SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há cem anos, nasceu uma das cantoras que embalaram o Brasil pré-bossa-nova. Morta há 18 anos, aos 82, Emilinha Borba, uma das grandes intérpretes da música brasileira da era do rádio, entre os anos 1940 e 1950, completaria um século de vida nesta quinta-feira (31).
Classificada como uma das mais populares cantoras da história da música brasileira no obituário publicado pela Folha de S.Paulo, ela foi uma das rainhas do rádio -título que ganhou diversas vezes em votação popular. Mais do que isso, Emilinha é tratada como uma das grandes personalidades do país no século passado.
Numa época em que a indústria fonográfica ainda engatinhava no Brasil, ela foi voz de marchinhas que embalaram carnavais, e uma estrela da Rádio Nacional. Atuou em dezenas de filmes musicais e estampou mais de 300 capas de revista.
Nascida na Mangueira, no Rio de Janeiro, Emilinha era apaixonada por música desde a infância, e começou a carreira nos anos 1930, participando de programas de auditório. Em 1937, aos 13 anos, participou do “Programa de Calouros”, de Ary Barroso -de quem recebeu nota máxima pela interpretação do samba “O X do Problema”, de Noel Rosa.
Dois anos depois, foi apadrinhada por Carmen Miranda, já uma estrela conhecida nacionalmente e também nos Estados Unidos. Ainda conhecida como Emília Borba, ela foi indicada por Miranda, que inclusive emprestou vestido e sapatos plataforma para a menor fazer o teste, para compor a equipe de crooners na orquestra do renomado Cassino da Urca.
Foi naquele mesmo ano que ela deu início à sua trajetória fonográfica, cantando a marchinha “Pirulito”, sucesso no Carnaval, da dupla Braguinha/Alberto Ribeiro. Mas seu nome não foi incluído nos créditos do disco, que cita apenas o cantor Nilton Paz.
Nos anos 1940, ela ficou conhecida com o nome Emilinha Borba. Firmou e desfez contratos com diversas emissoras de rádio e gravadoras, época em que ajudou a popularizar diversos ritmos em sua voz –do samba ao bolero, da rumba ao baião, além das marchinhas.
Em 1942, participou das filmagens de “É Tudo Verdade”, o lendário filme inacabado rodado por Orson Welles no Brasil. Em 1947, depois de sair e voltar, deu início à sua fase mais celebrada cantando na Rádio Nacional, emplacando de cara sucessos como a marcha “Escandalosa” e o bolero “Se Queres Saber”.
Com uma voz doce e profunda, Emilinha passeou por gêneros e ficou conhecido sobretudo pelas músicas que embalaram os carnavais. Ela deu voz a “Chiquita Bacana”, “Marcha do Remador”, “Mulata Yê Yê Yê” e “Tomara Que Chova”, só para citar alguns desses sucessos.
Em 1949, ela deu início a uma rivalidade marcante com outra grande cantora do período, Marlene. As duas disputavam os concursos que davam o título de “rainha do rádio”, importantíssimo na época, que incendiou auditórios, revistas e fã-clubes.
Naquele ano, quem saiu vencedora foi Marlene, mas Emilinha acabou conquistando o título diversas vezes nos anos seguintes. A rivalidade, abraçada pelo público e pela imprensa, era provocada pelas duas, mas também um tanto fabricada, espécie de jogada de marketing, já que elas mantinham uma relação de amizade e chegaram a gravar e fazer shows juntas.
Com o declínio do rádio e a ascensão da televisão no fim da década de 1950, Emilinha estrelou vários programas da TV, entre eles “Emilinha Canta”, “Minha Querida Emilinha” e “Emilinha”. Chegou a substituir Chacrinha algumas vezes.
Devido ao sucesso no Carnaval, mas principalmente ao alcance da Rádio Nacional, a popularidade de Emilinha chegou a ser tão grande que ex-presidente Getúlio Vargas teria dito que sentia inveja dela. É o que disse o historiador, jornalista e pesquisador Ricardo Cravo Albin à Agência Brasil.
“Emilinha disse ao presidente que percorreu o país de ponta a ponta pelo menos umas quatro vezes e era recebida como feriado nacional, o comércio fechava. O presidente teria dito a ela “que inveja minha filha, eu tenho de você.”
Em 1968, Emilinha foi operada de um edema nas cordas vocais. Ela chegou a recuperar a saúde, mas nunca mais teve o mesmo sucesso. Àquela altura, a bossa nova já era conhecida internacionalmente, jogando para escanteio as vozes empostadas da era do rádio, e a tropicália estava em ebulição com suas guitarras elétricas.
Nos últimos anos de vida, diz o obituário da Folha de S.Paulo, Emilinha costumava vender em praças cópias do disco “Emilinha Pinta e Borda”, gravado em 2003. Também fazia alguns shows no Carnaval carioca.