SAMUEL FERNANDES

PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – É só pesquisar sobre exercícios faciais em redes sociais, como no Youtube, que surgem conteúdos ensinando como movimentar a boca ou de que modo usar os dedos em diferentes direções e intensidades no rosto —alguns utilizam o termo ioga facial. A ideia é que tais ações podem ajudar na diminuição de sinais relacionados ao envelhecimento precoce. Evidências científicas consolidadas, no entanto, não existem para indicar que a prática realmente funciona.

A origem da concepção de que exercícios faciais poderiam ajudar a prevenir o envelhecimento é obscura. “Não tenho a menor ideia”, responde Patrícia Karla de Souza, médica dermatologista do Hospital Israelita Albert-Einstein e da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia), quando perguntada sobre isso por este repórter.

Mas, de acordo com ela, a prática não está relacionada com a prática dermatológica. “Dentro da dermatologia, isso não é uma coisa que se propaga [..] porque as evidências científicas são muito ruins”, diz.

Estudos científicos até existem sobre o tema, mas são raros e pouco conclusivos. Um deles, publicado na prestigiada revista Jama Dermatology, contou com 16 pessoas que completaram, em 20 semanas, uma bateria de 32 exercícios faciais. No fim, os pesquisadores até observaram uma possível melhora na aparência facial dos participantes, que eram mulheres com cerca de 50 anos.

Mas os resultados não foram tão significativos, e ainda pesa o fato de que a pesquisa foi pequena e não utilizou os melhores métodos científicos para geração de evidências médicas. “O que existe não consegue demonstrar que há evidências boas em termo do exercício”, resume Souza sobre as pesquisas nesse campo.

Um dos fatores que podem explicar por que a hipertrofia dos músculos da face não funciona para prevenir rugas e outras marcas associadas ao envelhecimento é entender como esse processo ocorre. Souza explica que o envelhecimento é multifatorial e envolve diferentes esferas do rosto: a pele, além da camada gordurosa, muscular e óssea. No entanto, os exercícios, se realmente funcionarem, só influenciará a camada muscular, o que pode não ser muito significativo.

“Eu acho que o processo na face é tão complexo […] que só mexer na musculatura a gente não vai conseguir ver uma evidência de melhora”, resume a médica. Por isso, ela indica que, mesmo se no futuro evidências positivas sobre a prática venham a existir, ainda assim os exercícios faciais só estariam agindo em uma camada relacionada ao envelhecimento do rosto.

O ponto também é levantado por Reinaldo Tovo, coordenador do núcleo de dermatologia do Hospital Sírio-Libanês. Ele enumera alguns fatores relacionados à flacidez da pele facial: dificuldade de absorção de nutrientes no trato gastro intestinal depois de uma certa idade, perda de colágeno e tabagismo são só alguns desses aspectos.

Souza também discute outros fatores que já são reconhecidos como relacionados ao envelhecimento, sendo um dos mais importantes a exposição solar. Isso causa fotoenvelhecimento, o que ocasiona o aparecimento de manchas, o desenvolvimento de uma pele mais fina e a destruição das fibras relacionadas ao colágeno.

Esses pontos, por outro lado, não têm necessariamente relação com a camada muscular. Esse é o caso da perda de colágeno e de gordura facial com o passar da idade, algo associado ao envelhecimento cutâneo. Ao passar por isso, a pele da face perde sustentação. “Parece que ela vai escorrendo, como se fosse uma vela”, diz Tovo.

Se focar na parte muscular, uma pessoa pode não se atentar a esse fator que, este sim, já é bem documentado pela literatura médica. “A musculatura não tem tanto a ver com a flacidez de pele subcutânea. Você está hipertrofiando a musculatura, mas não está cuidando da pele e do subcutâneo”, afirma o médico.

Ele ainda chama atenção para o fato de que, na realidade, o uso excessivo da musculatura facial pode colaborar para o aparecimento de linhas de expressão. Esse paralelo é tecido com a toxina botulínica, conhecida como botox. Essa substância, ao ser aplicada por um profissional no rosto de um paciente, diminui consideravelmente a movimentação dos músculos, prevenindo a formação de rugas. Já a chamada ioga facial busca exatamente o contrário, mas sem ter evidências científicas que funciona.

Tovo também afirma que tais movimentos precisam ser bem acompanhados porque podem trazer malefícios para a articulação temporomandibular (ATM). Ela é relacionada com a ação de abrir e fechar a boca. Se sobrecarregada, o paciente pode desenvolver problemas neste ato cotidiano.

Então, o que funciona?

Ambos os dermatologistas consultados pela reportagem citaram diferentes formas para lidar com o envelhecimento facial. Os hábitos são importantes: evitar o consumo excessivo de álcool, não fumar e manter uma dieta equilibrada são essenciais.

Também é possível adotar tecnologias modernas para tratar aspectos envolvidos com a flacidez. Por exemplo, é possível melhorar a produção de colágeno por diferentes técnicas de bioestimulação. “Eu não vejo tanto benefício [em fazer os exercícios faciais] quanto em estimular a produção de colágeno”, resume Tovo.

Por fim, o médico também dá uma última solução, que talvez seja uma das mais práticas e fáceis de todas. “Tem que aceitar um pouco o envelhecimento.”

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