BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) planeja criticar a mobilização militar americana contra a Venezuela na próxima reunião da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) com a União Europeia. Entretanto, o brasileiro deve se deparar com um encontro esvaziado e com diversos países receosos de fazer declarações provocativas contra Donald Trump.
Líderes latino-americanos e europeus se reúnem neste final de semana na cidade caribenha de Santa Marta, na Colômbia, para a 4ª cúpula UE-Celac. Num primeiro momento, não havia previsão de participação de Lula, mas ele anunciou de última hora que viajará ao país e que a reunião só fará sentido se discutir os navios de guerra dos Estados Unidos posicionados no Caribe. “Não queremos conflito na América do Sul”, disse o petista a um grupo de jornalistas estrangeiros.
No dia seguinte, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que o encontro UE-Celac tem em sua pauta a solidariedade à Venezuela. Já nesta quinta-feira (6), o assessor especial da Presidência Celso Amorim disse que o Brasil precisa “defender a América do Sul”.
Apesar das declarações de Lula, Vieira e Amorim, o atual cenário de fragmentação política da Celac (organização que reúne os 33 países latino-americanos e caribenhos) torna extremamente improvável que o grupo costure, de forma unida, uma posição contundente em relação à campanha de pressão militar americana contra o ditador Nicolás Maduro.
Hoje, a América Latina e o Caribe contam com um grupo de países ideologicamente alinhados com Trump, como a Argentina, além de outros que chegam a apoiar abertamente o emprego de meios militares na região para o combate ao tráfico de drogas –caso de Trinidad e Tobago.
Mesmo governos que compartilham com o Brasil preocupação com as possíveis consequências de uma intervenção dos EUA na Venezuela evitam críticas diretas a Washington, para não entrar no radar de Trump.
A própria cúpula deve ser desfalcada, num esvaziamento que tem sido interpretado como sinal de que governantes latino-americanos e europeus preferem manter distância de uma reunião que pode virar uma plataforma de queixas contra Trump. O republicano impôs sanções contra o anfitrião, o colombiano Gustavo Petro.
O ministério das Relações Exteriores da Colômbia anunciou que são esperados 12 governantes, além de 23 chanceleres e outros chefes de delegação. Como comparação, na cúpula UE-Celac de 2023, quase 50 líderes latino-americanos e europeus marcaram presença em Bruxelas, na Bélgica.
Em outra evidência de distanciamento, há países relevantes da região que nem sequer estarão representados por ministros de Estados.
A Argentina, do ultraliberal Javier Milei, escalou um funcionário do seu ministério de Relações Exteriores para acompanhar as discussões.
Já o Paraguai, cujo presidente Santiago Peña é próximo do chefe da diplomacia dos EUA, Marco Rubio, deve ser representado por seu vice-chanceler.
Opção semelhante foi tomada pelo Equador, outro país fortemente alinhado com Washington, principalmente em temas de segurança pública. O presidente Daniel Noboa determinou que o país seja representado por um funcionário do segundo escalão da chancelaria.
Até mesmo o México, governado pela esquerdista Claudia Sheinbaum e contrário à política intervencionista de Trump na América Latina, rebaixou sua representação na cúpula colombiana ao nível sub-ministerial.
A Celac já enfrentou recentemente dificuldades para debater a concentração de forças militares dos Estados Unidos na região.
No início de setembro, durante uma reunião virtual, os países da organização tentaram negociar um comunicado conjunto que expressava “profunda preocupação com o recente destacamento militar extrarregional” na América Latina e no Caribe.
O texto também afirmava que a América Latina é uma zona de paz, regida por princípios como a solução pacífica de controvérsias e a proibição de ameaças de uso da força.
Não havia na redação debatida qualquer referência direta a Trump ou aos EUA, mas mesmo assim países como Argentina, Paraguai, El Salvador e Peru, entre outros, optaram por não assiná-la.
Nesta quinta (6), a secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, a embaixadora Gisela Padovan, afirmou a jornalistas que a cúpula UE-Celac está prevista desde muito antes da atual crise entre Washington e Caracas, mas que é natural que temas que preocupem a região entrem na agenda.
“Existe uma comunidade de visões em relação a esse tema. A Celac é uma zona de paz, e isso reflete exatamente os princípios mais antigos, caros e constitucionais da política externa brasileira”, disse Padovan.




