SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As big techs quase quadruplicaram a parcela do faturamento no Brasil que enviam para o exterior entre 2014 e 2024, enquanto a carga tributária sobre as remessas caiu 73% no período.
Dados agregados da Receita Federal obtidos pela reportagem apontam que a porcentagem do faturamento no Brasil que as principais multinacionais de tecnologia mandam para fora aumentou 323% entre 2014 e 2024.
As big techs passaram a mandar mais de metade do dinheiro ganho no Brasil para outros países. Em 2014, remeteram ao exterior 17,12% de sua receita. Em 2024, foram 55,66%, ou seja, mais da metade. O pico das remessas foi em 2023, quando elas corresponderam a 61,87% do faturamento.
Embora as big techs reclamem da alta carga tributária no Brasil, os impostos sobre as remessas encolheram proporcionalmente -eram 30,42% em 2014 e foram para 22,13% em 2024.
As remessas passaram de R$ 2,8 bilhões em 2014 (R$ 4,93 bilhões corrigidos pelo IPCA) para R$ 80,3 bilhões em 2024.
O faturamento bruto das big techs também deu um salto -passou de R$ 21,327 bilhões em 2014 (corrigido pelo IPCA) para R$ 144,3 bilhões em 2024, um aumento de 585%.
Já a carga tributária federal sobre o faturamento bruto foi de 17,9% em 2014 para 22,7%, alta de 13%.
Os dados incluem faturamento, arrecadação e remessas da Amazon (incluindo AWS), Apple, Facebook, Google, Google Cloud, Microsoft e Nvidia no Brasil.
As alíquotas dos impostos que incidem sobre os diferentes tipos de remessa não mudaram entre 2014 e 2024. A carga tributária sobre as remessas mudou porque aumentou a participação de certos tipos de remessa, como royalties, que têm incidência média de impostos menor (e variam de acordo com o destino do envio). Ao mesmo tempo, categorias de remessas como rendimentos do trabalho, que têm alíquota média maior, caíram proporcionalmente.
Na comparação com outros setores econômicos, as big techs não estão entre as mais tributadas. Segundo levantamento da Firjan a partir de dados da Receita Federal, Secretaria do Tesouro Nacional, Confaz, Caixa Econômica Federal e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o setor com maior carga tributária (incluindo impostos federais, estaduais e municipais) é a indústria de transformação, com 49,2%.
Os menos tributados são a agropecuária e indústria extrativa (8%) e construção (24,1%), seguidos pelos serviços, que incluem empresas de tecnologia, instituições financeiras e diversos outros segmentos (29,7%), comércio (38,3%) e serviços industriais de utilidade pública (energia elétrica, telecomunicações, abastecimento de água, coleta de resíduos), com 41,1%.
Segundo a Firjan, grande parte da diferença decorre dos tributos estaduais, especialmente o ICMS, que incide principalmente sobre a indústria de transformação.
Mas mesmo analisando apenas impostos federais, o setor de serviços não é o mais onerado. A indústria registra uma carga de 23,2%, enquanto serviços aparecem em segundo lugar, com 16,9%.
“Quando analisamos apenas os impostos federais, a indústria já aparece como o setor que mais paga tributos no Brasil”, diz Jonathas Goulart, economista-chefe da Firjan. “O cenário fica ainda pior quando incluímos todos os impostos, especialmente o ICMS, que recai de forma desproporcional sobre a produção industrial. Hoje, a indústria de transformação entrega em impostos o equivalente a 50% de tudo que produz.”
Em nota, a Câmara Brasileira da Economia Digital (camara-e.net), que representa empresas como Amazon, Google e Meta (Facebook), destacou que as empresas de serviços digitais estão entre as maiores contribuintes do país e “desempenham papel fundamental no desenvolvimento econômico brasileiro, seja pelo volume de contribuições fiscais ou pelo investimento contínuo em inovação, tecnologia e geração de empregos e renda.”
A câmara enviou um parecer técnico contratado pela entidade e feito pela consultoria LCA, a partir de dados da Receita Federal, apontando que as empresas de serviços digitais pagam mais tributos sobre o próprio lucro do que empresas de outros segmentos da economia. Segundo o estudo da LCA, em média, essas empresas recolhem 16,4% da sua receita bruta em tributos federais -mais que o dobro da média dos demais setores econômicos (6,1%). Entre as maiores empresas do setor, enquadradas no regime de lucro real, essa carga chega a 18,3% da receita bruta, superior à de companhias de lucro presumido (12,8%).
Quanto ao salto na parcela do faturamento que é enviado como remessas ao exterior, a entidade afirma: “É importante contextualizar que remessas associadas a atividades internacionais fazem parte da dinâmica natural de empresas globais e de modelos de negócios intensivos em tecnologia”.



