Da Redação
Um novo acidente provocado por cabos abandonados reacendeu a inquietação de quem circula diariamente pelas ruas de Goiânia. O marido de Cleonice, entregador de jornais há quase duas décadas, sofreu uma queda violenta na madrugada de segunda-feira (1º) após ser surpreendido por um fio telefônico estendido no meio da pista.
Segundo ela, o acidente ocorreu por volta das 4h30, enquanto ele percorria sua rota de motocicleta. O cabo atingiu sua perna e o derrubou imediatamente. “Meu esposo está internado no Hospital de Acidentados. Ele se enroscou nesse fio, perdeu o controle e teve uma lesão grau 6 no joelho”, relatou. O trabalhador passou por cirurgia emergencial e já sabe que terá de enfrentar outro procedimento em breve. A previsão inicial de afastamento é de pelo menos 150 dias. “É revoltante. Ele fica sem renda por culpa de uma irresponsabilidade que ninguém assume”, lamentou Cleonice.
Um problema que se repete
O episódio não surpreende motociclistas e entregadores que atuam na madrugada. Em grupos de conversa, são comuns relatos sobre ruas escuras, fios baixos em cruzamentos e cabos soltos após as chuvas. Para quem depende da moto para trabalhar, cada trajeto pode esconder um perigo invisível.
Goiânia tem acumulado episódios graves desse tipo. Além de quedas e fraturas, a cidade já registrou mortes provocadas por fiações abandonadas. O caso mais chocante ocorreu em setembro, quando Nathaly Rodrigues, de 17 anos, morreu eletrocutada ao pisar em um cabo encoberto pela água da chuva no Centro. A jovem trabalhava e estudava, e percorria diariamente quase 40 quilômetros até chegar em casa.
Reação das autoridades
A tragédia mobilizou órgãos públicos e impulsionou novas medidas. A Câmara Municipal instalou a Comissão Especial de Inquérito (CEI) dos Fios Soltos, que busca identificar responsáveis, mapear trechos críticos e cobrar ações imediatas. Entre as propostas discutidas está a instalação gradual de fiação subterrânea em áreas antigas, como Centro e Campinas — um projeto caro, demorado e que exige etapas progressivas, como destaca o presidente da comissão, vereador Coronel Urzêda (PL).
Enquanto isso, o Ministério Público de Goiás retomou o Programa Cidade Segura em outubro, voltado a remover cabos inutilizados e organizar a fiação irregular nos postes. Em pouco mais de um mês, 648 postes foram regularizados e mais de 19 toneladas de fios foram retiradas em trechos como as Avenidas 24 de Outubro, 85, Bernardo Sayão e Mangalô. A Agência de Regulação Municipal registrou cerca de 200 denúncias somente nesse período.
Desafios ainda longe de terminar
Apesar da força-tarefa, a participação das empresas de telecomunicações é considerada insuficiente. Apenas 26 operadoras — cerca de um quarto das contratadas — colaboraram de forma consistente. Falta de cadastro atualizado, dificuldades operacionais em vias movimentadas, pouca cooperação da Equatorial Energia e entraves na destinação adequada dos resíduos são alguns obstáculos mencionados pela equipe responsável.
Enquanto os debates avançam, o cenário permanece o mesmo para quem atravessa a cidade antes do amanhecer. Fios pendurados continuam surgindo em calçadas e pistas, invisíveis sob a baixa iluminação. O acidente com o entregador de jornais evidencia que o risco não está apenas nos postes lotados de cabos, mas também na ausência de monitoramento constante e na demora para responsabilizar quem deveria prevenir situações como essa.






