SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Considerado por empresas do setor o palestrante mais caro do país, o empresário Flávio Augusto da Silva, fundador da rede de escolas de inglês Wise Up, vê o preço cobrado como questão de mercado. São R$ 590 mil por uma hora de apresentação. Se o contratante desejar outros 60 minutos de uma sessão de perguntas e respostas com a plateia, serão mais R$ 150 mil. O total é de R$ 740 mil.
“Tenho uma agenda de palestras muito restrita, em função dos meus intensos compromissos empresariais no Brasil e no exterior. Tenho milhares de funcionários e mais de 700 mil clientes ativos em minhas empresas. A demanda por palestras é grande e gosto de contribuir com empresários. A forma que uso para selecionar é regular o preço”, afirma ele.
Muito popular entre empreendedores, ele diz que planejava participar de dez eventos em 2025. Vai terminar com o ano com 18. Para reduzir a quantidade, ajustará o preço para 2026: a palestra vai custar R$ 1 milhão.
Flávio Augusto, também criador da plataforma de conteúdo Geração de Valor, é uma das faces mais visíveis do aquecimento do mercado de palestras no país.
Não há uma associação ou sindicato da categoria e nem um número confiável deste setor. Mas empresas ouvidas pela Folha calculam que acontecem cerca de 300 mil palestras corporativas a cada 12 meses. Também não existe estatística concreta de palestrantes.
“É um mercado que cresce de forma contínua. Neste ano, eu vendi cerca de 2.000 palestras”, diz Diego Trávez, CEO da DMT, uma das principais companhias de agenciamento no país.
Entre 2023 e 2024, por exemplo, a estimativa é que esta área tenha crescido cerca de 40% e que o ritmo tenha se mantido em 2025. É uma tempestade perfeita de empresas que reservam orçamento cada vez maior para eventos corporativos e de agências que oferecem palestrantes nas mais variadas faixas de preço.
“Um quarto das palestras que faço são pro bono [de graça], para entidades nas quais sou voluntário ou que busco apoiar. Os pedidos diários [para comparecer a eventos] que meu escritório recebe ficam entre seis e nove”, diz o filósofo, professor e escritor Mario Sergio Cortella.
O consenso entre empresas que fazem intermediação de eventos ou agenciam palestrantes é que ele é o nome mais requisitado do país. “Quase toda a agenda dele para 2026 já está preenchida”, afirma Lucas Lopes, CEO da Motiveação Palestras.
Embora diga que o preço varia de acordo com o evento e a ocasião, Cortella informa que, na média, cobra em torno de R$ 70 mil.
“Há uma dupla mudança expressiva no mercado de palestras corporativas. Uma redução dos eventos de caráter nacional que traziam vários palestrantes de modo agregado, e um aumento de pessoas que se colocam como palestrantes preparadas no campo da religião, religiosidade, espiritualidade, qualidade de vida e saúde integral, especialmente mental. Isso multiplicou a oferta”, completa Cortella.
“Eu recebo mais de 100 pedidos de cadastro de novos palestrantes por mês. Conheço palestrante que faz mais de 200 palestras por ano. O palestrante profissional vê esta vida como uma carreira e investe nela. Prospecta, faz vídeos de divulgação, paga por anúncios. Como se fosse uma padaria”, constata Dennis Penna, fundador da Polo Palestras.
É mercado com muitas opções porque os motivos para palestrar são diferentes. Há os que fazem disso uma profissão e há quem use como marketing pessoal de suas empresas ou para relatar experiências no mundo financeiro ou político. Os preços podem variar dos R$ 740 mil de Flávio Augusto a R$ 1.000 para iniciantes.
“Se pensarmos em toda essa gama que existe, diria que a média geral de uma palestra, se colocarmos todo mundo na mesma cesta, está entre R$ 25 mil e R$ 30 mil”, avalia Penna
Silvio Pacheco, ex-caminhoneiro e palestrante motivacional Acervo pessoal Homem de terno claro e camisa azul fala ao microfone em palco com fundo digital azul e branco. Tela exibe parte da palavra ‘ENERGIA’. Imagem pequena ** Alguém pode ser palestrante por achar ser uma vocação. Silvio Pacheco, 50, trabalhava há 13 anos como caminhoneiro e atravessava crise existencial. Sua mulher estava com depressão e ele não via as duas filhas crescerem. Como os amigos diziam que ele falava bem, sabia se expressar, largou tudo para tentar a vida de palestrante.
“Minha palestra é motivacional. Falo sobre os malefícios da comunicação ruim nas empresas. Meu primeiro evento foi em 2022 e tem sido uma jornada. Você tem de se entregar. Fiz vários cursos”, afirma.
Treze anos mais tarde, ele diz já ter recebido R$ 50 mil por um evento.
Para empresários e palestrantes, o aquecimento do setor é fenômeno deste século. Empresas dimunuíram as verbas para financiar cursos teóricos para seus colaboradores e passaram a apostar em programas de desenvolvimento prático. As palestras fazem parte disso.
“Tem a ver com comunicação. Quem domina a comunicação, o storytelling, consegue palestrar. Por isso que discernir quem é palestrante de palco [apenas exibicionista] e quem tem conteúdo e foi treinado para tal, é fundamental. Tem muito mais palestrante não ganhando dinheiro e disponível no mercado do que os que realmente entregam algo de qualidade”, diz Leandro Guissoni, palestrante, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e especialista em disrupção digital.
A Motiveação é uma das que tenta formar profissionais e tem curso chamado de MBA do palestrante. Outras apenas cadastram palestrantes e os oferecem em caso de oportunidade.
Na hora de contratar, a companhia pode ter demanda específica ou um perfil mais genérico. Em seguida, recebe opções de palestras que se encaixam na descrição, sempre de acordo com o orçamento disponível.
“Eu diria que 30% pedem um palestrante mais conhecido, mas 70% falam mais sobre as características que procuram. A gente faz a curadoria e indica algumas possibilidades. Mas a verdade é que tem palestrante de R$ 5.000 que dá uma palestra tão boa quanto outro que cobra R$ 50 mil”, diz Lopes.
Há também o que empresários do setor chamam de “supertendência” deste mercado: a contratação de nomes internacionais famosos. “Criamos uma área apenas para cuidar disso. As empresas [grandes] querem inovar e isso acontece com nomes internacionais”, afirma Trávez, da agenciadora DMT.
Quanto cobram as celebridades do estrangeiro é um tema tabu. Pessoas que organizam eventos dizem que, em casos como o do presidente norte-americano Barack Obama (2009-2017) ou do piloto de F1 Lewis Hamilton, o investimento necessário chega a US$ 10 milhões (R$ 54,4 milhões em valores atuais).
Para quem está na área, o crescimento do mercado pode ter a ver com a consciência de que palestrar também é entreter a plateia. E quem consegue isso será mais requisitado. E cobrar mais.
“Os cachês serem mais altos é pelo fato de os contratantes venderem mais fácil os ingressos e patrocínios com a minha presença. Fazendo uma comparação, este cachê ainda é menor do que muitos cantores sertanejos e artistas que fazem shows Brasil afora. Quanto mais ingressos e popularidade tem o artista, maior é o seu cachê. Assim funciona o mercado do entretenimento. A lógica é exatamente a mesma”, finaliza Flávio Augusto.