SÃO PAULO, SP, WASHINGTON, EUA, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou nesta sexta-feira (14) medida para reduzir tarifas sobre a importação de carne bovina, tomate, café e banana, em movimento voltado para controlar a inflação dos alimentos no país após o tarifaço.
Entre outros países exportadores de commodities, as medidas devem beneficiar o Brasil, maior produtor global de café e segundo maior produtor de carne bovina, atrás apenas dos EUA, segundo dados do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA).
O decreto publicado por Trump, no entanto, se aplica apenas à alíquota de 10% das chamadas “tarifas recíprocas” impostas em abril a todos os países. A sobretaxa de 40% sobre o Brasil segue em vigor.
Centenas de alimentos foram listados em documento divulgado pela Casa Branca. As medidas se aplicam retroativamente a partir das 2h01 (horário de Brasília) desta quinta-feira (13). Ou seja, os produtos que entraram no país desde essa data estão isentos.
O decreto modifica o escopo das tarifas com base em segurança nacional, pilar da estratégia de Trump para enfrentar o que ele classifica como “grandes e persistentes déficits comerciais” dos EUA.
A decisão vem após recomendações de autoridades encarregadas de monitorar o estado de emergência nacional declarado por Trump em abril. O governo citou negociações com parceiros comerciais, a demanda doméstica e a capacidade produtiva americana como fatores que motivaram a revisão.
“Determinei que é necessário e apropriado modificar ainda mais o escopo dos produtos sujeitos à tarifa recíproca imposta pela ordem executiva 14257 [medida que aplicou a tarifa global de 10%]”, afirma Trump no decreto.
Ainda nesta sexta, após a divulgação da medida, Trump disse a bordo do Air Force One que novos recuos nas tarifas não serão necessários.
“Acabamos de fazer um pequeno recuo”, afirmou. “Os preços do café estavam um pouco altos; agora ficarão mais baixos em um período muito curto.”
Em 2024, o Brasil exportou US$ 1,96 bilhão em café para os Estados Unidos, sendo o maior fornecedor no período, segundo dados da International Trade Administration, órgão vinculado ao Departamento de Comércio americano.
Desde que as tarifas de 50% entraram em vigor em agosto, no entanto, as vendas de café despencaram, segundo o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil). Em outubro, a retração foi de 54,4% em relação ao ano passado.
Nos EUA, o produto acumula alta de cerca de 20% em relação ao ano passado, segundo dados do CPI (índice oficial da inflação ao consumidor no país).
O Cecafé disse nesta sexta que está em contato com seus pares americanos para analisar a situação e entender o novo cenário. Procurado, o Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio) ainda não se manifestou.
Para a carne bovina, os EUA enfrentam uma inflação de 12% a 18% em relação ao ano passado. Além das tarifas sobre o Brasil, o maior exportador global, uma redução do rebanho local também tem pressionado os preços.
A Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes) afirmou em nota que considera positiva a decisão.
“A medida reforça a confiança no diálogo técnico entre os dois países e reconhece a importância da carne do Brasil, marcada pela qualidade, pela regularidade e pela contribuição para a segurança alimentar mundial”, disse a entidade.
As empresas exportadoras, no entanto, consideraram a redução das tarifas insuficiente.
José Augusto de Castro, presidente-executivo da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), afirma que a redução foi tímida e que poucas tarifas foram reduzidas.
“Desde a reunião entre Lula e Trump se esperava alguma coisa [de significativo]. Nada aconteceu. Esperavam-se medidas melhores que essas. [Não se aplica a] Nenhum produto manufaturado. Só consumo e produtos ligados ao agro. Mudou pouco”, diz Castro.
Para Thiago Oliveira, CEO da Saygo, holding brasileira especializada em comércio exterior, a redução reforça o Brasil como parceiro estratégico dos EUA no fornecimento de alimentos e abre portas para novos acordos.
Já a especialista em contabilidade internacional Fernanda Spanner afirma que a decisão faz parte de uma estratégia de longo prazo dos EUA para reduzir riscos e estabilizar a cadeira de suprimentos.
“O país já vem reduzindo a dependência de alguns mercados, como a China, e tentando abrir mais espaço em outras nações. Vejo como uma intenção de estreitar a relação com os países de América Latina”, diz.
Segundo o governo americano, os acordos na América Latina devem ser concluídos nas próximas duas semanas e abrem os mercados para a produção agrícola e industrial dos EUA.
A Casa Branca indicou que as tarifas gerais de 10% impostas a produtos da Argentina, El Salvador e Guatemala, e de 15% aos originários do Equador, permanecerão sem mudanças, mas que haverá uma redução em um certo número de mercadorias. Os quatro países se comprometeram a não impor impostos sobre serviços digitais de big techs.
O ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) se encontrou com o secretário de Estado americano, Marco Rubio, também nesta quinta e disse esperar uma resposta dos EUA sobre a proposta feita pelo Brasil de pausar as tarifas para depois avançar na negociação para produtos específicos.
O ministro não detalhou o teor da proposta, mas o governo brasileiro quer um acordo provisório que passe pela suspensão das sobretaxas de 40% aplicadas ao país para então negociar detalhes das tarifas por setor (no total, produtos brasileiros são taxados em 50%, em razão de tarifa global de 10% aplicada pelo governo americano).
Ao longo das últimas semanas, negociadores brasileiros mantiveram conversas informais com responsáveis por questões comerciais dos EUA, em que os americanos apontaram as suas prioridades nas negociações: conseguir acesso ao mercado de etanol no Brasil e discutir a regulamentação de big techs, incluindo moderação de conteúdo.
Os americanos afirmaram que a regulação das plataformas digitais está ligada a questões de liberdade de expressão. Já o etanol é uma queixa antiga dos americanos. A reclamação é que o etanol americano, feito de milho, enfrenta uma sobretaxa de 18% para entrar no Brasil, enquanto a barreira nos EUA era de apenas 2,5%.
Já o lado brasileiro aponta que Washington nunca aceitou vincular discussões sobre o etanol a uma liberalização do mercado de açúcar nos EUA, altamente protegido. Na terça (11), Trump disse reduziria “algumas tarifas” sobre o café.






