Caneta de insulina utilizada no tratamento de diabetes

SAMUEL FERNANDES

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um editorial da revista The Lancet Regional Health Europe afirma que é necessário melhorar a atenção ao diabetes tipo 1, especialmente em adultos. A condição em muitos casos é associada a crianças, mas estudos já demonstraram que há uma alta prevalência do distúrbio também nos mais velhos em todo o mundo.

O diabetes tipo 1 é caracterizado pela deficiência na produção de insulina diante de um processo em que “o sistema imunológico combate as células do pâncreas que produzem insulina”, explica o médico endocrinologista André Vianna, coordenador do departamento de educação em diabetes e campanha da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD).

Em contrapartida, o tipo 2 é aquele em que o organismo não consegue aproveitar a insulina produzida pelo organismo. “A pessoa até produz a insulina, mas ela não funciona de forma adequada, porque tem uma resistência”, continua Vianna.

O número de casos de diabetes tipo 1 é menor. Segundo o Ministério da Saúde, do total de pacientes com diabetes no Brasil, de 5% a 10% sofrem com essa tipologia. E em muitos casos o diabetes tipo 1 é associado a crianças e adolescentes -no passado foi até chamado de diabetes juvenil.

Por isso que, segundo os autores do editorial da The Lancet, as ações associadas à doença, como diagnóstico e tratamento, são principalmente voltadas aos mais jovens. E é nesse ponto que reside o problema, afirmam.

Artigo publicado em outubro de 2022, por exemplo, concluiu que, em 2021, 8,4 milhões de pessoas viviam com diabetes tipo 1 ao redor do mundo. Dessas, 64% tinham entre 20 e 59 anos, enquanto 19% já estavam com mais de 60 anos. Crianças e adolescentes contabilizavam 18% do total.

Mas, como existe a ideia de que a doença é mais comum em jovens, a chance de algum adulto ser diagnosticado de forma incorreta é alta. “Estima-se que até 40% dos adultos com mais de 30 anos com diabetes tipo 1 foram diagnosticados erroneamente com diabetes tipo 2”, informa o editoral da Lancet, fazendo referência a uma pesquisa publicada em outubro de 2021.

A expectativa de vida de alguém com diabetes tipo 1 de diabetes é menor, comparada à do tipo 2. A primeira tipologia retira cerca de oito anos da vida do paciente, enquanto a segunda reduz em três anos. Por isso também que o editorial defende uma melhor atenção clínica ao problema, além de mais pesquisas sobre o assunto.

“A agenda global, que é predominantemente focada na prevenção e no tratamento do diabetes tipo 2 em adultos, deve ser expandido para incluir diabetes tipo 1, que tem seus próprios desafios, principalmente o seu diagnóstico e o posterior tratamento adequado”, escrevem os autores.

O ponto é reiterado por Levimar Araújo, presidente do departamento de diabetes mellitus da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia). “Temos um percentual [do diabetes tipo 1] que aparece em adultos, e isso é confundido.”

A realização de exames pode evitar esse tipo de problema. Um deles é o teste dos autoanticorpos, “que podem demonstrar que aquele paciente tem o tipo 1 do adulto e não o 2”, diz Araújo. Existe outro exame: a medição de peptídeo C. Por meio dele é possível observar a quantidade de insulina ainda produzida pela pessoa. Se a quantidade estiver baixa, é um indício de que se trata de diabetes tipo 1.

No entanto, ainda há problemas no acesso a esses procedimentos. “São exames um pouco mais caros”, resume Vianna.

Com o diagnóstico errado, o tratamento também não acaba sendo o adequado. Enquanto no diabetes tipo 2 alguns medicamentos colaboram para o quadro do paciente, o tipo 1 requer necessariamente a reposição de insulina.

Em alguns casos, os remédios até podem aparentar que funcionam para um paciente com diabetes tipo 1, mas o efeito é passageiro. “No início ele vai ter um controle até adequado, mas, com o passar do tempo, ele vai exaurir essas células [de produção da insulina] até mais rapidamente”, afirma Araújo.

Uma explicação para a alta incidência de diabetes tipo 1 em adultos pode ter a ver com o aumento da expectativa de vida dos pacientes.

De acordo com um relatório publicado em 2022 pela Federação Internacional para o Diabetes (IDF, na sigla em inglês), “devido a melhorias constantes nos cuidados médicos e tecnologia, existem agora milhões de adultos vivendo com diabetes tipo 1 que foram diagnosticados quando eram crianças”.

O documento da IDF, contudo, chama atenção para outro dado: os novos diagnósticos da doença em adultos. As estimativas apontam que, de todos os novos casos detectados em 2022, 62% eram em pessoas com mais de 20 anos. “O início do diabetes tipo 1 em adultos não é incomum”, resumem os autores do relatório.

DIABETES NO BRASIL

O mesmo levantamento da IDF estimou que o Brasil tinha mais de 588 mil pessoas com diabetes tipo 1 em 2022. Desses, 68% eram de adultos com idade entre 20 e 59 anos. Somente Estados Unidos e Índia tinham um número maior absoluto de diagnósticos do distúrbio.

Em casos totais, o que inclui o diabetes tipo 2, estima-se que mais de 15 milhões de pessoas conviviam com a doença no Brasil em 2021, indica outro relatório da IDF. Os cálculos apontam que, em 2045, esse número deve subir para cerca de 23 milhões.