SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A revelação da cor do ano da Pantone para 2026 -Cloud Dancer, um tom de branco- veio acompanhada da justificativa de que se trata de uma cor serena e equilibrada, capaz de trazer calma a uma sociedade saturada. Na prática, porém, soou para muitos como uma ironia involuntária: a cor escolhida para representar o ano é, essencialmente, cor nenhuma.

A aguardada escolha anual da Pantone é vista como uma espécie de bússola estética e emocional, capaz de orientar o clima do ano seguinte. Nas semanas que antecedem o anúncio, designers e especialistas passam a especular qual sentimento coletivo será traduzido em pigmento. Quem acompanha essa tradição sabe que não se trata simplesmente de definir uma tinta para orientar paletas de design, mas de tentar condensar em uma cor -ou, neste caso, na ausência dela- a narrativa dominante do momento.

Por isso, muitas pessoas se surpreenderam com o tom de 2026, especialmente após o ano anterior ter sido marcado por Mocha Mousse, um marrom quente que foi um hit na indústria e reforçou a capacidade preditiva da Pantone. Comparado à cor anterior, Cloud Dancer pareceu, para muitos, descolado da realidade.

A empresa descreve a escolha como “um símbolo de influência calmante em uma sociedade frenética que redescobre o valor da consideração ponderada e da reflexão silenciosa”. Mas o que deveria trazer serenidade tornou-se um dos anúncios mais controversos da história da Pantone, gerando uma onda de críticas na imprensa especializada e nas redes sociais.

A imagem oficial de lançamento, que mostra uma mulher vestida de branco olhando para um céu igualmente branco, buscava reforçar a proposta de contemplação. No entanto, no clima político atual, especialmente nos Estados Unidos, o branco deixou de ser lido como neutro ou pacífico.

A crítica Vanessa Friedman, do New York Times, observou que “associações menos salubres saltam imediatamente à mente”, sugerindo que a Pantone talvez não tenha calculado a profundidade simbólica da própria decisão. Em um contexto de tensões raciais, retrocessos em políticas de diversidade e retórica nacionalista, não há cor mais suscetível a interpretações políticas do que o branco.

Nas redes sociais, parte do público classificou a escolha como uma “microagressão”, e comparações surgiram até com a recente polêmica do anúncio da American Eagle com Sydney Sweeney, em que um trocadilho entre jeans e genes foi interpretado como carregado de eugenia.

Para os internautas, a escolha foi associada a temas econômicos, políticos e culturais que extrapolam o campo estético. Entre alguns, a ausência de cor seria um prognóstico econômico: “A cor do ano ser branco é um indicador de recessão, só pode”, diz um dos comentários no post da Pantone. Outros viram provocação ou descuido por parte da empresa: “Vocês têm 27 dias para consertar isso, vamos lá!”. Houve também suspeitas de que a empresa buscava engajamento pelo choque: “Isso é rage bait?”, questionou um seguidor.

“Branco é ausência de cor, e vocês são uma empresa de cores. Isso mostra uma falta de criatividade impressionante e uma desconexão completa com as comunidades artísticas”, diz um comentário. A Cloud Dancer ainda chegou a ser associada ao imaginário supremacista americano, descrita como “uma cor tão Maga”.

No Brasil, a marca de tintas Suvinil aproveitou para surfar na onda e anunciou suas próprias cores: “Branco para cor do ano de 2026? Não, obrigada. Bora sentir e viver tudo com ‘Tempestade’ e ‘Cipó da Amazônia’.” Com isso, apresentou seus novos tons de rosa e verde -nada neutros.

Agora, Cloud Dancer precisa provar pode traduzir o espírito de um ano que ainda nem começou. A escolha, longe de pacificar, acendeu debates e virou um verdadeiro elefante branco para a indústria criativa.