BRASÍLIA, DF, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) determinou que os ministérios de Minas e Energia, Fazenda e Meio Ambiente, além da Casa Civil, elaborem as diretrizes do plano para o fim do uso de combustíveis fósseis e também uma proposta do Fundo para a Transição Energética, financiado com verbas justamente de petróleo e gás natural.

Ambos os mecanismos foram defendidos pelo petista durante a COP30, a conferência sobre mudança climática da ONU (Organização das Nações Unidas) que aconteceu em novembro em Belém (PA).

Agora as pastas de Alexandre Silveira, Marina Silva, Fernando Haddad e Rui Costa têm 60 dias para elaborar propostas para o fundo e para o plano, chamado de mapa do caminho, de acordo com o despacho publicado nesta segunda-feira (8).

Tudo deve ser submetido “em caráter prioritário” ao CNPE, o Conselho Nacional de Política Energética, órgão que reúne todos os ministérios, é presidido por Lula e determina as diretrizes para essa área.

Um estudo do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) mostrou que menos de 1% dos recursos provenientes do petróleo no Brasil são usados para financiar iniciativas de combate à mudança climática ou de transição energética.

Durante seus discursos na COP30, Lula afirmou que o governo brasileiro iria criar um fundo para financiar essa área e que seria alimentado por recursos oriundos da exploração dos combustíveis fósseis.

O despacho publicado nesta segunda determina que as pastas devem elaborar “mecanismos de financiamento adequados à implementação da política de transição energética, inclusive a criação do Fundo para a Transição Energética, cujo financiamento será custeado por parcela das receitas governamentais decorrentes da exploração de petróleo e gás natural” —sem citar o carvão, mineral que é extremamente poluente.

Na conferência climática, Lula também pediu elaboração do mapa do caminho para o fim da dependência do uso dos combustíveis fósseis, pauta que é defendida pela ministra Marina Silva e ganhou impulso inédito após os discursos do petista.

A redução da exploração dessa matriz energética se tornou um tabu das COPs e, neste ano, chegou a ameaçar implodir as negociações.

A criação do mapa do caminho apareceu no primeiro rascunho do principal documento da conferência, o que gerou enorme tensão diante da intransigência dos países árabes, que não aceitavam qualquer tipo de menção aos fósseis na resolução.

Para evitar que todas as outras negociações travassem em razão da divergência, a presidência brasileira da COP30 decidiu retirar o mapa do caminho do texto e, como alternativa, prometeu elaborar, por iniciativa própria, uma proposta deste plano —que, por não constar no documento, não precisa ser aprovada nem obedecida por nenhum país.

Colômbia e outras nações, no entanto, apoiam a criação do plano. Um encontro para discuti-lo deve ocorrer em abril no país vizinho.

De acordo com o despacho de Lula, os três ministérios devem submeter ao CNPE uma proposta de resolução para “transição energética justa e planejada, com vistas à redução gradativa da dependência de combustíveis fósseis no país”.

Em Belém, Lula defendeu “começar a pensar como viver sem combustível fóssil”. “Estamos falando sério: é preciso que a gente diminua a emissão de gás de efeito estufa”, afirmou.

A pressão brasileira por um plano ocorreu logo após o país liberar, para pesquisa, a perfuração de um poço petrolífero na bacia da Foz do Amazonas, uma região ainda sem produção, contrariando alertas de ambientalistas contra a abertura de novas fronteiras exploratórias no mundo.

Logo após a COP, o Congresso aprovou lei estendendo os subsídios à geração de energia a carvão no país, também sob crítica de organizações ambientalistas.

O apoio do governo à exploração do petróleo é visto como contraditório com a proposta do mapa do caminho. “Como usar as receitas do petróleo e gás para financiar a transição sem, ao mesmo tempo, prolongar a vida dessa indústria”, questiona Natalie Unterstell, do Instituto Talanoa.

“Se essa iniciativa for usada para mudar o curso do atual modelo de expansão fóssil e abrir espaço para uma transição energética de verdade, é uma ótima notícia”, continua ela. “O Brasil não nasceu para ser o lanterninha da saída dos fósseis.”

Em defesa da ampliação da produção de petróleo, o governo alega que a matriz energética brasileira já é mais limpa do que a média mundial e que o país não pode abrir mão de explorar suas riquezas naturais.

Por outro lado, Lula tem sido mais vocal a favor da transição energética após a COP. Em evento com a Petrobras na semana passada, afirmou que a empresa não pode se concentrar apenas em petróleo e gás, mas precisa caminhar no sentido da energia limpa.

“A Petrobras, embora seja uma empresa de petróleo, é mais do que isso. Ela é uma empresa de energia e ela tem que utilizar parte do dinheiro que ela ganha para fazer a transição energética”, afirmou.

Ex-presidente da SRB (Sociedade Rural Brasileira), o pecuarista Pedro de Camargo Neto, questionou a ausência do Ministério da Agricultura no grupo definido por Lula para debater o mapa do caminho. “Não há transição sem os biocombustíveis”, afirmou.

Ele argumenta que é necessário um olhar para garantir competitividade dos biocombustíveis frente ao petróleo, que enfrenta um ciclo de baixa nos preços, para evitar fraudes como a mistura de biodiesel abaixo do percentual obrigatório.