EDUARDO CUCOLO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O relatório com as diretrizes da reforma tributária, apresentado nesta terça-feira (6) na Câmara dos Deputados, foi visto por especialistas na área como uma evolução em relação às propostas que estavam em discussão no Congresso desde 2019 do ponto de vista técnico e também político.
Ainda há, no entanto, muitos pontos a serem esclarecidos, como o desenho das regras diferenciadas para alguns setores. Um dos principais pontos sem consenso ainda é a tributação da cesta básica.
Breno Vasconcelos, professor do Insper e da Escola de Direito de São Paulo da FGV e sócio do escritório Mannrich e Vasconcelos, destacou o consenso político alcançado dentro de um grupo de deputados que representam diversas regiões do país.
Para ele, o grupo encontrou boas soluções para algumas pressões setoriais. Haverá, por exemplo, uma alíquota padrão sem diferenciação entre bens e serviços, como em outros países. Atualmente, o Brasil possui uma tributação maior no primeiro caso.
Estão previstas algumas desonerações, mas elas serão aplicadas a alguns itens da cesta de consumo, também seguindo a experiência internacional, e não a setores como um todo.
Em relação aos alimentos, os deputados deixaram em aberto a questão: é possível manter a isenção uniforme para todos os brasileiros ou criar um sistema para beneficiar mais a baixa renda do que os ricos, devolvendo o imposto por meio de um “cashback”.
Um estudo do Ministério da Fazenda de 2017 mostra que é necessária uma desoneração de R$ 17 na cesta básica para que se alcance o mesmo efeito de redução de desigualdades que a devolução de R$ 1 para quem está no Bolsa Família, por exemplo.
“Essa é uma evidência que é melhor trabalhar com cashback do que com benefício da cesta básica, mas não houve consenso sobre isso [entre os deputados do grupo de trabalho]”, afirma Vasconcelos, que destaca também as proposições da deputada Tabata Amaral (PSB-SP) relacionadas à questão tributária do ponto de vista ambiental.
Renata Elaine Ricetti, coordenadora dos cursos de pós-graduação de Direito Tributário da EPD (Escola Paulista de Direito), afirma que houve avanços em relação às propostas anteriores, mas avalia que a proposta, com as diretrizes atuais, dificilmente será aprovada.
Para ela, a reforma ainda aumenta a complexidade do sistema atual, ao propor um período de transição em que os dois sistemas tributários, o novo e o antigo, vão conviver. “Há necessidade de fazer uma reforma, mas temos de tomar cuidado para não criar um sistema muito mais complexo, principalmente neste período de transição.”
Ricetti também avalia que o sistema de devolução de impostos é inviável em um país como o Brasil.
“O cashback é o pior ponto da reforma. A gente não está em um país da Europa em que tudo funciona bem. Apesar de ter o modelo do Rio Grande do Sul [o Devolve ICMS], que parece estar funcionando, não dou alguns anos para dar errado. Vai ter muito problema de fraude. A gente vê isso no Bolsa Família.”
O CLP (Centro de Liderança Pública) defende a devolução de impostos focada nos mais pobres. A entidade faz ressalvas parciais a alguns tratamentos diferenciados, como a manutenção da Zona Franca de Manaus até 2073 e a aplicação de uma alíquota diferenciada para educação, saúde e transporte público sem determinar um limite para esses benefícios.
Para a organização, a proposta visa não apenas simplificar o sistema tributário, mas também torná-lo mais eficaz e justo.
“A eficácia desta reforma dependerá de sua implementação adequada, monitoramento rigoroso e ajustes contínuos para garantir que ela cumpra suas metas e promova um sistema tributário mais eficiente e justo para todos os brasileiros”, diz a entidade.
Em nota, a CNC (Confederação Nacional do Comércio) afirma que o sucesso da reforma tributária depende de um tripé fundamental, composto por alíquotas diferenciadas para o setor de serviços, não cumulatividade plena e crédito para empresas do Simples Nacional.
A CNC propõe uma alíquota máxima de 10,7% para todo o setor de serviços, para que não haja aumento da carga tributária do setor. A alíquota geral é estimada por alguns tributaristas e economistas em 25%.