SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A mais nova arma dos Estados Unidos no teatro de operações do Oriente Médio, onde o Irã é o centro das atenções de Washington, é um drone kamikaze copiado de um modelo iraniano.
O Centcom (Comando Central das Forças Armadas dos EUA, no acrônimo em inglês), responsável por ações no Oriente Médio, anunciou nesta quarta-feira (3) a abertura do primeiro esquadrão dedicado a operar esse tipo de modelo por Washington.
Drones passaram a ser tratados como prioridade nos EUA apenas em julho desde ano. Para ganhar tempo, escala e economizar dinheiro, o modelo escolhido pelos fardados foi o Lucas, outro acrônimo inglês para Sistema de Ataque e Combate Não Tripulado de Baixo Custo, desenvolvido pela empresa SpektreWorks.
“A nova força-tarefa dá as condições para empregar inovação como dissuasão”, disse o comandante do Centcom, almirante Brad Cooper. A unidade se chama Força-Tarefa Ataque do Escorpião, e praticamente nada se sabe sobre ela ou os números de armamentos que ela irá operar.
Com isso, a maior potência militar da história se rende a soluções de baixo custo que começaram a ter o impacto sentido na guerra entre Azerbaijão e Armênia em 2020 e que explodiram a partir da invasão russa da Ucrânia, dois anos depois.
O desenvolvimento das tecnologias de drone é frenético. Neste momento, é Moscou que tem a vantagem no campo de batalha sobre Kiev, após a introdução maciça de modelos guiados por cabos de fibra óptica, que não sofrem interferência de bloqueadores eletrônicos.
Os EUA chegaram a ter a primazia no campo nos anos 2000, com os modelos de reconhecimento e combate que até hoje operam. Mas, como disse à Folha de S.Paulo em setembro o criador do drone de fibra óptica russo, Alexei Tchadaiev, os americanos tratavam as armas como aviões de combate.
Isso implica custos altos e inviabiliza o conceito dos drones kamikaze, que se lançam sobre os alvos. A partir de uma diretiva do Departamento de Defesa em julho, a história parece começar a mudar e os EUA correm atrás de rivais mais bem colocados, como Rússia e China que também testa um modelo semelhante ao Shahed-136, o Loong.
O secretário da pasta, Pete Hegseth, anunciou na terça (2) que haverá US$ 1 bilhão (R$ 5,3 bilhões) disponíveis para a comprar drones e capacitar a indústria nos próximos dois anos.
Ironicamente, foram seus adversários na curta guerra de junho passado que permitiram a aceleração do processo. O Lucas é visualmente quase idêntico ao Shahed-136, movido por um pequeno motor a hélice, embora suas especificações não sejam conhecidas.
As imagens divulgadas pelo Centcom da entrega dos modelos mostra que eles têm recursos diversos, também: o que aparenta ser um sensor óptico e algo que se assemelha a uma antena de Starlink. Os Shahed-136 e o Gerânio-2, que é a versão mais refinada do iraniano feita na Rússia, usam guiagem inercial corrigida por GPS ou sinais de celular.
O desempenho de um drone semelhante ao Lucas, exibido pela sua fabricante, falava em alcance de 715 km e velocidade de 137 km/h, enquanto o iraniano e o russo atingem alvos a 2.000 km a 185 km/h. Mas os números certamente mudaram.
Segundo um militar ligado ao projeto disse ao site americano The War Zone, a chamada engenharia reversa para criar o Lucas foi feita a partir de um Shahed-136 que caiu intacto ele só não contou onde, se na Ucrânia ou em Israel, alvo de ataques com o modelo em 2024 e 2025.
A chave é a rapidez de fabricação e, como o nome diz, o custo. O mesmo militar disse que o Lucas tem preço semelhante ao do Shahed-136, cerca de US$ 35 mil (R$ 185 mil), embora haja estimativas que colocam o valor do iraniano e de seu primo russo em US$ 20 mil (R$ 105 mil).
É muito menos do que os multimilionários mísseis de cruzeiro ou balísticos um Tomahawk americano pode custar US$ 1,3 milhão (R$ 6,9 milhões). Claro, os lentos drones são mais fáceis de derrubar e menos precisos, mas por isso a quantidade faz a diferença.
Um estudo publicado em fevereiro pelo Centro Internacional de Estudos Estratégicos, um think-tank americano, comparou o custo-benefício dos ataques russos contra a Ucrânia de 2022 a 2024.
O resultado é que os Gerânio-2 entregavam um alvo destruído por US$ 350 mil (R$ 1,8 milhão), contando sua menor eficácia e preço, número de ataques e destruição aferida. O míssil que teve o melhor resultado, o modelo de cruzeiro Kh-22, fazia o mesmo serviço por US$ 1 milhão (R$ 5,3 milhões).
Os números são todos estimados, mas o fosso dá uma noção da lógica econômica por trás da revolução dos drones.
No caso americano, com uma ligeira vantagem: o país fabrica os chips que usará no seu modelo, enquanto iranianos e russos obtêm os mesmos equipamentos por meio de esquemas que driblam as sanções aos países.
A novidade também carrega outra ironia, essa mais sutil: o termo kamikaze (vento divino, em japonês) ganhou tração no imaginário ocidental como sinônimo de suicida ao descrever os pilotos de Tóquio que lançavam seus caças contra navios americanos no desesperado estertor da Segunda Guerra Mundial, algo que sempre foi vilanizado nos EUA.
Agora, uma unidade kamikaze, ainda que obviamente sem pilotos, opera para Washington. Não se sabe onde ela ficará baseada, mas a natureza dessas operações é pulverizar os controladores de drones e seus equipamentos. O Lucas, segundo o Centcom, poderá ser lançado inclusive de navios.



