SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Conforme as temporadas de “The Crown” passavam, a coroa da série foi deixando a cabeça da rainha Elizabeth 2ª para ocupar outras, por vezes mais importantes para a trama do que a própria soberana. Mas ninguém a ofuscou tanto quanto Diana, numa disputa por holofotes que parece mimetizar a da vida real, entre os anos 1980 e 1990.

Não é à toa, portanto, que a série da Netflix retorna para sua sexta e última temporada exibindo, logo de cara, o acidente que matou a princesa num túnel de Paris, em 1997. É a primeira cena do primeiro episódio, como se os criadores quisessem tirar a passagem delicada e esperada da frente, deixando a trama fluir apesar da atenção que Diana ainda concentra.

“Foi uma decisão tomada para lidar com o assunto de uma vez e, então, poder se concentrar nas histórias dos personagens. Ver o acidente e, depois, retomar as semanas anteriores nos dá outra perspectiva do ocorrido”, diz Khalid Abdalla, que interpreta Dodi Al-Fayed, namorado de Diana que também morreu na perseguição de paparazzi ao carro em que estavam.

“The Crown” abre sua sexta temporada com um francês levando o cachorro para passear sob as luzes da Torre Eiffel. Até que ele vê uma Mercedes-Benz em alta velocidade entrar no túnel Pont de l’Alma, seguida de motos enfurecidas, e um barulho de colisão. A vinheta da série então surge na tela e é sucedida por um letreiro em que se lê “oito semanas antes”.

Voltamos no tempo para acompanhar o efêmero namoro de Diana e Dodi desde o princípio, quando seu pai, o empresário egípcio obcecado por tudo relacionado aos britânicos Mohamed Al-Fayed o empurrou para a recém-divorciada princesa, durante férias num iate.

Em paralelo, os outros membros da família real também enfrentam dilemas pessoais, embora quase todos orbitem, em menor ou maior proporção, o casamento falido de Diana e Charles. Mas a temporada está dividida em duas levas –a primeira com estreia nesta semana e a segunda, em 14 de dezembro– e a próxima parcela se distanciará do ex-casal real, chegando até os anos de faculdade do príncipe William e seu noivado com Kate Middleton.

É curioso pensar que justo esta derradeira e, provavelmente, mais sensível temporada –pela proximidade temporal com os dias de hoje e pela crise que a morte de Diana gerou no Palácio de Buckingham– seja a primeira lançada fora do reinado de Elizabeth 2ª, morta no ano passado.

“The Crown”, na verdade, se encerra junto com o fim de uma era para a monarquia britânica, não é exagero dizer. Além da monarca, seu marido, o príncipe Philip, também morreu há apenas dois anos, mergulhando a instituição que é a monarquia do Reino Unido em incerteza –mas também criando matéria-prima para eventuais novos capítulos dessa saga, se a Netflix assim desejar.

“É inevitável que as pessoas vejam a série, agora, de maneira diferente. Muitos ainda estão enlutados por essas mortes, então talvez a série traga algum tipo de conforto em meio a essas mudanças”, diz Jonathan Pryce, que vive Philip e lembra que tinha apenas seis anos quando viu Elizabeth sendo coroada. A única vida da qual se recorda, afirma, é uma sob o reinado dela.

Ostentando o título de “sir” à frente do nome, o bastião do teatro inglês garante que a morte não alterou a trama da série ou o olhar que ela teria para seus personagens. Afinal, todos sempre foram tratados com respeito, diz, apesar de a série ter sofrido críticas no passado por tratar como fato certeiro uma ficcionalização do que aconteceu a portas abertas ou fechadas nas sete décadas de reinado elizabetano

Ao lado de Imelda Staunton como a rainha, Pryce está em sua segunda temporada de “The Crown”, depois de ver seu papel ser dividido entre Matt Smith e Tobias Menzies –no caso dela, foi com Claire Foy e Olivia Colman. O elenco de grandes nomes e alta rotatividade ilustra bem o tamanho da empreitada que foi a série.

Ela chega ao fim como um dos projetos mais ambiciosos da TV e do streaming nas últimas duas décadas, fruto de um esforço da Netflix enquanto ainda se estabelecia como fonte de conteúdo audiovisual premium. A aposta deu certo, e “The Crown” garantiu à empresa seu primeiro e único Emmy de melhor série de drama, o mais cobiçado troféu da televisão nos Estados Unidos.

Mas, de novo, o encerramento em si parece ofuscado pela comoção gerada pela possibilidade de ver, reencarnada, Diana. Interpretada por Elizabeth Debicki, a princesa do povo chega à última temporada mais madura, em cenas que se tornaram célebres, como sua caminhada por um campo de minas terrestres em Angola.

Debicki diz ter adotado uma abordagem técnica para o trabalho, ouvindo e vendo gravações da princesa e praticando sua forma de falar. “Eu não queria uma caricatura, então precisava que os maneirismos dela fluíssem de forma natural. É parte do seu trabalho em ‘The Crown’ dar ao público o sentimento de estar próximo dessas figuras. Mais do que aparência, é importante criar um senso de intimidade”, diz a atriz.

“Mas eu não acho que exista um legado para eu ajudar a preservar, porque a própria Diana se encarregou disso. Meu trabalho foi interpretá-la da forma mais autêntica possível, e com honestidade.”

THE CROWN (6ª TEMPORADA)

– Onde A primeira parte estreia nesta sexta (16) e a segunda, em 14 de dezembro, na Netflix

– Classificação 16 anos

– Elenco Imelda Staunton, Jonathan Pryce e Elizabeth Debicki

– Produção Reino Unido, 2023

– Criação Peter Morgan