SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após assumirem e elevarem o gasto militar com a Ucrânia com a volta de Donald Trump ao poder em janeiro, os membros europeus da aliança Otan demonstram dificuldade em manter o apoio a Kiev. Os Estados Unidos, por sua vez, não desembolsaram um centavo novo neste ano.

A ajuda europeia despencou depois firmarem um acordo com Trump no qual repassariam armas compradas dos americanos ao país invadido pela Rússia, aliviando a carga até então majoritária de Washington.

Segundo dados da alemão Instituto Kiel, desde que o republicano assinou em 14 de julho com a Otan o programa Lista de Requisitos Priorizados para a Ucrânia (Purl, na sigla inglesa), o envio de ajuda militar caiu 43% na média mensal ante o registrado de janeiro a junho deste ano.

Se não fosse um envio anunciado pelo Canadá, 1 dos 32 membros da Otan e 1 dos 8 países que aderiram ao Purl, a queda seria de 57% entre os membros europeus da Otan, diz a instituição. Em julho e agosto, esse grupo todo enviou EUR 1,9 bilhão (R$ 11,8 bilhões no câmbio desta terça-feira, 4).

A queda é um fenômeno preocupante para Kiev, segundo o diretor de pesquisa do instituto, Christoph Trebesch. Em comunicado, ele lembra que o Purl é o único meio de envio rápido de armas que só os americanos têm em estoque, dado que compras como a anunciada de até 150 caças Gripen da Suécia são processos de anos.

O esquema armado por Trump é uma forma de cumprir sua promessa de reduzir o gasto americano com a guerra e transferi-lo para os europeus, de quem já arrancou o comprometimento em ampliar a meta de gasto militar de 2% para 5% do PIB (Produto Interno Bruto) em dez anos, algo bastante incerto na prática.

Devido à ajuda dada no governo de Joe Biden, o maior doador militar de Volodimir Zelenski são os EUA, com EUR 64,6 bilhões (R$ 398,7 bilhões) até 31 de agosto. Mas o fato é que nenhum centavo foi aprovado neste ano, e os únicos pagamentos foram residuais de compromissos anteriores.

O segundo maior apoiador militar dos ucranianos é a Alemanha, com EUR 17, bilhões (R$ 109,6 bilhões). Nesta terça, o jornal econômico alemão Handelsblatt disse que haverá um complemento de EUR 3 bilhões no orçamento de 2026 do país para fornecer baterias antiaéreas Patriot.

Em porcentagem do PIB, sem surpresa os alarmados países nórdicos e bálticos, na linha de frente de um eventual conflito com Moscou, são os mais generosos em seu apoio. Contando aí ajuda militar e civil, a Dinamarca lidera com 3,4% de seu PIB dedicado a Kiev, contando aí 0,5% de repasse via UE (União Europeia).

O fracasso até aqui do Purl sugere também falta de fôlego financeiro dos europeus, que assumiram o papel dos EUA no primeiro semestre e até elevaram a média do gasto militar mensal, de US$ 3,5 bilhões (R$ 21,7 bilhões) de 2022 a 2024, para quase US$ 4 bilhões (R$ 24,8 bilhões).

Esse aumento teve caráter político de demonstrar a Trump comprometimento com a ideia de defesa continental, sacramentada na cúpula da Otan de julho, mas parece ter limites, o que ainda será testado e desafia a retórica de Bruxelas, Berlim, Paris e Londres.

O apoio financeiro e humanitário, por sua vez, segue constante, muito graças aos fundos da UE. Ao todo, contando isso e o apoio militar, países europeus já deram EUR 177 bilhões (R$ 1,1 trilhão), ante EUR 114,6 bilhões (R$ 709,6 bilhões) dos EUA -quase duas vezes o PIB estimado da Ucrânia em 2024.

POLÔNIA DOOU MAIS TANQUES

O “think-tank” também faz medições pontuais de equipamento doado. Usando dados abertos, aferiu que a Polônia é a maior fornecedora de tanques ao vizinho, com 354 unidades, a maioria do modelo T-72 soviético, boa parte deles já destruída segundo a base holandesa Oryx.

Washington é o maior fornecedor de sistemas antiaéreos, 18, 3 dois quais os vitais Patriot. A Alemanha vem a seguir, com 17, mas 5 delas Patriot. Segundo o Oryx, já foram destruídas uma bateria de cada fornecedor.

A Ucrânia quer mísseis de maior alcance para atacar alvos na Rússia, hoje só atingidos por drones menos potentes e preciso. Trump ensaiou fornecer os modelos de cruzeiro Tomahawk, só para ouvir Vladimir Putin fazer ameaças nucleares aludindo a uma escalada, e desistiu.

Nesta terça, Zelenski voltou a dizer que os EUA “precisam ter a cabeça aberta” à ideia. Reino Unido e França fornecem modelos menos capazes, mas a disponibilidade é baixa, e a Berlim se recusa a entregar os mísseis Taurus, mais poderosos, para não melindrar Putin.

Ao mesmo tempo, o ucraniano tem fechado acordo com fabricantes europeus para tentar revitalizar sua própria indústria. Anunciou na segunda (3) que irá começar a fabricar o míssil local Flamingo em massa até o fim do ano, o que é visto como duvidoso por especialistas.