Da Redação

Falar de política em grupos de WhatsApp tem se tornado cada vez mais raro no Brasil. Conversas que antes rendiam debates acalorados em grupos de família, amigos ou trabalho agora dão lugar ao silêncio ou à mudança rápida de assunto. Além disso, mais da metade dos participantes desses espaços admite sentir receio de expressar opiniões políticas.

Esse comportamento aparece no estudo Os Vetores da Comunicação Política em Aplicativos de Mensagens, divulgado nesta segunda-feira, fruto de uma parceria entre o InternetLab e a Rede Conhecimento Social. A pesquisa ouviu mais de três mil pessoas em todo o país e analisou como a política vem sendo tratada dentro do aplicativo nos últimos anos.

Os dados mostram que a maioria dos usuários está em grupos familiares e de amizade, enquanto pouco mais de um terço participa de grupos profissionais. Já os espaços dedicados exclusivamente a debates políticos são minoria e perderam força. Em 2020, uma em cada dez pessoas fazia parte desse tipo de grupo. Hoje, o número caiu para pouco mais da metade disso.

Entre 2021 e 2024, também houve redução significativa na circulação de mensagens sobre política, governo e figuras públicas nos grupos mais comuns. Nos grupos de família, a presença desse conteúdo diminuiu de forma constante. O mesmo ocorreu nos grupos de amigos e de trabalho, indicando uma tendência generalizada de evitar o tema no cotidiano digital.

Relatos coletados pelo estudo reforçam esse cenário. Muitos entrevistados afirmam que há uma espécie de acordo informal para não misturar política com convivência pessoal. O objetivo é preservar relações e evitar desgastes desnecessários.

O medo de se posicionar aparece como um dos fatores centrais dessa mudança. Mais da metade dos entrevistados diz evitar opinar porque percebe o ambiente como agressivo. Esse sentimento é compartilhado por pessoas de diferentes posições ideológicas, o que indica que o receio não está restrito a um único grupo político.

Como consequência, cresce a autorregulação. Metade dos participantes afirma que pensa cada vez mais antes de escrever algo nos grupos. Outros dizem que simplesmente ignoram mensagens políticas quando surgem. Há ainda quem prefira sair dos grupos quando o clima se torna hostil, atitude já tomada por quase um terço dos respondentes.

Mesmo assim, uma parcela menor segue na contramão. Alguns usuários afirmam compartilhar conteúdos políticos mesmo sabendo que podem causar desconforto ou gerar conflitos. Entre os que se sentem mais seguros para falar do assunto, surgem estratégias como usar humor, conversar no privado ou restringir o debate a grupos onde todos pensam de forma semelhante.

Para os pesquisadores, o que se observa é um processo de adaptação. O WhatsApp segue profundamente integrado à vida cotidiana, e a política continua presente, mas de maneira mais cautelosa. Segundo a diretora do InternetLab, Heloisa Massaro, ao longo dos anos os usuários passaram a desenvolver regras próprias de convivência, criando uma espécie de ética informal para lidar com temas sensíveis nos grupos.

O estudo, realizado anualmente desde 2020, indica que esse comportamento reflete um amadurecimento no uso do aplicativo. Assim como nas relações presenciais, falar de política exige hoje mais cuidado, leitura do ambiente e, muitas vezes, silêncio para preservar vínculos.