SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um supercomputador possibilitou a criação de uma das mais detalhadas simulações cerebrais a partir de dados abertos. O modelo de córtex cerebral (camada mais externa do cérebro) de um camundongo foi realizado pelo Instituto Allen, localizado em Seattle, nos EUA, e conta com quase 10 milhões de neurônios, 26 bilhões de sinapses e 86 regiões interconectadas do cérebro.
O resultado foi divulgado no último dia 17. O alto nível de detalhes foi possível a partir do supercomputador japonês Fugaku, desenvolvido pelo Centro para Ciência Computacional Riken e pela empresa de tecnologia Fujistsu.
A máquina consegue realizar 400 quadrilhões de operações por segundo. Em perspectiva, contar um número por segundo até chegar a 400 quadrilhões levaria 12,7 bilhões de anos. Tamanha capacidade é possível a partir de quase 160 mil nós, pequenas partes do computador que se agrupam em camadas e permitem o gerenciamento de quantidades massivas de dados.
Diego Szczupak, professor do Departamento de Neurobiologia da Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, avalia que o trabalho realizado pelo Instituto Allen é impressionante e que as simulações cerebrais costumam trazer milhares ou dezenas de milhares de sinapses, em vez de bilhões.
A simulação consegue capturar a estrutura e o comportamento das células cerebrais, os ramos que partem dos neurônios, as ativações das sinapses e os sinais elétricos. A longo prazo, o objetivo é construir modelos inteiros, até mesmo de seres humanos.
A ideia é que pesquisadores possam usar o modelo para entender doenças, a exemplo de epilepsia e Parkinson, e como esses problemas podem surgir antes mesmo de os sintomas aparecerem.
Uma simulação com esse nível de detalhe demanda um extenso volume de dados. No caso da simulação realizada pelo Fugaku, os pesquisadores utilizaram bases de dados do próprio Instituto Allen, uma entidade sem fins lucrativos que visa responder grandes questões da biociência. Uma delas mantém informações sobre morfologia e propriedades elétricas dos neurônios.
O cérebro ainda hoje é um mistério. Para compreender a função de cada parte dele, é preciso estudar como as regiões se comunicam com as demais. Szczupak explica que o uso de simulação para entender o cérebro traz como vantagem a possibilidade de estudar a interação entre as áreas do cérebro, mantendo os detalhes das atividades dos neurônios.
Já em uma análise do cérebro de um animal enquanto realiza tarefas não é possível observar muitas regiões ao mesmo tempo. “O melhor que a gente consegue [com análise em animal] ainda é muito limitado hoje em dia comparado com simular todos os neurônios de um cérebro”, diz o professor.
A simulação gerada pelo Fugaku permite a observação de sinapses que ocorrem em um mesmo momento com grande riqueza de detalhes, o que seria inviável em um animal vivo. Com isso, cientistas podem estudar como um sinal que se origina em determinada parte do cérebro se propaga para o resto.
Um vídeo da simulação divulgada pelo Instituto Allen mostra o córtex de um camundongo com resolução de nível subcelular. As cores dos neurônios variam conforme a área do córtex, e eles são marcados por uma luz quando ativos.
Mas Szczupak destaca que não é possível reproduzir a realidade em modelos. Também existem outras limitações em simulações, como a falta de variabilidade de anatomias e de plasticidade do órgão. O último conceito está relacionado às mudanças sofridas por neurônios mesmo quando já foram formados, bem como por outros elementos que compõem o cérebro.



