SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Entre 2022 e julho deste ano, 5,5 milhões de trabalhadores migraram diretamente do regime formal de emprego (CLT) para, em seguida, se tornarem pessoas jurídicas.
O MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) vê indícios de fraude nesse movimento e acredita que grande parte dos trabalhadores pode ter sido obrigada a se tornar PJ pelos empregadores a fim de recolher menos tributos.
O MTE sabe que são os mesmos trabalhadores que fizeram a transição de regime por meio do acompanhamento de seus CPFs -desde a saída dos registros formais da CLT até o ingresso no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas.
Do total, 4,4 milhões (80%), converteram-se em MEIs (Microempreendedores Individuais). Com limite de faturamento anual de R$ 81 mil, os MEIs, diz o ministério, teriam menos poder de barganha junto a empresários para recusar a mudança de regime.
Pesquisa Datafolha em junho, no entanto, mostrou que 59% dos brasileiros declara preferência pelo trabalho por conta própria, ante 39% que veem mais vantagens em serem contratados por uma empresa. Essa tendência é ainda mais pronunciada entre os jovens (68% em favor da autonomia).
Criado em 2008 para facilitar a formalização de autônomos, informais e pequenos empreendedores, o programa do MEI permite que trabalhadores recolham menos impostos e contribuições previdenciárias do que se estiverem sob o regime CLT.
Para os empregadores, o MEI passa a ser um prestador de serviço, desobrigando as empresas de uma série de pagamentos. O custo de contratação formal no Brasil chega a quase 70% sobre o salário do empregado, segundo a Escola de Administração de São Paulo da FGV (Eaesp-FGV), fato que estimularia empresários a convencer empregados a virarem PJs.
O resultado é que enquanto um trabalhador CLT recolhe mensalmente cerca de R$ 400 para o INSS, o MEI paga apenas R$ 70. Somente no caso dos 5,5 milhões de trabalhadores CLT que viraram PJs (MEI ou Simples), a perda de arrecadação calculada pelo Ministério do Trabalho ultrapassa R$ 70 bilhões.
Esses dados foram apresentados há alguns dias ao ministro Gilmar Mendes, do STF, para subsidiar decisão que a corte deverá tomar em breve para pacificar a questão.
De 2020 a março deste ano, foram ajuizadas 1,2 milhão de reclamações trabalhistas pleiteando vínculos na Justiça do Trabalho (8,3% do total). Em razão da profusão de casos, Mendes havia determinado em abril a suspensão de todos os processos que tratam da licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica com CNPJ.
“O problema da chamada pejotização é quando ocorrem as fraudes, como em casos de garis contratados como MEI individuais por prefeituras. Nestes casos, são trabalhadores sem condições de negociar com os empregadores”, afirma Lorena Guimarães, diretora do Departamento de Fiscalização do Trabalho do MTE.
Para Leonardo Rolim, ex-secretário de Previdência e ex-presidente do INSS, a questão da queda de arrecadação previdenciária com a pejotização poderia ser amenizada com a criação de faixas distintas de contribuição.
Ele defende que trabalhadores informais inscritos no Cadastro Único (que registra os mais vulneráveis) possam pagar a alíquota de 5%. Mas que ela deveria voltar para 11% para os demais; e que houvesse um desenho jurídico que englobasse os MEIs com faturamento mais próximo dos R$ 81 mil por ano, para que pudessem migrar em direção a outro regime mais parecido com o Simples.
Há, no entanto, muitos trabalhadores que têm optado pela pejotização em vez de se manterem formais ou procurar uma vaga CLT. Isso ocorre principalmente entre aqueles com maior escolaridade e que se enquadram no Simples -com limite anual de faturamento de R$ 4,8 milhões.
Segundo trabalho do economista Nelson Marconi, da Eaesp-FGV, há casos em que a remuneração dos chamados PJ chega ao dobro (ou mais do que isso) em relação a quem trabalha com a carteira assinada.
O estudo considera o rendimento médio das várias profissões analisadas e regimes igual a 1. Assim, é possível observar quanto recebem os empregados CLT e os por conta própria com CNPJ em relação à média 1 a partir de dados do IBGE.
“Nos casos em que há maior escolaridade e poder de negociação por parte dos trabalhadores, nota-se hoje no mercado uma preferência pela autonomia e pela liberdade de jornada de trabalho”, diz Marconi.







