SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Yndiara Asp, 25, concedeu entrevista à reportagem 0com uma camiseta branca. Na estampa, o desenho de uma pessoa andando de skate. “Pode ser um menino ou uma menina porque é só um bonequinho com cabelo comprido”, descreveu.

A forma de que a catarinense se apresenta não é uma escolha ao acaso. Representa também um papel que ela assumiu dentro da comunidade do skate, ao erguer a voz por igualdade nas premiações do esporte.

Finalista da disputa do skate park nos Jogos Olímpicos de Tóquio e, atualmente, a segunda brasileira mais bem colocada no ranking mundial da modalidade —pelo qual serão selecionados os atletas classificados para os Jogos de Paris, em 2024—, Yndi, como é conhecida, levantou no mundo dos skatistas o debate sobre sexismo.

Foi de seu pai que ela ganhou o primeiro “brinquedo de rodinhas”, motivo de preocupação de sua mãe, que, embora não gostasse de ver a filha se machucando, nunca impediu sua paixão.

“Desde o momento em que eu me apaixonei por esse brinquedo, senti que poderia quebrar barreiras próprias e também da sociedade em geral”, disse Yndi. “Eu mesma não comecei a andar vendo uma menina.”

Por anos, a falta de representatividade no skate formou uma comunidade composta, majoritariamente, por homens, em um cenário de desigualdade exposto, sobretudo, nas premiações da modalidade.

Em 2018, quando se profissionalizou, a catarinense esteve no centro de uma polêmica que deu início a um movimento para mudar isso.

Naquele ano, viralizou na internet a foto dos dois campeões do evento Oi Park Jam, em Itajaí, Santa Catarina. A imagem despertou grande interesse por mostrar a diferença dos prêmios recebidos por Yndi e Pedro Barros: R$ 5 mil e R$ 17 mil, respectivamente.

“Quando postaram a foto, as pessoas começaram a metralhar no Instagram”, lembra Yndi. “Alcançou uma repercussão fora do skate. Muitas mulheres vieram me defender, defender o skate feminino e questionar o motivo da diferença. Virou um movimento.”

Na ocasião, a organização argumentou que a competição masculina reuniu os 24 melhores skatistas da época, enquanto a feminina tinha dez meninas, sendo três profissionais.

A justificativa não foi suficiente para cessar a onda de críticas, ou o caos, como a catarinense definiu. “Foi realmente um caos, mas é aí que a gente vê que o caos é necessário para a mudança.”

Quando tem alguém para olhar, a gente sabe aonde pode chegar e pode ir além. Quando não tem, é um vazio, cheio de dúvidas. Eu me sinto muito feliz de poder guiar e inspirar outras meninas

skatista, finalista nos Jogos de Tóquio

O barulho ecoou até os Estados Unidos, especificamente na Califórnia, berço do skate mundial. Yndi se orgulha de lembrar que, a partir do evento no Brasil, algumas das principais competições do mundo passaram a ter premiações iguais.

“Pouco depois daquele torneio aqui, teria nos Estados Unidos uma etapa do campeonato mais clássico que tinha até então, o Girls Combi Pool Classic, e eles anunciaram que teria a equiparação das premiações.”

SONHO DA MEDALHA OLÍMPICA

A luta de Yndiara por igualdade na premiação não minimiza sua luta por um bom desempenho sobre as rodinhas. Oitava colocada na competição de park nos Jogos Olímpicos de Tóquio, ela sonha em buscar resultado que lhe renda medalha nos Jogos de Paris.

“Desde 2016, eu sempre consigo chegar às finais dos principais torneios, dos Mundiais, mas ainda estou buscando o pódio”, afirmou.

A atleta está em Roma, onde tem feito seus treinos antes da disputa do Mundial de park, na capital italiana, de 1º a 8 outubro. Ela é nona colocada no ranking mundial da modalidade, que é liderado pela britânica Sky Brown e tem a brasileira Raicca Ventura em sexto lugar.

Yndi acredita que chegará em uma condição melhor à próxima edição olímpica, sobretudo pelo volume de treinos. Apesar de o ciclo olímpico ser menor, de três anos —devido ao fato de os Jogos de Tóquio terem sido realizados em 2021 por causa da pandemia de Covid-19—, desta vez ela não sofreu com lesões.

“Foram três anos mais proveitosos. Antes de Tóquio, eu tive lesões no quadril, no tornozelo e no cotovelo”, recordou a skatista, agora também mais experiente.

“Quando a gente vê uma Olimpíada de fora, a gente vê os atletas como heróis. Mas, quando está na Vila Olímpica, a gente entende que todo o mundo é gente como a gente, mas que são pessoas que acreditam e lutam diante das adversidades.”

“Agora eu carrego isso comigo também.”