BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Senado Federal aprovou, nesta quarta-feira (3), a Licença Ambiental Especial (LAE) com uma brecha para liberar a reconstrução da polêmica rodovia BR-319 em até 90 dias. A estrada é vetor de desmatamento e grilagem e corta o coração da amazônia.

Como revelou a Folha de S.Paulo, a LAE é impulsionada por Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente do Senado Federal, e acelera a análise de impactos sobre a natureza para empreendimentos que sejam classificados como estratégicos pelo governo federal -o que pode beneficiar casos de exploração de petróleo como o da bacia Foz do Amazonas.

Durante a tramitação da proposta no Congresso, ela ganhou um novo dispositivo que concede esse status prioritário automaticamente a “obras de reconstrução e repavimentação de rodovias preexistentes cujos trechos representem conexões estratégicas”, exatamente o caso da BR-319, que conecta Manaus (AM) a Porto Velho (RO).

Foi determinado prazo máximo de três meses para que seja concedida sua licença de instalação, justamente aquela que falta para que essa obra seja realizada atualmente.

A medida ainda restringe o uso da LAC (Licença por Adesão e Compromisso), que permite autorizar obras apenas mediante a promessa do empreendedor de não descumprir regramentos ambientais.

Seu texto foi votado em comissão mista e na Câmara na última terça-feira (2) e referendada pelo Senado já nesta quarta, em votação simbólica em cerca de um minuto de duração -e menos de um mês após a COP30, a conferência sobre mudanças climáticas das Nações Unidas, acontecer em Belém (PA).

A proposta foi aprovada em forma de um projeto de lei de conversão, vai para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ainda pode sofrer vetos.

Na última semana, porém, os parlamentares derrubaram vetos de Lula à lei geral que flexibiliza e simplifica o processo de licenciamento ambiental no Brasil.

O chamado trecho do meio da BR-319 teve sua licença prévia autorizada ainda durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), ato que foi suspenso pela Justiça, justamente pela falta de medidas para evitar a destruição da amazônia.

Em setembro deste ano, Lula afirmou que essa obra seria autorizada em acordo com ambientalistas.

Sua reconstrução é criticada pela ministra Marina Silva, uma vez que as rodovias são grandes vetores de desmatamento a partir das chamadas vias vicinais -caminhos que partem da estrada principal e por onde se dá a exploração ilegal do meio ambiente.

O empreendimento é defendido não só por bolsonaristas, mas também por políticos do Norte de outras siglas.

A BR-319 foi o pano de fundo para que parlamentares proferissem uma série de ataques à Marina Silva em maio deste ano, durante uma sessão no Senado na qual ela decidiu se retirar em razão das ofensas sofridas.

O trecho do meio, que está pendente da licença de instalação, corta o coração da amazônia e atualmente é todo de terra, em péssimas condições de locomoção, especialmente no período chuvoso.

Mesmo nessa situação precária, a região já apresenta uma especulação imobiliária intensa e impulsiona a destruição da floresta nos seus arredores.

A Licença Ambiental Especial é um dispositivo que dá ao Conselho de Governo (instância política que reúne ministros e o Presidente da República) o poder de selecionar quais projetos são considerados estratégicos. Para eles a avaliação dos impactos passa a ter prazo máximo de um ano para acontecer -hoje não existe limite temporal.

Ele foi inserido pelo próprio Alcolumbre na lei geral que flexibiliza e simplifica o processo de licenciamento. Em sua redação original, ignorava os riscos à natureza e tinha apenas uma etapa de análise.

Após tramitação pelo Congresso durante o primeiro semestre e uma intervenção do governo Lula (que o vetou e substituiu por esta medida provisória), ele passou a prever mais de uma fase de avaliação, e também o EIA-Rima, o principal estudo de impactos ambientais que existe na lei brasileira.

Isso foi mantido na redação votada, sob relatoria do deputado federal Zé Vitor (PL-MG), que também exige a consulta formal aos povos indígenas ou comunidades que possam ser afetadas pelos empreendimentos.

Ele acrescentou ao texto o dispositivo a prioridade automática às rodovias estratégicas, com previsão de que a análise da licença de instalação “deve ser concluída em até 90 (noventa) dias após o protocolo dos estudos pelo empreendedor”.

O texto também prevê que os estudos para a licença prévia devem ser entregues em no máximo 90 dias e que podem ser “elaborados com os dados secundários mais recentes disponíveis” em caso de necessidade.

Em nota, o Observatório do Clima, rede que reúne mais de uma centena de organizações socioambientais, criticou a aprovação da LAE.

“Juntamente com a derrubada dos vetos do presidente ao PL da Devastação por esse mesmo Congresso Nacional, na semana passada, a LAE integra o conjunto de medidas que transformam o licenciamento de empreendimentos em exceção no Brasil, contrariam jurisprudência do STF e põem em risco a vida e a saúde dos brasileiros”, disse a entidade.

A medida provisória aprovada também restringe o uso da LAC (Licença por Adesão e Compromisso).

Pela lei geral de licenciamento aprovada no Congresso no primeiro semestre, esse dispositivo poderia ser usado para casos de baixo e médio impacto ambiental.

O governo Lula barrou este trecho e enviou ao Legislativo um novo projeto de lei, para que ele fosse restrito aos casos de menor potencial poluente.

O veto, porém, foi derrubado na última semana, e a previsão anterior passou a valer.

Pela redação da medida provisória aprovada na Câmara, porém, ficam restritos de uso da LAC 11 tipos de projetos.

A proposta também dispensa o licenciamento para novas antenas de radiodifusão que não ampliem o impacto ambiental.

Finalmente, o texto prevê que dragagens em hidrovias naturalmente navegáveis não precisam de análise ambiental, mas as que ocorrerem em vias de acesso, sim.

EMPREENDIMENTOS RESTRITOS AO USO DA LAC PELA MP

– minerários, exceto exploração de areia, cascalho, brita e lavra de diamante por faiscação sem desmonte de talude;

– que demandem supressão de vegetação nativa que dependa de autorização específica, exceto no caso de corte de árvores isoladas;

– que envolvam remoção ou realocação de população;

– localizados em área declarada como contaminada;

– no interior de unidades de conservação, exceto APA (Área de Preservação Permanente);

– localizados em áreas reconhecidas como sítios Ramsar -zonas úmidas e reconhecidas como de importância ecológica internacional;

– em áreas de bens arqueológicos ou culturais;

– localizados terras indígenas, territórios quilombolas e de comunidades tradicionais, exceto se realizadas pela própria comunidade;

– em áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto e inundações bruscas;

– que tiveram ou venham a ter licença de instalação negada por incompatibilidade ambiental da área com o tipo de atividade;

– localizados no mar territorial