Da Redação
A Câmara Municipal de Goiânia analisa um projeto de lei que pode mudar a rotina dos agentes de trânsito da capital. A proposta, de autoria do vereador Sanches da Federal (PP), autoriza a Prefeitura a permitir o uso de equipamentos de autodefesa não letais, como spray de pimenta e armas de choque (tasers), por servidores em serviço. O objetivo é garantir proteção aos agentes e à população em situações de risco.
O texto, que ainda está em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), determina que o uso será restrito a servidores identificados, uniformizados e capacitados técnica e psicologicamente. Cada ocorrência deverá ser registrada e justificada, sendo o uso autorizado apenas em casos de legítima defesa ou defesa de terceiros.
Segundo o autor do projeto, a iniciativa busca corrigir uma lacuna na segurança dos agentes, que frequentemente enfrentam agressões durante fiscalizações.
“Eles são cobrados para manter a ordem no trânsito, mas não têm nenhum instrumento de proteção. Hoje, o agente é praticamente um cidadão comum uniformizado”, afirmou Sanches.
Debate jurídico e constitucional
A proposta, no entanto, não passou sem controvérsia. A Procuradoria da Câmara apontou um possível vício de iniciativa, alegando que a matéria trata de servidores públicos e, portanto, seria competência exclusiva do Executivo municipal. Apesar disso, o texto segue tramitando por ter caráter autorizativo, ou seja, apenas libera a Prefeitura a regulamentar o uso — sem impor obrigações diretas.
O relator da CCJ, vereador Léo José (SD), já recomendou a aprovação. Contudo, a votação foi adiada após pedido de vistas feito por Denício Trindade (UB). O projeto deve retornar à pauta na próxima semana.
O advogado José Patrício Júnior, especialista em direito penal, pondera que a medida esbarra em um ponto sensível:
“A Constituição define claramente quem são os órgãos de segurança pública, e os agentes de trânsito não estão nesse grupo. Por lei federal, apenas esses órgãos podem portar armas, mesmo que não letais.”
Apesar da ressalva, o jurista reconhece que a função dos agentes os expõe a riscos constantes.
“Se até guardas municipais podem portar armas, por que não permitir o uso de instrumentos não letais pelos agentes de trânsito? É uma questão de coerência e de segurança pública”, completou.
Apoio do sindicato e da Prefeitura
O Sindicato dos Agentes de Trânsito de Goiânia (Sinatran) apoia integralmente a proposta. Para o presidente Eduardo Mariano, a medida é uma necessidade urgente.
“Nossos agentes trabalham nas ruas, lidam com motoristas exaltados e situações de conflito todos os dias. Hoje, eles não têm nenhuma ferramenta de defesa”, afirmou.
Ele lembra que cidades como Rio Verde e Brasília já implementaram medidas semelhantes. Em Rio Verde, os agentes passaram a usar armas de incapacitação neuromuscular, sprays de pimenta e coletes balísticos após decreto municipal.
A Secretaria Municipal de Engenharia de Trânsito (SET) informou que acompanha o debate “de forma técnica e criteriosa” e reconhece que as ameaças a servidores são recorrentes, o que reforça a necessidade de discutir formas de ampliar a segurança.
O vereador Sanches garante que o projeto já tem apoio do prefeito Sandro Mabel (UB).
“O prefeito me garantiu que, seja por lei ou por decreto, isso será colocado em prática. Os agentes não podem continuar desprotegidos”, disse.
Contexto nacional
A proposta se apoia na Lei Federal nº 13.060/2014, que trata do uso de instrumentos de menor potencial ofensivo por agentes de segurança. Embora os agentes de trânsito não sejam formalmente enquadrados nessa categoria, decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) vêm ampliando a interpretação de quem pode exercer funções complementares de segurança pública, como é o caso das guardas municipais.
Com o aumento da violência urbana e o número crescente de ataques a servidores públicos durante o trabalho, a discussão sobre autodefesa e limites de atuação desses profissionais deve ganhar força — dentro e fora das câmaras municipais.









