BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, Renato Gomes afirmou nesta quinta-feira (31) que o Banco Central vê como “bem ruim” a ideia de elevar as tarifas de intercâmbio cobradas nas transações com cartões para parcelamentos mais longos.
Ele disse, ainda, que a autoridade monetária estuda uma medida para disciplinar a cobrança das tarifas definidas pelas bandeiras de cartões e que apoia a portabilidade de dívida no rotativo do cartão de crédito o mais cedo possível.
“Não tem absolutamente nenhum apoio ao aumento do intercâmbio [para parcelamento mais longo]”, afirmou o diretor no evento “Concorrência no Mercado Financeiro: Desafios da Nova Economia Digital”, promovido pela Abipag (Associação Brasileira de Instituições de Pagamentos).
Segundo ele, os emissores argumentam que a elevação da tarifa de intercâmbio serviria para remunerar o risco adicional por parcelamentos longos feitos pelos consumidores.
“Intercâmbio não é feito para remunerar risco, intercâmbio é feito para balancear a remuneração entre dois lados da indústria, entre emissores e credenciadores, e garantir que na ponta o consumidor tenha os incentivos corretos na hora de escolher o meio de pagamento”, acrescentou.
A tarifa de intercâmbio é o percentual pago a cada transação ao emissor do cartão (bancos e fintechs, no geral) pelo credenciador do estabelecimento comercial, ou seja, por quem aluga as maquininhas para o comerciante. O credenciador repassa o custo da tarifa ao estabelecimento comercial que, por sua vez, transfere a despesa ao consumidor.
Hoje, o teto para a tarifa de intercâmbio no caso dos cartões pré-pagos (emitidos por fintechs) é de 0,7%, enquanto o limite para operações realizadas com cartões de débito (emitidos por bancos) é de 0,5%. No entanto, não há hoje um limite nas operações com cartões de crédito.
“Intercâmbio é opaco, só quem vê aquilo é credenciador. Intercâmbio tem uma incidência terrível, porque todo mundo paga um aumento na tarifa de intercâmbio. O lojista tem muita dificuldade em discriminar em função do uso do meio de pagamento. Não tem nenhum sinal de preço para o consumidor, Isso faz com que aquele custo seja mutualizado. Todo mundo paga por aquilo”, disse Gomes.
O tema entrou no radar em meio à discussão sobre a limitação dos juros praticados no rotativo do cartão de crédito e um eventual redesenho do parcelamento de compras sem juros.
O BC limitou, em 2018, a tarifa de intercâmbio em operações com cartão de débito, e neste ano, estendeu a limitação para a tarifa de intercâmbio nos instrumentos pré-pagos.
“A ideia era prover eficiência na utilização dos meios de pagamento e gerar uma maior aceitação de cartões, que contribuiria muito para a digitalização de pagamentos. Essa regulação do intercâmbio tornou esse instrumento mais barato e mais atrativo para o comércio”, disse Gomes.
De acordo com o diretor do BC, é “unânime” entre os participantes do mercado que existe “grande opacidade” na cobrança das tarifas de intercâmbio.
“O BC está preocupado com essa ofuscação, estamos mapeando com cuidado a incidência dessas tarifas de bandeira. Nós estamos tentando entender os eventos tarifários, estamos conversando com participantes do mercado”, disse.
“Não posso antecipar medida, ainda estamos em fase de estudos, mas nós vamos disciplinar a cobrança dessas tarifas. Não posso ser mais específico, isso está no nosso radar”, continuou.
O chefe da da área de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução disse ainda que a “concorrência entre bandeiras tende a aumentar [a tarifa de] intercâmbio em vez de diminuir” e que as intervenções do BC nesse mercado têm como objetivo garantir práticas mais eficientes.
“Quando a concorrência não atinge os objetivos desejados, o Banco Central, de maneira cautelosa, decide atuar como regulador e fazer intervenções regulatórias, sempre entendendo que às vezes a regulação que corrige uma distorção cria outras.”
Como parte da solução para reduzir os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, Gomes afirmou que o BC apoia e está trabalhando na implementação da portabilidade [da dívida do rotativo].
“A portabilidade o mais cedo possível é uma solução. Para dar saliência a preços desconhecidos, são necessárias políticas de transparência e de educação financeira, disciplinar como as informações são providas ao consumidor na tarifa”, disse.
A portabilidade de crédito permite ao cliente transferir uma dívida de uma instituição financeira para outra que ofereça melhores condições de pagamento. No Brasil, ela não é aplicável ao rotativo, apenas para outras modalidades.
Essa opção é vista pelos participantes do mercado de cartões como forma de estimular a competição no sistema, ajudando a reduzir os juros na linha mais cara do mercado.
A taxa média de juros cobrada pelos bancos de pessoas físicas no rotativo do cartão de crédito subiu em julho para 445,7% ao ano, segundo dados do BC divulgados na última segunda-feira (28).