RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), deputado estadual Rodrigo Bacellar (União Brasil), foi preso nesta quarta-feira (3) pela Polícia Federal durante a Operação Unha e Carne.
Ele é suspeito de ter repassado informações sigilosas da Operação Zargun, que levou em setembro à prisão do então deputado estadual Thiego Raimundo dos Santos Silva, conhecido como TH Joias (que era do MDB e foi expulso do partido). O presidente da Assembleia teria ligado para o investigado na véspera e dado orientações.
A defesa de Bacellar afirma que ele não atuou para obstruir investigações e negou ter vazado informações a possíveis alvos de operações da Polícia Federal. Os advogados dizem ainda que Bacellar foi ouvido pela PF “esclareceu tudo o que lhe foi perguntado”.
Já a Alerj diz que “não foi comunicada oficialmente sobre a operação ocorrida nesta manhã. Assim que tiver acesso a todas as informações, irá tomar as medidas cabíveis”.
A ação incluiu o cumprimento de um mandado de prisão preventiva (sem prazo), oito mandados de busca e apreensão -incluindo no gabinete de Bacellar na Alerj- e um mandado de intimação para aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão.
A prisão de Bacellar foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), responsável pelo caso a partir do entendimento de conexão com a chamada ADPF das Favelas, que ele herdou do ministro Edson Fachin.
O superintendente da Polícia Federal, Fábio Galvão, chamou Bacellar para a PF na manhã desta quarta, ocasião em que recebeu voz de prisão. A estratégia foi para evitar espetacularização da prisão.
O ex-deputado TH Joias foi preso sob suspeita de realizar negociações para o Comando Vermelho. A Polícia Civil disse haver “provas robustas” de que TH, além de usar o mandato para favorecer a facção, intermediava compra e venda de drogas, fuzis e equipamentos antidrones.
De acordo com a PF, Bacellar teria avisado TH Joias de que a operação ocorreria. TH, por sua vez, apagou dados do seu celular e teria se desfeito de objetos de sua casa.
Entre as conversas registradas na véspera da deflagração da operação, TH Joias chama Bacellar de 01, e este responde com uma figurinha de um homem bebendo cerveja, após ser avisado por TH de que havia comprado um celular novo. Já no dia da operação, Bacellar é avisado em tempo real, por foto, da presença da Polícia Federal, que tentava cumprir o mandado de prisão contra TH.
O local estava revirado e faltavam móveis. Segundo um agente, TH enviou uma filmagem para o presidente da Alerj mostrando objetos que deixaria na casa e chegou a perguntar se poderia deixar um freezer. Nesse momento, Bacellar o teria chamado de “doido” e dito para não se importar com o congelador. Essa filmagem e esse diálogo foram recuperados pela investigação.
A representação da PF afirma que, “diante do cenário probatório apresentado, mostra-se inequívoco o conhecimento prévio e o direcionamento das ações de TH pelo deputado estadual Rodrigo Bacellar, agente anômalo na cadeia hierárquica em que transitam informações sigilosas oriundas dos órgãos estaduais”.
Os investigadores afirmaram ainda que, como presidente da Alerj, Bacellar é “figura central no combate à criminalidade violenta no Estado do Rio de Janeiro”.
A Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República ressaltaram que a necessidade da prisão se impunha para garantir a ordem pública, uma vez que os crimes investigados, entre eles organização criminosa armada com participação de funcionário público e obstrução de investigação, revelam “o grau acentuado de vulneração à ordem pública” e a infiltração de interesses ilícitos em estruturas estatais, caracterizando um cenário de “estado paralelo”.
Segundo a Procuradoria, a influência de Bacellar não se limitava à Assembleia: ele também exerceria ingerência no Poder Executivo estadual, interferindo na nomeação de cargos estratégicos nas polícias Civil e Militar. Esse domínio ampliaria sua capacidade de interferir nas investigações, segundo os investigadores.
Para a PF, o caso representa “o retrato perfeito da espoliação dos espaços públicos de poder pelas facções criminosas no Rio de Janeiro”, evidenciando um “verdadeiro estado paralelo” comandado por “capos da política fluminense”, responsáveis por vazar informações e inviabilizar operações contra grupos como o Comando Vermelho.
Outro ponto destacado pela investigação foi a reação política imediata à deflagração da Operação Zargun. Conforme a PF, houve uma “célere manobra regimental” articulada pelo governador e pela cúpula da Alerj logo após as medidas cautelares.
A manobra permitiu o retorno instantâneo de um deputado titular ao cargo, resultando na exoneração do suplente TH Joias no próprio dia da operação. Para os investigadores, essa articulação constitui “forte indício de que o vazamento de informações pode ter tido como objetivo primário a proteção de agentes políticos aliados à organização criminosa”.
Além disso, a PF aponta que um objetivo subjacente à obstrução seria a “manutenção do vínculo desses agentes políticos com o Comando Vermelho”, facção que representa “milhões de votos no pleito eleitoral que se avizinha”, dada sua influência territorial no estado.
A decisão do STF também alcançou o assessor parlamentar Thárcio Nascimento Salgado, para quem foram aplicadas medidas cautelares diversas da prisão. Thárcio teria fornecido auxílio material para que TH Joias fugisse na véspera de sua captura.
Às 22h27, o parlamentar pediu o endereço pelo novo número de telefone, e o assessor informou apenas o bloco 6 e o apartamento 802.
No dia da operação, às 6h03, TH não foi encontrado em sua residência no condomínio Mansões, na Barra da Tijuca, zona sudoeste do Rio. Foi localizado horas depois no apartamento 802 do Condomínio Majestic.
QUEM É RODRIGO BACELLAR
Cotado a candidato ao governo estadual no pleito de 2026, Bacellar é natural de Campos dos Goytacazes e advogado tributarista. De 2007 a 2009, atuou como assessor da Secretaria-Geral de Planejamento do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e, de 2009 a 2011, presidiu a Fundação Estadual do Norte Fluminense.
Em sua biografia no portal da Alerj, diz que entrou para a política influenciado por seu pai, Marcos Bacellar, eleito vereador por três mandatos e ex-presidente da Câmara Municipal.
Em 2018, Bacellar concorreu pela primeira vez a uma vaga na Alerj, pelo Solidariedade, sendo eleito com 26.135 votos. Atualmente, cumpre seu segundo mandato como presidente da Alerj, tendo sido reeleito de forma unânime pelos demais deputados.
Na primeira sessão da Alerj após a prisão de Bacellar, o deputado Flavio Serafini (PSOL) foi censurado pelo presidente interino, Guilherme Delaroli (PL).
Serafini dizia que a resistência de deputados da base governista ao tema era a segunda surpresa do dia. “A primeira foi a notícia da prisão do presidente Rodrigo Bacellar”, continuou, sendo imediatamente interrompido por Delaroli. “Não fale neste assunto”, afirmou o aliado do presidente.
A sessão foi esvaziada no final e encerrada antes do período do expediente final. Paras a oposição, uma estratégia para evitar que os deputados aliados fossem confrontados sobre o tema.



