SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O câncer já é a primeira causa de morte em 670 municípios brasileiros, segundo dados do Observatório de Oncologia apresentados no Fórum Big Data em Oncologia, no Rio de Janeiro, com base em registros do Ministério da Saúde, de 2023.

Quase oito em cada dez municípios onde o câncer lidera as mortes (76%) estão nas regiões Sul e Sudeste. O Sul responde por 46% dos municípios nesse cenário e o Sudeste, por 30%, indicando maior pressão da doença em áreas mais desenvolvidas e envelhecidas do país, de acordo com o mesmo levantamento.

Embora, no consolidado nacional, as doenças cardiovasculares ainda sejam a principal causa de óbito, o câncer vem ocupando esse posto em um número crescente de cidades. Em 2015, eram 516 municípios nessa condição –um aumento de 30% em oito anos, ou 17 novas cidades por ano.

A médica sanitarista Catherine Moura, líder do TJCC (Movimento Todos Juntos Contra o Câncer), afirma que esse cenário faz acender um alerta sobre a necessidade em fortalecer a política nacional de oncologia. Com foco em investimento contínuo em prevenção, diagnóstico precoce, ampliação do acesso ao tratamento e redução das desigualdades regionais.

“O avanço da doença como principal causa de morte em tantas cidades mostra que precisamos olhar para o câncer como um problema de saúde pública prioritário —que exige investimento contínuo em prevenção, informação, rastreamento e políticas integradas que garantam atendimento de qualidade para todos os pacientes, em todas as regiões do Brasil.”

Desde 1998, as mortes por câncer no Brasil cresceram 120%, ritmo mais acelerado do que o observado para doenças cardíacas no mesmo período.

Segundo Maria Paula Curado, epidemiologista do A.C.Camargo Cancer Center, o avanço se explica pelo envelhecimento da população, pelo maior acesso ao diagnóstico e pelo fato de que muitos tumores ainda chegam ao sistema em estágio avançado. “Essa transição não ocorre de forma homogênea. É preciso olhar para as diferenças regionais e acelerar o diagnóstico e o tratamento onde há mais vulnerabilidade”.

No Fórum, também foi atualizada uma análise sobre os custos do câncer no SUS, originalmente realizada em 2016. O câncer de pulmão teve o maior aumento de despesas em relação ao levantamento anterior, enquanto alguns tipos de câncer de mama apresentaram redução de custos, atribuída ao avanço das terapias e a protocolos mais eficientes.

Curado ressalta que enfrentar a tendência exige mais do que expandir exames e tratamento. Para ela, o país precisa ampliar unidades de acesso rápido em regiões com menor infraestrutura e investir em letramento em saúde. “Campanhas e prevenção são essenciais, mas educar a população sobre o que é saúde, e não apenas sobre doença, é estratégico para reduzir casos no futuro”, diz.

Nos municípios onde o câncer já lidera as mortes, foram registradas 16.222 mortes em 2023, o equivalente a 6% de todos os óbitos por tumores no país. Homens representam 56% das mortes e 77% dos óbitos ocorrem em pessoas com 60 anos ou mais. O câncer de pulmão segue como o mais letal, seguido por mama e próstata no cenário nacional e por mama e cólon nos municípios onde a doença já superou as cardiopatias.

O Brasil teve estimativa de 625 mil novos casos de câncer em 2022, e o Observatório já publicou mais de 60 estudos desde 2015, incluindo projeções que apontam que o câncer pode se tornar a principal causa de morte no país até 2029. Nas cidades onde essa mudança já ocorreu, a transição acelerada indica tanto avanços no enfrentamento das doenças cardiovasculares quanto o desafio crescente de controlar o câncer.