BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes recebeu em seu gabinete uma proposta de delação premiada feita pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A audiência em que foi relatada a vontade do militar ocorreu nesta quarta-feira (6) e contou com a presença de Cid e de seu advogado, Cezar Bittencourt.
O acordo, para ter validade, ainda precisa ser aceito e homologado por Moraes. Segundo pessoas próximas às investigações, para isso ser feito, resta saber o que Cid vai apresentar de novo em relação às investigações e quais provas vai oferecer.
De acordo com o blog da jornalista Andréia Sadi no G1, a PF (Polícia Federal) já aceitou fechar o acordo de delação. O tenente-coronel prestou depoimentos ao órgão nos últimos 20 dias. A proposta também deverá ser avaliada pela PGR (Procuradoria-Geral da República).
O advogado Cezar Bittencourt disse anteriormente que o ex-ajudante de ordens “assumiu tudo” e não incriminou Bolsonaro à Polícia Federal no caso das joias trazidas do exterior.
A Folha não conseguiu contato com Bittencourt nesta quinta-feira (7).
Cid está preso desde 3 de maio no Batalhão do Exército de Brasília, sob suspeita de inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid na carteira de imunização do ex-presidente.
Sua cela possui 20 metros quadrados. O militar só costuma sair do local duas horas por dia, para um período de banho de sol em grande pátio disponível para realizar corridas e musculação.
Após mudar seu advogado de defesa, adotou postura de maior cooperação com autoridades policiais e tem tido longos depoimentos.
Cezar Bittencourt afirmou em agosto que o seu cliente apenas cumpriu ordens de Bolsonaro recuou e depois reafirmou, num vaivém confuso desde que assumiu o caso.
Ele também afirmou que Cid confessaria ter negociado nos Estados Unidos, a mando do ex-presidente, as joias recebidas pelo governo brasileiro e que são alvo de investigação da PF.
Bittencourt é antigo crítico da delação premiada, especialmente pelo uso do instituto durante a Operação Lava Jato e havia descartado essa possibilidade no caso de Cid. Em agosto, ele chegou a afirmar que não pensava em delação.
“Não tem nem por quê. Possibilidade zero. Vou fazer a defesa do Cid, não tem por que delatar ninguém. Eu sou contra isso”, disse.
A delação é um meio de obtenção de prova, que não pode, isoladamente, fundamentar sentenças sem que outras informações corroborem as afirmações feitas. Os relatos devem ser investigados, assim como os materiais apresentados em acordo.
O advogado do tenente-coronel já havia se encontrado, no último dia 24, com Moraes. Esta reunião durou pouco mais de cinco minutos no Salão Branco da corte, durante o intervalo da sessão plenária.
Na ocasião, Bittencourt disse ao ministro que ainda estava se inteirando dos casos em que o militar é investigado e que tinha interesse em esclarecer todos os fatos relacionados às joias e suspeitas de falsificação da carteira de vacinação na defesa técnica.
Moraes teria agradecido pela disposição e deu as instruções para que o advogado tivesse acesso à íntegra dos autos dos casos em que Bittencourt defenderá Mauro Cid.
No último dia 28, Cid falou por dez horas com investigadores sobre o caso do hacker Walter Delgatti Neto, que está preso e é suspeito de tramar contra Moraes a mando da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP).
Três dias depois, Cid prestou depoimento de dez horas na quinta-feira (31) sobre a investigação que trata dos presentes recebidos de países árabes pelo ex-mandatário.
Além de Cid, o pai dele, General Lourena Cid, o assessor Osmar Crivelatti e o advogado Frederick Wassef também deram declarações à PF, diferentemente de Bolsonaro, Michelle e outros dois assessores, que foram intimados, mas decidiram silenciar.
“Estão colocando palavras que não tem no Cid. Acusações ao Bolsonaro que não existem. E mais, esse problema se falou das joias, da recompra das joias, o Cid assumiu tudo”, disse Cezar Bittencourt, em áudio enviado à GloboNews e ao qual a Folha teve acesso.
Na ocasião, o advogado disse que a defesa “não está jogando Cid contra Bolsonaro”. “Não colocou Bolsonaro em nada. Não tem nenhuma acusação em corrupção, envolvimento, suspeita de Bolsonaro”, completou o advogado.
Para a PF, Bolsonaro utilizou a estrutura do governo federal para desviar presentes de alto valor e isso resultou em enriquecimento ilícito.
As investigações identificaram que Bolsonaro e auxiliares retiraram do país, no avião presidencial, pelo menos quatro conjuntos de bens recebidos pelo ex-presidente em viagens internacionais, na condição de chefe de Estado.
A viagem ocorreu em 30 de dezembro, véspera do último dia de mandato de Bolsonaro, para assim evitar seguir o rito democrático de passar a faixa a seu sucessor eleito, o hoje presidente Lula (PT).
A apuração da PF a respeito das joias é, até o momento, a mais preocupante para o entorno do ex-presidente, por aproximá-lo de um suposto esquema de desvio de dinheiro público.
As investigações também apontaram que Mauro Cid tinha um documento com uma espécie de plano de golpe para reverter a eleição de Lula (PT) no ano passado.
Também foram identificadas mensagens em que um oficial das Forças Armadas pede que Cid convença Bolsonaro a ordenar uma intervenção militar o que configuraria um golpe de Estado.
O tenente-coronel foi convocado para depor na CPI do 8 de janeiro no Congresso e em comissão da Câmara Legislativa do DF. Nas duas ocasiões, não respondeu a perguntas. Em julho, no Congresso, ele apenas leu uma mensagem na qual exaltou sua trajetória nas Forças Armadas e relativizou as atribuições de seu posto no governo. O oficial tentou reduzir o papel do ajudante de ordens ao de um secretário.