SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em seus mais de 20 livros, entre romances e volumes de contos e crônicas, o paulistano Marcelo Mirisola sempre falou muito sobre sexo. Nada do ato embalado pelo amor romântico. Seu negócio é o coito em busca do prazer físico, algumas vezes degradante, como se viu em “Bangalô” (2003) e “Hosana na Sarjeta” (2014).

Em “Espeto Corrido”, o novo livro do autor prestes a completar 60 anos, as perversidades e as fantasias sexuais, em geral estilhaçadas pela realidade, estão ainda mais presentes. O romance é um elogio despudorado às possibilidades abertas pelo Tinder, aplicativo de relacionamentos.

“Antes do Tinder era o vácuo. O tempo não existia. Não existiam passado, presente e futuro; tratava-se apenas de uma maçaroca de nadas acumulados. Somente a partir do Tinder (e outros aplicativos de putaria), tempo e espaço começaram a existir”, escreve Marcelo, o alter ego do autor, figura que conduz boa parte dos seus livros.

Vivendo entre Rio de Janeiro e São Paulo, o narrador coleciona encontros para satisfazer seus fetiches. Invariavelmente, sua imaginação erótica desperta mais interesse do que os atos sexuais quando concretizados.

Marcelo é um personagem enredado nos delírios e nas frustrações do sexo, tão mordaz e grotesco quanto vulnerável em busca de qualquer –qualquer mesmo– forma de gozo. Neste universo amoral, não existe nada além da carne.

As mulheres, porém, são tipos menos interessantes, às vezes mal passam de esboços. Surgem ao longo “Espeto Corrido” a estudante de cinema e dublê de garota de programa da zona sul do Rio; a “alemoa” dona de pré-escola da Mooca, em São Paulo; a dentista do Itaim Bibi, também da capital paulista; a funcionária de um necrotério de Sorocaba; e tantas outras.

O personagem volta a esculhambar a classe média e o meio cultural, especialmente a literatura.

“Eu devo cada vírgula dos meus vinte e dois livros à classe média. Só tenho a agradecer”, ele diz. A certa altura, faz sua homenagem a Monte Verde, um lugar pra “classe média acreditar que está nos Alpes suíços, usar cachecol e soprar fumacinha nas mãos em concha”.

Em meio aos encontros, expõe referências que vão de Bruno e Marrone a Paulo Vanzolini, de Matilde Mastrangi a Lady Macbeth, de Paulo Coelho a Stefan Zweig. Volta a ridicularizar o bom-mocismo literário.

“O estrago que o dito politicamente correto fez na humanidade talvez seja irreversível”, escreve o dramaturgo Leo Lama na orelha do livro. Para quem concorda com essa afirmação, o banquete de carnes de Mirisola está servido.

ESPETO CORRIDO

– Preço R$ 90 (em São Paulo, à venda apenas na Ria Livraria e no Sebo do Bactéria)

– Autoria Marcelo Mirisola

– Editora Velhos Bárbaros