SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Mesmo sem embasamento estatístico, a gestão Tarcisio de Freitas (Republicanos) tem usado o Provão Paulista para avaliar as escolas de São Paulo e até mesmo penalizar diretores, afastando-os dos cargos sob o argumento de não terem melhorado o resultado das unidades em que trabalham.

É o que aponta um estudo feito pela Repu (Rede Escola Pública e Universidade), que reúne pesquisadores de diversas universidades. Eles alertam que a política de responsabilização dos educadores com base em indicadores inválidos vai na contramão do objetivo desejado e prejudica o processo de aprendizagem.

Em nota, a Seduc (Secretaria Estadual de Educação) disse que segue “referências consistentes e tecnicamente validadas para o acompanhamento do desempenho do estudante” e afirmou que nenhum profissional é afastado apenas pela análise dos resultados de avaliações externas.

O Provão Paulista foi criado em 2023 para ser um vestibular exclusivo para alunos da rede pública ingressarem em universidades estaduais paulistas. Ele substituiu o Saresp (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), que existia desde 1996 e servia para analisar anualmente o desempenho das escolas estaduais, permitindo avaliar se o rendimento delas tinha melhorado ou piorado.

A prova do Saresp tinha essa função porque era elaborada com a metodologia da TRI (Teoria de Resposta ao Item), a mesma usada no Enem e no Saeb, avaliações federais. Esse modelo estatístico mede não apenas a quantidade de acertos, mas a coerência do padrão de respostas de cada estudante. Por isso, consegue medir o nível de proficiência em que o aluno está e permite a comparabilidade de provas de anos diferentes.

Já o Provão Paulista é elaborado com a TCT (Teoria Clássica dos Testes), que não permite comparar os resultados de provas aplicadas em anos diferentes nem estabelecer escalas de proficiência. Esse é o mesmo método usado por grandes vestibulares, como a Fuvest.

Ou seja, o Provão Paulista é feito para avaliar individualmente o aluno e, assim, selecionar os que têm maior desempenho para uma vaga nas universidades. Já o Saresp trazia um diagnóstico do sistema de ensino estadual.

Apesar de as avaliações terem funções diferentes, o estudo da Repu mostra que o governo continuou usando o Provão Paulista para avaliar o rendimento das escolas e, inclusive, puniu 225 diretores de unidades que não apresentaram aumento nas notas.

Para isso, a secretaria diz fazer um processo de “equalização” das notas do Provão para que sejam comparáveis com as de anos anteriores do Saresp. Esse cálculo considera apenas o desempenho dos alunos em matemática e português, as únicas disciplinas que eram cobradas na avaliação anterior, e desconsidera o restante.

Segundo os pesquisadores, porém, essa equalização desconsidera um alerta feito pela própria equipe técnica da Fundação Vunesp, responsável pela elaboração das duas provas. Eles informaram à Seduc sobre a impossibilidade de estabelecer comparabilidade entre as avaliações.

“O governo adotou uma política agressiva de medir e responsabilizar os professores pelo resultado dos alunos, mas a avaliação utilizada não tem rigor estatístico. É muito injusto que os profissionais sejam cobrados, e até mesmo punidos, por um modelo de avaliação inadequado”, diz Leonardo Crochik, professor do IFSP (Instituto Federal de São Paulo) e um dos responsáveis pelo estudo.

O secretário de Educação, Renato Feder, estabeleceu metas de desempenho para serem alcançadas pelas escolas. Assim, as unidades que não alcançarem metade da chamada “meta ouro”, ou seja, que não tiverem um aumento de ao menos 0,2 ponto de 2023 para 2024, teriam o rendimento considerado como “insatisfatório”.

Conforme mostrou a Folha de S.Paulo, Feder já chegou a dizer que diretores de escola e dirigentes regionais perderão os cargos por não atingirem as metas. “É muito simples, eu tenho 91 dirigentes regionais e eles têm uma meta mínima: subir 0,2 a cada ano. Se não subir, é tchau. Se ele subir, 0,1 ou empatar, ele tá demitido”, disse o secretário.

Segundo os pesquisadores, dados da própria secretaria mostram que 69% das escolas estaduais com turmas de ensino médio tiveram avaliação considerada insatisfatória.

Em toda a rede estadual (incluindo as unidades que ofertam os anos iniciais e finais do ensino fundamental), 50,3% tiveram o desempenho considerado insatisfatório. Ou seja, das 4.988 escolas paulistas, 2.509 não atingiram a meta.

“Ao classificar mais da metade das escolas como tendo um resultado insatisfatório, a secretaria cria um ambiente de tensão, ainda mais por usar essa avaliação como uma possibilidade de punição”, diz Crochik. Para ele, essa política de penalização leva os professores a concentrarem os esforços educacionais para “treinar os alunos” para provas em vez de garantir o aprendizado.

Em nota, a gestão Tarcísio declarou entender que o Provão Paulista e o Saresp têm “naturezas e objetivos distintos”, mas disse que a Fundação Vunesp aplica procedimentos de equalização pós-prova para fins de acompanhamento pedagógico.

“[Essa] técnica é reconhecida na área de avaliação educacional, que assegura comparabilidade dos resultados de língua portuguesa e matemática da 3ª série do ensino médio entre as últimas duas edições do exame. Esse processo garante à Seduc referências consistentes e tecnicamente validadas para o acompanhamento do desempenho do estudante.”

A pasta também afirmou que nenhum dos 225 diretores foi afastado com base “exclusivamente em avaliações externas” e informou analisar uma série de critérios, como: frequência de alunos e professores, participação em formações, presença e acompanhamento pedagógico nas unidades, resultados do Saresp/Provão Paulista e indicadores de ajuste de desigualdade, que consideram o contexto e a realidade de cada escola.

“O foco da pasta é valorizar o trabalho das escolas, ampliar oportunidades para os estudantes e utilizar os resultados das avaliações como ferramentas pedagógicas.”