SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Justiça de São Paulo ratificou em segunda instância a anulação da primeira expulsão da Faculdade de Direito da USP e determinou que a instituição diplome o aluno afetado.
Victor Henrique Ahlf Gomes, 23, teve sua matrícula encerrada em outubro de 2024 por acusações de calúnia, difamação e importunação sexual, contra a ex-namorada, além de racismo. Desde então, recorria da decisão.
Em março deste ano, a juíza Gilsa Elena Rios, da 15ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, anulou o PAD (Processo Administrativo Disciplinar) contra o estudante. A USP recorreu. Nesta quarta-feira (3), o Tribunal de Justiça paulista negou o recurso.
A 5ª Câmara de Direito Público, em julgamento unânime, entendeu que a expulsão foi “desproporcional” aos fatos apresentados. Para os desembargadores, o caso “não ultrapassa os limites acobertados pela liberdade de manifestação” e a suposta importunação sexual teria ocorrido fora do ambiente universitário. Assim, nada teria a ver com a instituição.
Segundo a decisão, a Faculdade de Direito deve realizar a colação de grau e conceder o diploma a Ahlf. A advogada dele, Alessandra Parmigiani, comemorou a decisão, dizendo ter sido muito importante ter enfrentado todas as questões.
A USP ainda pode recorrer ao STJ (Superior Tribunal de Justiça). Questionada se pretende fazer isso, a universidade não respondeu até publicação deste texto.
ENTENDA
O caso começou em meados de 2022, quando o então graduando terminou com a namorada, que havia conhecido no início do curso, dois anos antes. Ele relatou que a jovem teria começado a espalhar os motivos da separação, afirmando ter sido agredida e abusada sexualmente.
Gomes tomou duas medidas contra a ex: registrou um boletim de ocorrência e pediu à USP uma sindicância por calúnia, difamação e perseguição.Durante a investigação, conduzida por um grupo de professores, a junta suspeitou de que o acusador seria o autor dos delitos referidos e ainda praticaria violência psicológica contra a companheira.
Foi anunciada, então, a abertura de um processo administrativo contra o jovem. Alegando ser vítima, o estudante apresentou capturas de tela com mensagens que mostrariam, na verdade, agressividade de sua parte, segundo a apuração. Além da garota, ele também teria ameaçado e ofendido amigas dela.
O relatório da USP recolheu depoimento afirmando que Gomes também teria realizado “depreciação jocosa da aparência e da residência de uma estudante negra à luz de seus olhos arianos'”, por ela não ter “o sangue puro dos alemães”.
Em sua defesa preliminar, Gomes argumentou padecer de imaturidade afetiva inerente à sua juventude e que buscava apenas uma retratação pública da ex-companheira, a qual acusou de espalhar mentiras por ciúmes.
Vinte testemunhas foram ouvidas e sustentaram a versão de que o aluno seria agressivo. Nas suas alegações finais, o graduando chamou as testemunhas de mentirosas e defendeu anulação do processo administrativo contra ele.
Em setembro de 2024, a comissão decidiu pela sua expulsão da USP por atentado aos bons costumes e perturbação dos trabalhos escolares e da administração, ilícitos previstos no código de ética da universidade.
Para os responsáveis pelo processo, os atos dele foram extremamente graves e, além de violarem preceitos éticos fundamentais da universidade, abalaram a comunidade acadêmica.
A decisão foi referendada pela Procuradoria Geral da instituição e oficializada pela congregação da Faculdade de Direito, em outubro .”DRs [discussões de relação] são fatos normais e aceitáveis na vida de casais, o que ocorreu não é normal nem aceitável, embora talvez seja tristemente frequente”, escreveu o professor Rafael Mafei na ata da congregação.
Ao final do processo, o graduando já estava no último semestre, com sua colação de grau marcada.



