BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Congresso Nacional aprovou, em votação relâmpago, a versão do senador Eduardo Braga (MDB-AM) para uma MP (medida provisória) do governo que muda regras de energia, impacta a conta de luz e prevê um benefício a uma usina a carvão do grupo J&F (dos irmãos Joesley e Wesley Batista).
A versão aprovada amplia o escopo da MP do governo, originalmente voltada a conter o impacto de propostas de energia aprovadas ou em discussão. Entre os principais pontos do texto original, estava o de conter o crescimento da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que reúne os encargos e subsídios do setor e é abastecida por meio da conta de luz, e trazer novas regras para uso do gás da União.
Braga manteve esses itens, com alterações, e inseriu dispositivos que promovem mudanças de forma mais ampla -como a contratação de novas usinas, o adiamento do cronograma para abertura do mercado livre de energia e até um novo mecanismo para o pagamento de royalties de petróleo ao poder público (que deve ser vetado pelo governo).
No plenário da Câmara dos Deputados, o texto avançou em apenas 18 segundos. Pouco tempo depois, em 5 segundos, o Senado Federal também deu aval à medida.
A votação sobre o mérito da MP ocorreu nas duas casas de forma simbólica, quando os parlamentares são convocados a permanecerem como se encontram caso concordem. Com os plenários esvaziados e apenas o partido Novo se manifestando contra, a deliberação foi concluída e o texto foi encaminhado para sanção presidencial.
Um dos pontos mais contestados por parlamentares durante a comissão mista foi a previsão de o país contratar usinas termelétricas movidas a combustíveis fósseis, com direcionamento a grupos específicos. O relator exigiu a compra, até 2040, de energia gerada a partir da usinas a carvão com contratos existentes em dezembro de 2022. A usina da J&F em Candiota, no Rio Grande do Sul, se encaixa nas regras previstas.
O senador Izalci Lucas (PL-DF) contestou a proposta de compra de energia a carvão, dizendo que ela “beneficia praticamente só uma usina”. Braga respondeu que a emenda que originou a iniciativa “é do senador Espiridião Amin, subscrita por toda a bancada do Rio Grande do Sul”, sendo em seguida desmentido pelo deputado Marcel van Hattem (NOVO-RS), que negou ter assinado o texto e criticou a iniciativa.
Braga afirmou ainda ter recebido representantes do Sul e o prefeito de Candiota, que teriam defendido a contratação: “Vi um prefeito literalmente ir às lágrimas por causa de famílias que perderam o emprego [com a falta de operação de Candiota]. Óbvio que as usinas a carvão não devem ser estimuladas, até por isso que ela tem prazo para acabar.”
Mesmo sob críticas, o texto avançou após Braga retirar a previsão de contratação obrigatória de uma série de outras usinas, a gás -embora a iniciativa continue viva em outra proposta em tramitação no Congresso. O beneficiado por essa contratação é o grupo de Carlos Suarez (fundador da antiga OAS, rebatizada de Metha após a Operação Lava Jato).
No caso do gás, o texto direcionava a contratação das usinas apenas a lugares onde Suarez é acionista das companhias estaduais monopolistas de distribuição do insumo. A compra do gás nesses locais, portanto, beneficia as empresas das quais ele é sócio.
Mesmo defendendo a iniciativa, Braga anunciou a retirada da contratação de usinas a gás citando que houve um acordo com o governo. Mas o próprio senador ressaltou que há outra proposta em tramitação pronta para ser votada pelo Congresso que pode retomar a iniciativa. Nesse caso, trata-se da derrubada de um veto presidencial (ou seja, os parlamentares têm a palavra final).
Procurados desde terça-feira (28), os grupos de Suarez e dos irmãos Batista não se pronunciaram sobre o assunto.
Representantes dos consumidores avaliam que há pontos positivos no relatório de Braga. Um deles, ainda que com ponderações, é a valorização de políticas voltadas ao armazenamento de energia -principalmente por baterias.
Especialistas defendem avanços nesse tema para que o país seja mais capaz de guardar a eletricidade gerada em momentos de pico de geração, mitigando a disparidade observada entre a alta geração durante o dia e a forte e súbita demanda no fim da tarde. Nesse ponto, o relator propôs um tratamento tributário diferenciado para a compra dos equipamentos.
Braga ainda seguiu a lógica do governo de estabelecer um teto para subsídios concedidos por meio da conta de luz, mas fez modificações que geram preocupações entre especialistas. Entre elas, o temor de que as medidas deixem brecha para um crescimento sem limites dos subsídios a políticas sociais -como a gratuidade da tarifa para classes mais baixas.
Em outra frente, o relator chegou a prever um novo regramento para os preços de referência do petróleo. O objetivo, disse, era dar mais realismo aos preços utilizados para calcular royalties do governo, considerando a “média das cotações divulgadas por agências de informação de preços reconhecidas internacionalmente”.
O item causou repercussões no mercado, que temia um maior pagamento de royalties, principalmente da Petrobras, ao setor público, em detrimento de menos dividendos para acionistas. Durante a reta final das discussões, no entanto, o senador Izalci anunciou em plenário um acordo para que o governo vete esse item.
MEDIDAS APROVADAS
– Carvão: prorroga operação de usina a carvão até 2040.
– Armazenamento: regulamenta o armazenamento de energia e concede regime diferenciado de tributos para baterias.
– CDE: cria limitação a partir de 2027.
– Mercado livre: define cronograma de 24 a 36 meses para abertura ao público de baixa tensão.
– Descontos tarifários: proíbe novos descontos nas tarifas TUST/TUSD para quem migrar ao mercado livre.
– Hidrogênio: adia o início do Programa de Hidrogênio de Baixo Carbono (PHBC) de 2028 para 2030.






