BRASÍLIA, D F(FOLHAPRESS) – A presidente do STM (Superior Tribunal Militar), Maria Elizabeth Rocha, disse nesta terça-feira (4) que conhece bem a história da ditadura militar (1964-1985) e que não aceita o “tom misógino” usado por um de seus colegas de tribunal na última semana.

O discurso foi direcionado para o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, tenente-brigadeiro da Aeronáutica. Na última quinta (30), ele fez críticas públicas a Elizabeth após ela pedir desculpas a vítimas da ditadura.

Em um dos trechos de seu discurso, Amaral insinuou que a ministra deveria “estudar um pouco mais da história do tribunal para opinar sobre a situação do período histórico”.

Em resposta na abertura da sessão de julgamentos do STM nesta terça, Elizabeth disse que não aceitaria o desrespeito.

“Por certo, a divergência de ideias é legítima. O que não é legítimo é o tom misógino, travestido de conselho paternalista sobre ‘estudar um pouco mais’ a história de instituição, adotado pelo interlocutor”, disse.

“Uma instituição que integro há quase duas décadas e bem conheço. Essa agressão desrespeitosa não atinge apenas esta magistrada; atinge a magistratura feminina como um todo, a quem devo respeito e proteção”, completou.

A presidente do STM disse que conhece bem a história da ditadura militar e da corte. “Uma memória bem catalogada, onde não há dúvidas sobre seus contornos”, disse.

Elizabeth esclareceu que o pedido de perdão foi feito em primeira pessoa, na condição de presidente do Superior Tribunal Militar, e não em nome de todos os ministros e juízes que integram a Justiça Militar da União.

Ela ainda afirmou que “jamais teria o que dizer” em nome de Amaral. “A tentativa de ampliar o alcance das minhas palavras demonstra pretexto para ataque pessoal”, disse.

A ministra concluiu seu discurso dizendo que o fato de ser a primeira mulher a presidir o Superior Tribunal Militar em 217 anos de história revela o “marco de ruptura em uma das instituições historicamente dominadas por homens, com estruturas hierárquicas permeadas por valores patriarcais”.

O discurso desaguou em bate-boca entre os ministros. Amaral reafirmou discordância com a ministra e disse que não deu delegação a ela para falar em seu nome.

Amaral reclamou de ter sido chamado de misógino e disse que, como militar, é sempre “ético e transparente” em suas opiniões. “A senhora está confundindo, dizendo que é misógino. Mas eu não vou entrar nessa declaração porque a senhora pode achar o que quiser, eu realmente não ligo muito. Só estou dando uma correção ao tema que foi falado”, disse o ministro.

Ele ainda afirmou que, na gestão de Joseli Parente na presidência do tribunal, discordou de manifestações do colega e conversou com ele, em reservado, sobre o assunto. “E ele é homem, eu acho”, completou.

A presidente da corte fez um discurso de dois minutos no evento ecumênico do último sábado (25), na Catedral da Sé, em São Paulo, em memória do jornalista Vladimir Herzog —assassinado há 50 anos pela ditadura.

“Estou presente neste ato ecumênico de 2025 para, na qualidade de presidente da Justiça Militar da União, pedir perdão a todos que tombaram e sofreram lutando pela liberdade no Brasil”, disse Elizabeth no início de seu discurso.

Toda a plateia que acompanhava o ato se levantou para aplaudi-la. A transmissão do evento cortou a imagem de Elizabeth e mostrou, na plateia, o ex-ministro petista José Dirceu endossar o discurso.

A ministra seguiu seu discurso pedindo perdão pelos “erros e omissões judiciais cometidas durante a ditadura” e citou vítimas de assassinato pela ditadura, como Herzog e Rubens Paiva, outros torturados pelo regime, como Dirceu, Miriam Leitão e José Genoino, entre outros.