BERLIM, None (FOLHAPRESS) – O primeiro-ministro da Alemanha, Friedrich Merz, obteve vitória apertada e importante no Parlamento nesta sexta-feira (5), em Berlim, ao conseguir aprovar polêmica reforma previdenciária, que estende um piso para aposentadorias do país até 2031.

A ala jovem de seu próprio partido, a CDU, havia ameaçado não apoiar o projeto, alegando que as gerações futuras seriam oneradas em € 120 bilhões (R$ 735,7 bilhões) nos próximos anos. Após intensas negociações, o pacote acabou passando por 318 votos —a direção da Casa havia anunciado 319, mas corrigiu o número depois.

O resultado é ainda menos confortável quando se sabe que são 328 os votos potenciais da coalizão de governo, que reúne também a CSU, aliança perene dos conservadores, e os sociais-democratas do SPD.

Não é a primeira vez que Merz sofre com o fogo amigo. Em maio, seu nome como primeiro-ministro só foi aprovado em segunda votação, um constrangimento inédito no Bundestag.

O grupo rebelde de 18 deputados, liderados Johannes Volkmann, 28, neto de Helmut Kohl, premiê da Alemanha de 1982 a 1998 e figura histórica da política alemã, expressou sua insatisfação com o projeto até o debate prévio à votação no Bundestag, na manhã desta sexta.

A dissidência movimentou a opinião pública, notadamente empresários e sindicatos de trabalhadores nas últimas semanas. Para economistas, o sistema atual não é sustentável e ainda entrega uma das mais baixas pensões entre os países europeus, segundo levantamento da OCDE.

A Previdência alemã se baseia sobretudo no sistema de repartição, como no Brasil, em que a geração ativa sustenta o pagamento dos aposentados. Há também um sistema público de capitalização, em que o empregado faz uma poupança para o futuro, mas pouco atrativo; os fundos privados, mais caros, atendem a uma parcela restrita da população.

“A mudança demográfica não espera pelas próximas eleições”, declarou Pascal Reddig, um dos parlamentares que instigou a revolta. O custo do pacote de pensões paralisará o Orçamento federal, segundo as contas apresentadas pelo grupo, risco que o governo nega.

Pelo esquema atual, os alemães recebem na aposentadoria 48% da renda média que alcançaram durante a carreira. O patamar foi fixado pela antiga coalizão, liderada pelo SPD, e acabaria no fim deste ano. Na formação do governo Merz, os sociais-democratas condicionaram o acordo com Merz à manutenção das pensões nesse nível pelo menos até 2031.

A Juventude da CDU, portanto, sabia que sua oposição à reforma tinha potencial de implodir a coalizão. No último fim de semana, um discurso da ministra do Trabalho, Bärbel Bas, para ala jovem do SPD, piorou o ambiente. A social-democrata despejou a responsabilidade da falência do sistema às empresas.

O placar da votação refletiu a disputa. Todos os parlamentares do SPD votaram a favor do projeto, que inclui também isenção fiscal parcial para quem continua na ativa após a aposentadoria e reforça uma pensão para mães. Sete deputados da aliança CDU/CSU votaram não e outros dois se abstiveram.

Outro ponto de constrangimento para Merz foi o anúncio do partido A Esquerda de que orientaria a abstenção a seus parlamentares, diminuindo assim a necessidade de votos da própria coalizão. “Trata-se da vida de 21 milhões de pensionistas. Se este pacote não for aprovado, eles ficarão em pior situação, terão menos dinheiro”, disse a líder da legenda, Heidi Reichinnek.

Segundo a parlamentar, que fez uma campanha eleitoral viral nas redes sociais e divide com Merz a liderança entre as personalidades mais buscadas no Google neste ano (ambos superados por um rapper), afirmou que “um em cada cinco aposentados vive na pobreza” na Alemanha. A abstenção foi uma maneira encontrada pelo partido de não se alinhar com o governo, mas manter o nível das pensões atuais.

Precisar do grupo de oposição para aprovar o projeto faria o premiê engolir as próprias palavras. Em mais de uma oportunidade, Merz comparou A Esquerda com o AfD, o partido considerado de extrema direita pelos serviços de segurança do governo alemão.

Porta-voz da legenda populista, que chamou o dia de votação como um “caos” criado por Merz, ofereceu uma solução simplista para as pensões. “Se cada um de vocês, ou da sua geração, tiver dois ou três filhos, os problemas simplesmente desaparecerão”, declarou Gerrit Huy aos rebeldes da CDU.

A questão demográfica assombra não apenas a Alemanha, mas quase todos os países da Europa. Exceção feita a Espanha e Luxemburgo, pouco são os que procuram alívio do problema com políticas de admissão de imigrantes e dupla cidadania.

A votação no Bundestag evidencia a fragilidade da coalizão de governo, que, após sete meses, ainda não conseguiu aparar as arestas entre conservadores e sociais-democratas. No meio do ano, uma indicação para a corte constitucional do país foi inviabilizada por uma divergência entre os partidos alimentada por sites de direita —a juíza indicada para a vaga desistiu da nomeação diante do impasse.

No único projeto do dia que contou apoio quase unânime de conservadores e sociais-democratas, o Parlamento confirmou a volta do serviço militar em caráter voluntário, recebida com protestos de adolescentes e jovens nas ruas de Berlim. Ministro da Defesa, Boris Pistorius elogiou a disposição dos manifestantes em discurso, mas declarou que a questão não era política.

“É a segurança da Alemanha que está em jogo.