A REDAÇÃO

Um filme inspirado na trajetória de Jair Bolsonaro, desde o atentado a faca sofrido durante a campanha presidencial de 2018 até sua eleição à Presidência da República, entrou em fase de edição após o encerramento das gravações em dezembro, em São Paulo. Intitulado Dark Horse (algo como Azarão, em tradução livre), o longa ainda não tem data oficial de estreia, mas a expectativa dos idealizadores é que o lançamento ocorra em 2026, ano das próximas eleições presidenciais no Brasil.

Segundo reportagem da BBC News Brasil, as primeiras imagens do filme começaram a circular nas redes sociais nas últimas semanas, impulsionadas por políticos bolsonaristas e apoiadores do ex-presidente. A produção é descrita como um thriller de baixo orçamento para os padrões do cinema norte-americano, conforme declarou o deputado federal Mário Frias (PL-SP), ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro e principal idealizador do projeto. Frias também atua no filme, interpretando um médico.

Dirigido pelo cineasta americano Cyrus Nowrasteh, conhecido por produções com forte apelo religioso e político, o filme apresenta uma versão ficcionalizada da história de Bolsonaro, com o uso de “licenças poéticas”, segundo seus criadores. Em entrevista à BBC News Brasil, Nowrasteh afirmou que o atentado de 2018 ainda levanta muitas questões e que o longa pretende lançar luz sobre o cenário político brasileiro e global.

O papel de Jair Bolsonaro é interpretado pelo ator americano Jim Caviezel, conhecido internacionalmente por viver Jesus Cristo em A Paixão de Cristo (2004), de Mel Gibson. Caviezel tem carreira marcada por filmes de temática religiosa e alinhados a pautas conservadoras, como O Som da Liberdade (2023), que teve grande repercussão entre públicos evangélicos e grupos de direita. Segundo Frias, o ator aceitou o papel sem negociar cachê.

A BBC News Brasil destaca que Dark Horse se insere em um contexto mais amplo de produções culturais associadas à chamada “guerra cultural”, conceito difundido por pensadores conservadores, como Olavo de Carvalho, falecido em 2022. Frias afirma que a inspiração para o filme vem diretamente das ideias do ideólogo, que defendia a ocupação dos espaços culturais por grupos conservadores como forma de enfrentar o que considerava uma hegemonia da esquerda.

Para o sociólogo Marco Dias, professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e pesquisador do tema, o filme reflete o esforço da direita brasileira em se alinhar a movimentos conservadores globais, especialmente dos Estados Unidos. Segundo ele, há um diálogo direto com o chamado cinema cristão e com narrativas que apresentam líderes políticos como figuras perseguidas ou incompreendidas.

A produção do filme é assinada pela Go Up Entertainment, empresa de Karina Ferreira da Gama. De acordo com documentos públicos citados pela BBC News Brasil, a produtora alugou o Memorial da América Latina, em São Paulo, para as gravações, ao custo de R$ 126 mil. Karina também preside a Academia Nacional de Cultura (ANC), que já recebeu R$ 2,6 milhões em emendas parlamentares para outros projetos culturais. Além disso, ela é sócia de uma instituição que recebeu recursos públicos para projetos de conectividade e educação digital.

Mário Frias afirma que Dark Horse não utiliza recursos públicos nem incentivos de leis como a Rouanet. Ele também mencionou apoio logístico da SPCine e de gestões públicas, o que foi negado tanto pelo governo do Estado de São Paulo quanto pela prefeitura da capital, que informaram à BBC que apenas autorizaram as gravações seguindo os trâmites técnicos habituais.

Ainda segundo a BBC News Brasil, a produção do filme deve ser vista por setores da direita como uma vitória simbólica, ao levar a história de Bolsonaro para o circuito internacional. Especialistas avaliam que o longa pode encontrar um público significativo entre grupos conservadores ao redor do mundo, reforçando a narrativa de perseguição política e ampliando a presença da direita brasileira no campo cultural.