BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Deambular ao longo de um corredor revestido de lambe-lambes e em meio a fotografias estampadas em tecidos translúcidos. Esse percurso repleto de camadas traz à memória um compilado da história política do Brasil, com cenas que vão desde as manifestações de 2013 até os atos golpistas de 8 de janeiro.
Conduzir o visitante a uma imersão no passado recente do país é a proposta da exposição “A Verdade”, que será inaugurada no Museu de Arte de Brasília nesta quarta-feira (6) e vai até dezembro. À frente do projeto está a fotojornalista Gabriela Biló, da Folha de S.Paulo, em parceria com o artista visual Pedro Inoue e com Cristiano Botafogo e Pedro Daltro, apresentadores do podcast Medo e Delírio em Brasília.
A data da abertura não foi mera coincidência. “A gente escolheu 7 de setembro para ser um marco político. É uma data muito forte: de efervescência política, de termômetro político, em que os políticos estão em Brasília”, diz Biló, lembrando que, no dia 6 de setembro de 2018, o então candidato à reeleição Jair Bolsonaro foi esfaqueado durante um ato público de campanha em Minas Gerais.
O título da exposição vem como uma provocação à guerra de narrativas do mundo contemporâneo, levantando questionamentos sobre o que são fatos, memórias ou pontos de vista. “O que é verdade hoje em dia? A verdade acaba se tornando ponto de vista, mas os fatos aconteceram, as coisas foram destruídas e as pessoas morreram”, diz Inoue, que vê o material em exibição como um testemunho por meio dos olhos dos parceiros.
A mostra se divide em dois eixos, o primeiro inspirado no livro “A Verdade vos Libertará”, da editora Fósforo, que teve mais de 5.000 cópias vendidas e está na segunda edição. A narrativa em ordem cronológica começa com a tomada das ruas dez anos atrás e a transformação política das manifestações, passando pelo desprezo do ex-presidente Jair Bolsonaro no combate à pandemia da Covid-19.
Manchetes de jornal e frases ditas pelo ex-chefe de Estado são justapostas às fotografias impressas como cartazes de rua em exibição nesse trajeto. Até então sombrios, os tecidos que servem de apoio às imagens no centro do corredor vão ganhando luminosidade. O ápice da caminhada se dá no momento em que Luiz Inácio Lula da Silva é eleito presidente da República pela terceira vez.
Projeções e áudios complementam o retrato da posse presidencial em Brasília, em 1º de janeiro. Ao lado dessa instalação, uma coluna à esquerda guarda uma surpresa aos curiosos.
“Não sou nada clássica, nada purista. O livro já veio nessa linguagem de lambes de rua, tem a ideia de falar para as pessoas que essa é a história delas. Não é uma coisa para ficar em um quadro admirando. É para sentir, estar dentro, experienciar”, diz Biló.
O segundo eixo parte desse ponto e joga luz sobre os ataques antidemocráticos ocorridos no dia 8 de janeiro, em Brasília. Os lambes revestem desde o chão até as paredes colocando o visitante no meio grupo de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, que invadiu e depredou as sedes dos três Poderes, em Brasília.
“Não existe tanta objetividade no fotojornalismo. O jornalismo informa com subjetividade, com as nuances da política. Meu trabalho não é só registrar fatos, é ter uma leitura política sobre aqueles fatos. Tem muitas formas de se fotografar o 8 de janeiro, eu fotografei de um jeito crítico”, diz a fotojornalista.
Há um detalhe para ressignificar esse espaço: sobre o vidro estilhaçado do Palácio do Planalto captado por sua lente foram acrescentados os termos “sem anistia”.
“Tinha uma preocupação de como transformar isso em crítica e não em ode”, diz ela sobre o espaço de selfies.
A dimensão dos danos causados ao patrimônio público que ilustram um ataque concreto, mas também simbólico à democracia do país, pode ser apreendida em um dos espaços a partir de um compilado de cerca de 700 fotografias tiradas por Biló naquele dia e projetadas em sequência, quase como um curta-metragem.
“Tudo é político. Fotografar não pode ser diferente. Não acredito que existe fotojornalismo isento, não acredito que existe jornalismo isento. Jornalismo tem um lado e é o lado da democracia, é o lado do interesse público. Eu fotografo com esse lado”, diz.
GABRIEL BILÓ, PEDRO INOUE, MEDO E DELÍRIO: A VERDADE
Quando Qua. a seg., das 10h às 19h, fechado às terças. Até 6 de dezembro
Onde MAB (Museu de Arte de Brasília) – SHTN, trecho 1, projeto orla, polo 3, lote 5, Brasília, Distrito Federal
Preço Grátis
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