SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O psiquiatra e pesquisador Luis Augusto Rohde recebeu na sexta-feira (24) o prêmio Ruane por conquistas notáveis em pesquisa psiquiátrica infantil e da adolescência. O reconhecimento, concedido pela fundação americana de pesquisa Brain & Behavior, é considerado um dos principais da área e conhecido como o “Oscar da saúde mental”.
Rohde é um dos principais pesquisadores de TDAH do mundo e suas pesquisas influenciaram a prática clínica e o entendimento global da condição. Na sua concepção, suas principais contribuições envolvem a revelação da importância da genética molecular no diagnóstico, a identificação em adultos e uma ferramenta que permite estimar se os sintomas persistirão na vida adulta.
Além das pesquisas que já foram publicadas, ele diz que seu grupo agora está se debruçando sobre os critérios para o tempo adicional no Enem, que pessoas diagnosticadas com laudo formal têm o direito de solicitar. Essa nova pesquisa visa avaliar critérios para a elegibilidade para o acesso, porque, para ele, é necessário colocar a ciência antes da política, e não o contrário.
“Nós estamos colocando a ciência aqui [na América Latina] no mesmo patamar do que acontece nos países desenvolvidos”, diz o psiquiatra. “Mais importante do que isso é não só entender mecanismos neurobiológicos, genética molecular, questões de prevalência, mas poder ter uma ciência que se traduza em políticas públicas que façam a diferença para a população.”
Para além dos avanços já feitos, Rohde afirma que ainda há três lacunas em relação ao TDAH. A primeira é a capacitação dos profissionais da educação para que estejam habilitados para intervenções que podem ser feitas dentro da escola, integrando os aspectos da saúde mental nesse ambiente.
Outra capacitação necessária, a seu ver, é a de profissionais tanto da atenção primária à saúde, para mais rapidez do diagnóstico, e também de ambulatórios especializados, para o reconhecimento do diagnóstico de TDAH em adultos.
O TDAH é considerado pelos manuais diagnósticos como um transtorno do neurodesenvolvimento, e muitos profissionais colocam como critério essencial a presença dos sintomas desde a infância. Isso prejudica o diagnóstico e intervenção em adultos, afirma o pesquisador.
A terceira lacuna colocada pelo pesquisador é a falta da disponibilidade da medicação para o tratamento do TDAH pelo SUS (Sistema Único de Saúde). “Aquelas famílias numa situação de uma vulnerabilidade social maior não têm acesso às melhores intervenções, o que não acontece com as famílias de classe média e alta”, diz Rohde.
O projeto de lei 3118/2020 propõe a presença obrigatória de dois medicamentos para o tratamento do transtorno na saúde pública brasileira. A proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados e aguarda apreciação pelo Senado Federal.
Ele complementa que esse fato leva a uma distorção: há poucos lugares, como nos grandes centros, em que há o excesso de diagnósticos e de uso de medicação enquanto a realidade da saúde pública no Brasil é o subdiagnóstico, subtratamento e uma série de estigmas associados ao transtorno.
As pessoas que têm mais acesso ao tratamento ainda enfrentam estigmas, diz, mas o psiquiatra afirma que o Brasil ainda olha para questões de saúde mental como uma questão das elites.
“Um dos grandes desafios, no período de psicoeducação do TDAH, é poder mostrar que o uso da medicação é importante”, afirma. Rohde cita um estudo publicado no periódico JAMA que associa a medicação à menor mortalidade em pessoas diagnosticadas.
A mortalidade no TDAH, explica, não é por causas naturais, mas relacionada a acidentes por desatenção e a impulsividade. A impulsividade e a busca por sensações e novidades são pontos avaliados na pesquisa que o grupo de Rohde fez em 2010 com entregadores que dirigem motos em Porto Alegre.
Eles encontraram que, entre os participantes, a prevalência de TDAH era três vezes maior do que a população geral. Além disso, os que foram identificados com o transtorno tinham mais infrações e multas de trânsito.
Segundo levantamento feito pelo DeltaFolha com base em números de acidentes fatais do Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo), em dez anos os motociclistas passaram de 32% para 47% das mortes por trânsito na capital paulista.
O estudo considerando a saúde mental desse público inspirou a criação do projeto de lei 7483/10, que obriga o teste de déficit de atenção para motociclistas. A proposta foi aprovada pela Comissão de Viação e Transportes na Câmara dos Deputados, mas a proposta foi arquivada.






