SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A 1X, empresa americana de tecnologia, lançou na semana passada seu robô doméstico Neo, que funciona com inteligência artificial e consegue organizar objetos na casa, usar máquinas de lavar louças e roupas, dar dicas de receitas culinárias e até jogar videogame com seus compradores.
A pré-venda americana já está disponível, com as opções de uma assinatura mensal de US$ 499 (R$ 2.670) ou de uma compra única de US$ 20 mil (R$ 107 mil). Para reservar o produto, é preciso pagar uma taxa de US$ 200 (R$ 1.070), que deverá ser reembolsada com o início das vendas gerais, segundo a empresa.
O início das entregas nos Estados Unidos está previsto para 2026. Se concretizadas, as vendas colocariam a 1X na frente da corrida mundial de criar um robô humanoide viável para produção em massa com fins domésticos. No mês passado, o modelo da Figure AI foi eleito uma das melhores invenções do ano, mas ainda não foi oficialmente lançado ao público. Ambas enfrentam concorrência da Optimus, de Elon Musk, e da chinesa Unitree, entre outras.
Um dos problemas apontados por especialistas para o Neo é o fato de que ele ainda não é totalmente autônomo, e inicialmente precisará de monitoramento remoto externo para funcionar. A ideia da 1X é que, à medida que o robô aprende com a convivência humana, o controle não será mais necessário.
“Privacidade é o principal ponto de atenção nessa área”, afirma o engenheiro de automação Alexander Silva Barbosa. “Mesmo quando ele for totalmente autônomo, o robô tem sensores que coletam imagens e áudio o tempo inteiro, e não consegue processar tudo localmente, tem que levar para um servidor externo, o que traz um risco de vazamento de dados e até de invasão.”
O engenheiro cita o caso dos robôs aspiradores, que já foram hackeados e tiveram alguns escândalos relacionados ao acesso a imagens pessoais.
Outro problema envolve possíveis falhas que o robô pode cometer, especialmente em relação à inteligência artificial. O Neo utiliza a 1X World Model, baseado em aprendizagem por reforço, ou seja, que aprende sendo corrigido, e que promete “prever” os resultados de suas ações antes que elas aconteçam.
“Se o robô humanoide levantar mais peso do que ele suporta, pode ter algum mal funcionamento e soltar uma peça, por exemplo. Ou simplesmente pegar um objeto afiado, pontudo ou quente, que requer uma destreza que não vimos nos vídeos de divulgação. A empresa oferece como se fosse um produto final, mas na realidade é um protótipo avançado”, diz Artur D’Angelo Chagas, mestre em computação aplicada na UPF (Universidade de Passo Fundo).
Para os especialistas, a pressa para a pré-venda antes do esclarecimento destes pontos pode ser um risco para os consumidores. Ao mesmo tempo, se não for a 1X, será outra empresa a lançar, dizem.
“É um caminho sem volta que vai acontecer muito rápido. Os primeiros robôs nem eram bípedes, havia a dificuldade de fazer com que eles mantivessem o equilíbrio. Hoje a gente tem tecnologia muito avançada, robôs humanos que já são super estáveis”, afirma o professor Roberto Rabello, que leciona o mestrado em ciência da computação na UPF.
Algumas estimativas sugerem que robôs humanoides estarão acessíveis para o público geral inclusive, com preço inferior nos próximos cinco a dez anos. Também dizem que, após a era da inteligência artificial, a sociedade entrará na era da robótica, com grandes avanços de 2028 a 2035.
O Brasil já tem projetos sobre o tema. Chagas, sob orientação de Rabello, criou alguns protótipos de robôs humanoides voltados para o cuidado de idosos, chamados de Sarah e Lisa. Suas principais dificuldades são o preço dos equipamentos para construí-los.
O Neo, em suas propagandas, aparece diversas vezes ao lado de idosos, como uma possível ajuda em tarefas simples. “Um robô humanoide funcional seria muito bom para aqueles com problemas nas costas, o robô consegue abaixar e pegar objetos que caíram no chão, alcançar o controle remoto, buscar remédios, tem uma gama de possibilidades”, explica Chagas.
Para Geraldo Bezerra da Silva Junior, membro da Sociedade Brasileira de Nefrologia, já existem diversas tecnologias aplicadas para o cuidado de idosos e a área da saúde como um todo, mas os robôs estão mais presentes nas cirurgias. “Se os humanoides conseguirem nos auxiliar no tratamento ou dar orientações de saúde aos pacientes, deixaria tudo mais fácil”, comenta.
Outro pesquisador do mercado brasileiro de robótica é o engenheiro eletricista Alexandre da Silva Simões, que trabalhou no projeto do primeiro torso de robô humanoide brasileiro, em 2009. Ele acredita que o Brasil ainda está para trás no assunto, e que o risco é virarmos novamente uma “colônia” das gigantes de tecnologia de outros países, como os EUA.
“Os robôs seriam uma extensão física da internet e das redes sociais dentro das nossas casas. Isso é ainda mais complicado em termos estratégicos para um país. Imagina, por exemplo, uma potência estrangeira ter um robô controlado por ela em cada casa. É algo muito complexo”, diz.




