SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O escândalo do Banco Master, que levou à prisão de Daniel Vorcaro por 12 dias, tem gerado reflexo sobre parentes do banqueiro e outros negócios da família.

O clã sofreu um revés na CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que rejeitou na última terça-feira (2) uma proposta de acordo para encerrar um processo que envolve empresas e integrantes da família e apura irregularidades em um fundo imobiliário.

Em outra frente, após a liquidação do banco no mês passado, o cunhado Fabiano Zettel entrou na mira de partidos da esquerda, que tentam incluí-lo na investigação da CPI do INSS e questionam sua doação de R$ 5 milhões para as campanhas de Jair Bolsonaro (PL) e Tarcísio de Freitas (Republicanos) nas eleições de 2022.

Casado com Natalia Vorcaro, irmã do banqueiro, Zettel é pastor da igreja Lagoinha e vem ganhando destaque no mundo do empreendedorismo nos últimos anos com marcas como a rede de açaí Oakberry e a academia de luxo Les Cinq.

Em 2022, ele foi o sexto do ranking de pessoas físicas doadoras. Repassou R$ 3 milhões para Bolsonaro, a maior doação individual recebida pela campanha à reeleição, e R$ 2 milhões para a corrida de Tarcísio, que venceu a disputa pelo governo de São Paulo. Pela lei eleitoral, pessoas físicas podem doar aos candidatos até 10% de sua renda bruta do ano anterior à eleição.

Como base de comparação para dimensionar o tamanho da doação de Zettel, o empresário Rubens Ometto, da Cosan, que tradicionalmente aparece no topo do ranking de doadores, repassou R$ 7,4 milhões em 2022, sendo R$ 200 mil em doação direta para Tarcísio.

Fora Bolsonaro e Tarcísio, Zettel doou R$ 10 mil para Lucas de Vasconcelos Gonzalez (Novo) em uma campanha a deputado federal por Minas Gerais. O candidato também recebeu recursos de outros membros da família Vorcaro.

Mesmo não tendo sido alvo da operação contra o banco Master, que prendeu Daniel Vorcaro em 17 de novembro, os deputados Rogério Correia (PT-MG) e Alencar Santana (PT-SP) protocolaram requerimentos à CPI do INSS para rastrear a movimentação financeira de Zettel e convocá-lo a depor.

Eles dizem ver necessidade de investigação de eventuais conexões com entidades que se beneficiaram dos descontos a pensionistas. O elo, segundo os parlamentares petistas, seria sua relação com a igreja Lagoinha, que lançou uma fintech, o Clava Forte Bank.

“A Controladoria-Geral da União, no âmbito das investigações sobre a farra do INSS, apontou a utilização de igrejas evangélicas por suspeitos de desviar recursos de aposentados e pensionistas, como meio para promover lavagem de dinheiro”, diz trecho do requerimento de Correia.

Além de Zettel, sua esposa também prega na Igreja Lagoinha Belvedere.

Formado em direito, Zettel é fundador e CEO da Moriah Asset, um fundo de investimento em participações (private equity). Por meio dela, ele é sócio de marcas como Frutaria São Paulo, Empório Frutaria e Néctar, além de Oakberry, Les Cinq, Desinchá e da Super Nutrition, de suplementos, como creatina.

A Moriah também foi alvo de um requerimento do deputado Rogério Correia na CPI do INSS, que pediu quebra de sigilo bancário e fiscal da empresa para apurar eventual envolvimento com o caso. Os requerimentos sobre Zettel e a Moriah ainda não foram apreciados. Nesta quinta (4), a CPI aprovou a convocação de Daniel Vorcaro para prestar depoimento sobre crédito consignado.

Os empreendimentos de Zettel não estão ligados diretamente a Vorcaro no Master, mas ele já atuou em negócios relacionados ao banqueiro. Conforme reportagem publicada pela Folha em maio, foi diretor da Super Empreendimentos, empresa que em 2024 adquiriu a casa de R$ 36 milhões, que ficou conhecida como hub de Vorcaro em Brasília.

Lá o banqueiro recebeu políticos, como o senador Ciro Nogueira, presidente do PP, Antonio Rueda, do União Brasil, e Hugo Motta (Republicanos-PB), da Câmara dos Deputados, e nomes do governo Bolsonaro, como Fábio Faria, ex-ministro das Comunicações, e Bruno Bianco, ex-advogado-geral da União.

O imóvel voltou a gerar repercussão há cerca de três meses, após a deflagração da Carbono Oculto —operação que mira a infiltração do PCC no setor de combustíveis e no mercado financeiro—, porque a Super pertencia a um fundo gerido pela Reag. Um dos alvos da operação, a Reag administra parte dos fundos do banco Master.

Além disso, empresas de Daniel Vorcaro também estão registradas no mesmo endereço de alguns dos negócios de Zettel. Em um complexo comercial na avenida Raja Gabaglia, em Belo Horizonte, há uma sala que, ao mesmo tempo, é sede da Vinc Consultoria e Investimentos e da Viking Participações, das quais Vorcaro é sócio. O local também abriga a Adonay Participação SA e a FSW SPE, nas quais Zettel aparece como administrador, segundo dados da Receita Federal.

Com R$ 500 mil de capital social, a Vinc atua em consultoria e comercialização de imóveis, enquanto a Viking, com R$ 100 milhões de capital é uma empresa de participações que ficou conhecida na ocasião da prisão de Vorcaro por ser proprietária do jato em que o dono do Banco Master pretendia embarcar para viajar a Malta.

A Viking é também acusada em um processo na CVM, aberto em 2020, que apura irregularidades em um fundo de investimento imobiliário fechado, chamado Brazil Realty. Entre os acusados no processo estão Daniel Vorcaro, como responsável pelo Máxima (antigo nome do Master), que comprou cotas do fundo, e seu pai Henrique, como responsável pela Milo, que também investiu no Brazil Realty.

Natália Vorcaro não está na lista de acusados no processo. Ela é diretora e presidente de duas das empresas que aparecem entre os acusados nesse mesmo processo, respectivamente, a Milo e a MGI Desenvolvimento Imobiliário.

Na tentativa de acordo rejeitada pela CVM na terça, parte dos acusados propuseram um pagamento de R$ 21,3 milhões para encerrar o processo. À autarquia, eles negam irregularidades.

Procurados pela reportagem, Henrique, Natalia e Daniel Vorcaro não se manifestaram.

Zettel disse, em nota, que o controle da Super foi “sendo alterado gradualmente”. Sobre o registro das empresas em um mesmo endereço, afirma que “todos os seus investimentos e atividades empresariais são formais e regulares”. Sobre as doações eleitorais, Zettel não comentou.

Também procurada, a assessoria de Bolsonaro não se manifestou. A de Tarcísio afirmou que sua campanha teve mais de 600 doadores e respeito às leis eleitorais. “O governador não possui qualquer vínculo ou relação com o doador citado, bem como conhecimento prévio sobre possíveis condutas que não dizem respeito à campanha. A prestação de contas de Tarcísio foi devidamente aprovada pela Justiça eleitoral.”