SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Paul Biya, o chefe de Estado mais velho do mundo, tomou posse com 92 anos para seu oitavo mandato no Camarões nesta quinta-feira (6). Sua reeleição contestada desencadeou protestos que foram violentamente reprimidos e deixaram pelo menos 48 mortos, segundo fontes da ONU.

“Não pouparei esforços para continuar a ser digno dessa confiança”, disse o ditador durante a cerimônia realizada no Parlamento nacional, que contou com a presença de figuras políticas locais, mas sem a participação de líderes estrangeiros.

Biya, que está no poder desde 1982, foi declarado vencedor da eleição com larga margem em 27 de outubro. Segundo os resultados oficiais publicados pelo Conselho Constitucional (controlado pelo líder), ele recebeu 53,66% dos votos, contra 35,19% do líder da oposição Issa Tchiroma Bakary, ex-porta-voz do governo que havia renunciado ao cargo de ministro em junho.

Tchiroma declarou-se vencedor logo após as eleições e prometeu resistir até a “vitória final”. Protestos eclodiram em várias regiões do país à medida que os resultados preliminares indicavam que Biya conquistaria um oitavo mandato.

O ditador é o segundo chefe de Estado a liderar o Camarões desde sua independência da França em 1960. Ele substituiu seu aliado Ahmadou Ahijo e sofreu uma tentativa de golpe em 1984 que o fez aumentar a repressão contra a oposição, consolidando um regime autoritário que permanece até hoje.

O regime não divulgou um número oficial de mortos na atual onda de protestos.

Dois funcionários das Nações Unidas afirmaram à Reuters que as forças de segurança mataram 48 civis ao reprimir as manifestações contra a reeleição. A maioria das vítimas foi atingida por tiros, embora várias tenham morrido em decorrência de espancamentos com cassetetes e bastões, segundo a ONU.

Quase metade das mortes registradas pelas Nações Unidas ocorreu na região litorânea de Camarões, que inclui o porto de Douala, onde os protestos da semana passada foram mais intensos.

Três gendarmes, membros da força policial que remonta ao período colonial, também morreram em Douala, de acordo com os dados da ONU. Segundo o governador da região, mais de 200 pessoas foram presas em conexão com os protestos.

Houve ainda dez mortes registradas na região Norte, cuja capital é Garoua, cidade natal de Tchiroma.

O grupo Stand up for Cameroon afirmou que manifestantes presos estavam sendo mantidos em condições desumanas. “Os depoimentos dos advogados descrevem rostos inchados, hematomas e tratamento humilhante infligido a cidadãos que buscavam exercer seus direitos constitucionais”, afirmou a organização em comunicado publicado em 29 de outubro.

Um vídeo que circula nas redes sociais mostra forças de segurança carregando um corpo inerte para a traseira de um caminhão militar. Em outro vídeo, manifestantes gritam: “Devolvam o corpo!”. A Reuters não pôde verificar a autenticidade das imagens.

Os resultados eleitorais são alvo de uma guerra de versões diante da opacidade dos órgãos camaroneses. Analistas esperavam que o controle de Biya sobre as instituições estatais e uma oposição fragmentada lhe dessem vantagem na eleição, apesar do crescente descontentamento público com a estagnação econômica e a uma grave crise de segurança.

Uma semana após afirmar que ganhou o pleito, Tchiroma publicou em suas redes sociais as atas que, segundo ele, comprovam sua maioria. O político diz ter os documentos de 18 dos 58 departamentos do país, o que representaria quase 80% do eleitorado, e afirma ter ganhado em todas essas regiões. No entanto, observadores dizem que algumas das cifras mostram taxas de participação maiores do que o número de eleitores registrados nas regiões em questão.

O Conselho Constitucional, por sua vez, tampouco é visto como uma fonte neutra, embora seja o responsável por proclamar os resultados. O órgão, cuja criação estava prevista na Constituição de 1996 e é a instância máxima de interpretação de leis e de regulação eleitoral do país, foi criado apenas em 2018 e tem todos os seus 11 membros nomeados por Biya.

Outros líderes da oposição também apontam fraude generalizada, mas a decisão do conselho é definitiva e não está sujeita a recurso.