SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Negros têm 4,5 vezes a chances de brancos de serem mortos pela polícia no Rio de Janeiro, estado da operação mais letal da história do Brasil. É o que diz o relatório Pele Alvo, da Rede de Observatórios da Segurança, que analisa a letalidade policial sob a perspectiva de raça. Embora a população negra no território fluminense represente 57,8% do total, a parcela de mortos por intervenção policial sobe para 86,1%.
Os dados da edição mais recente mostram que foram 703 mortos no RJ em 2024, sendo 546 negros. A conta considera dados em nove estados, que somaram 4.068 mortos no ano passado, sendo que 3.066 eram pessoas negras.
A maioria dos mortos (57,1%) está na faixa etária de jovens, com idades de 18 a 29 anos. Os dados da pesquisa foram coletados por meio de pedidos de Lei de Acesso à Informação feitos às secretarias de segurança estaduais ou órgãos correlatos. Do total de mortos de 2019 a 2024, 512 não tiveram a cor informada, com 200 desses casos só na Bahia.
A Bahia é o estado com a maior distância na taxa de mortos entre as populações de negros e de brancos no estado. Foram 11,5 negros mortos por 100 mil habitantes para 2 brancos por 100 mil habitantes em 2024. Isso significa que o risco de uma pessoa negra ser morta pela polícia, segundo o estudo, é 5,7 vezes o de uma pessoa branca.
Esse é o cálculo usado para verificar que o risco para um negro, no Rio de Janeiro, é 4,5 vezes o de um branco. No RJ, foram 5,9 negros mortos por 100 mil habitantes e 1,3 branco. Para efeito de comparação, esse risco é de 3,5 na média nacional, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Em São Paulo, com 812 óbitos, foi registrado o maior crescimento na comparação com 2023, de 59,2%. Do total de vítimas no ano passado, 511 eram pessoas negras cerca de 62,9% do total de mortos.
No Maranhão, que registrou aumento nas mortes, com 76 óbitos em 2024 ante 62 em 2023, a pesquisa aponta um apagamento das informações sobre raça ou cor, que caracterizaria mais uma etapa de racismo institucional, já que 56 das 76 mortes do ano passado não tinham essa descrição. “Sem dados raciais, não há estatística; sem estatística, nega-se o problema; sem problema, não há cobrança por justiça. É assim que opera o racismo de Estado.”
De acordo com a Rede de Observatórios de Segurança, as mortes por intervenção policial no período analisado podem ser afetadas por conjunturas políticas e mudanças nas dinâmicas de segurança, seja a expansão de grupos criminosos, seja por mudanças no uso de tecnologia (câmeras corporais, inteligência artificial e drones).
Apesar da redução de 4,4% na soma dos números absolutos de mortes dos nove estados analisados, a Bahia que registrou redução na comparação com 2023 teve um aumento de 139,%, seguida pelo Ceará, com alta de 39%. As duas maiores quedas proporcionais foram registradas no Rio de Janeiro (-61,2%) e no Amazonas (-51,1%).
Com a capital, Belém, sediando a COP30, a conferência do clima da ONU, o Pará registrou alta de 12,6% nas mortes por intervenção policial, com 597 óbitos em 2024, ante 530 em 2023. Do total, 87,4% das mortes foram de pessoas negras. O estado tem a segunda taxa mais alta de mortes de negros pela polícia por 100 mil habitantes, com 8,1 vítimas.
A pesquisa aponta que os investimentos para a COP30 não enfrentam tarefas como reduzir a violência e promover a proteção de direitos humanos no território paraense. “Ao passo em que se projeta internacionalmente como vitrine de sustentabilidade, o estado mantém internamente uma cruzada contra as populações das periferias”, diz o documento, que cita a predominância de jovens (415 dos 597 mortos), sendo que 272 deles não haviam terminado o ensino fundamental, como evidência do impacto de violência e vulnerabilidade socioeconômica sobre este contingente.
Entre as recomendações do estudo para lidar com a sobremortalidade de pessoas negras nos estados estão o uso de câmeras corporais em todas as unidades policiais e em todas as operações, o preenchimento obrigatório, com sanções para descumprimento, do campo de raça ou cor das vítimas, e a revisão da formação e do treinamento de policiais.
O relatório defende a criação de um programa nacional de atenção à saúde mental do policial, com acompanhamento contínuo dos agentes. Segundo o documento, também é necessário vincular repasses de recursos ao desenvolvimento e ao cumprimento de metas para a redução da letalidade das polícias.




