas da China agora chega por meio dessas remessas de minimis.

No início de fevereiro, Trump emitiu uma ordem suspendendo brevemente a isenção de tarifas de minimis para mercadorias da China, México e Canadá. Depois que pacotes rapidamente se acumularam nos aeroportos americanos, ele adiou a ordem para embarques da China até que procedimentos pudessem ser desenvolvidos para lidar com eles, e adiou por um mês sua ordem para importações de minimis do Canadá e México. No domingo, ele novamente adiou a ação sobre essas importações do Canadá e México.

Wu Xinbo, reitor do Instituto de Estudos Internacionais da Universidade Fudan em Xangai, afirmou que, ao retaliar agora, “a China envia um forte sinal para a administração Trump de que uma tarifa unilateral não funciona -você precisa se sentar para conversar conosco e negociar conosco.”