SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Quando publicou ‘Cultura da Convergência’ [2006], livro que marcou o início da tão anunciada revolução digital, Henry Jenkins afirmou que tudo estava mudando simultânea e desordenadamente, e que parecia não haver um ponto privilegiado, fora dessa confusão, que permitisse enxergar e compreender as coisas.”

A menção feita pela professora do Departamento de Comunicações e Artes da ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo) Issaaf Karhawi, no prefácio do livro de Carolina Terra “De Funcionários a Influenciadores: Por Que Ter Programas de Funcionários Influencers Vale a Pena” (Summus, 2025), evidencia o quão fugaz parece ser qualquer análise sobre o impacto das mídias sociais no cotidiano dos indivíduos.

Na obra, Carolina Terra, mestre e doutora em ciências da comunicação pela USP, dona de uma consultoria de mídias sociais e relações públicas digitais, busca convencer o leitor de que “funcionários e líderes podem ser utilizados como instrumento de construção de imagem e reputação para as marcas que representam, mas também como tais iniciativas podem ser benéficas para eles e suas carreiras”.

De fato, a autora destaca que marcar presença nas redes sociais hoje contribui para formar o próprio “capital social” -um dos três capitais sobre os quais fala o sociólogo francês Pierre Bourdieu, para quem a sociedade é um campo de lutas por capital econômico, cultural e social. Este último é proporcional ao tamanho das redes de conexão que o indivíduo consegue mobilizar. Se a sociedade está nas redes, é para lá que precisam se dirigir os presidentes de empresas e os funcionários, segundo Carolina.

Mas a obra reforça apenas o quão relevante é para o CEO se expor de maneira estratégica nas comunidades virtuais. Nesses espaços, os executivos têm a chance de chamar a atenção não apenas para o seu talento pessoal à frente dos resultados da companhia como expor o engajamento da equipe, o que conta pontos para o seu currículo.

Para os funcionários em geral, porém, Carolina indica que o público vê com bons olhos quando trabalhadores se mostram comprometidos, que isso reforça a imagem da companhia (até para atrair novos talentos) e que os funcionários devem ser não só incentivados mas de alguma forma remunerados pelo trabalho como influenciadores.

Toda essa análise é verdadeira, mas está datada: pelo menos no Brasil, se mostrou plausível até meados de 2023. Como um dos países que mais consomem conteúdo de redes sociais no mundo, o Brasil viu uma avalanche de influencers, de todos os tamanhos, desde as estrelas da música e da TV até os vizinhos e colegas de trabalho, tomarem conta das redes sociais.

O excesso gerou um aumento do escrutínio: o público não se deixa levar por qualquer apelo ou discurso, especialmente os ligados a fins comerciais. Sim, o brasileiro vem consumindo cada vez mais conteúdo de influencers, mas o peso sobre a decisão de compra é limitado, conforme apontou pesquisa realizada em setembro pela consultoria Ponto Map em parceria com a V-Tracker, publicada pela Folha.

De acordo com o levantamento, apenas 19% afirmam ter comprado produtos a partir de posts de influenciadores nos últimos três meses. Um percentual ainda inferior (13%) mudou de opinião sobre algum tema. Quase metade da população (49%) afirma não tomar decisões baseadas em influenciadores.

O que se viu nos últimos anos é que os funcionários não se tornaram influencers de fato de seus empregadores, uma vez que existe certa desconfiança do público em ver amigos e conhecidos falando bem nas redes sociais de empresas com quem mantêm vínculo empregatício. Pesquisas como a da Ponto Map já mostraram que os usuários buscam autenticidade nas redes. Eles entendem que a publicidade faz parte do negócio dos influencers, mas desejam que o patrocínio esteja explícito no post.

As companhias, por sua vez, passaram a apostar muito mais nos nano e microinfluenciadores, aqueles que têm mais vínculo com determinados segmentos da sociedade, para inserir suas marcas nos conteúdos que eles geram.

Carolina Terra cita como exemplo de empresa que criou a figura do funcionário influencer o Itaú, com o programa de “iTubers”. Em setembro, no entanto, o banco acumulou críticas nas redes sociais após uma demissão em massa de mil funcionários por suposta baixa produtividade no home office e “padrões incompatíveis com os princípios de confiança”. Foram dispensados inclusive trabalhadores que haviam batido metas e haviam sido promovidos.

A partir dos exemplos apontados pela autora, fica claro que a exposição nas redes acontece com maior naturalidade quando se trata de fundadores e membros da família controladora da empresa. São citados os casos de Caito Maia (Chillibeans), Cristina Junqueira (Nubank), Karla Felmanas (Cimed), Luiza Trajano (Magalu) e Stelleo Tolda (Mercado Livre). João Branco é o único exemplo de um não CEO, e que não está mais no cargo: ele foi o principal executivo de marketing do McDonald’s, responsável pela criação da marca “Méqui”, que decidiu enveredar pela carreira solo como consultor, mentor e palestrante.

Entre os CEOs, a autora também aponta como exemplo o empresário Alê Costa, que fundou a Cacau Show em 1988, aos 17 anos. “Está no Facebook, Instagram, LinkedIn, TikTok e no X”, diz Carolina Terra. “É visto como um líder acessível e carismático, que se preocupa com seus funcionários e clientes.”

Reportagem da Folha publicada em 31 de maio revelou o clima de medo por parte de franqueados da Cacau Show, que acumulam dívidas por taxas que consideram abusivas junto à companhia. Os relatos falam de ameaças veladas ou diretas recebidas de consultores da empresa, além do culto à personalidade do fundador da rede.

Conforme previsto pelo pesquisador de mídia americano Henry Jenkins, tudo muda “simultânea e desordenadamente” com as redes sociais. Quanto maior a exposição, maior a cobrança pública.

DE FUNCIONÁRIOS A INFLUENCIADORES: POR QUE TER PROGRAMAS DE FUNCIONÁRIOS INFLUENCERS VALE A PENA

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Autoria Carolina Terra

Editora Summus