SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um novo estudo concluiu que a felicidade pode estar associada a uma queda da mortalidade de doenças crônicas como câncer e diabetes. Os pesquisadores encontraram em uma escala o mínimo necessário de bem-estar para que os supostos efeitos positivos apareçam. Mas faltam evidências para consolidar o achado, além do fato de que felicidade seria complementar a outros fatores muito importantes para diminuir a gravidade dessas condições.

O estudo, publicado na revista Frontiers in Medicine, avaliou dados de mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis, considerando a porcentagem de mortes por essas causas em indivíduos entre 30 e 70 anos de idade. Diabetes, câncer e complicações cardíacas entram nessa categoria de complicações.

Os dados compreenderam o período de 2006 a 2021 em 123 países. Essas informações foram utilizadas em uma perspectiva global. Ou seja, não houve análises divididas em nível nacional.

Os pesquisadores também levaram em conta outros fatores que poderiam influenciar uma maior ou menor taxa de mortalidade por essas condições. Consumo de álcool, prevalência de obesidade e exposição a partículas finas prejudiciais à saúde foram considerados de forma a controlar esses fatores e analisar de forma mais isolada a relação entre o bem-estar e a mortalidade por condições crônicas.

A medida de felicidade do estudo é baseada em um modelo desenvolvido pela Gallup, uma empresa norte-americana. Nesse padrão, a felicidade é medida em uma escala que vai de 0 a 10 a partir de relatos coletados em nível nacional. Por exemplo, em 2021, último ano da análise do artigo, a pontuação brasileira nessa escala foi de 6,01. Esse ponto está acima de 5,45, que é a média dos 123 países no período de 15 anos que o estudo foi baseado.

A partir dessa escala de felicidade e da mortalidade das doenças consideradas no estudo, os pesquisadores observaram que o aumento de 1% na percepção de bem-estar está associado a uma queda de 0,43% na mortalidade das condições crônicas como câncer e complicações cardiovasculares.

Mas isso só é válido a partir da pontuação 2,7 na escala. Ou seja, a felicidade não representou efeitos positivos contra a mortalidade por esse tipo de doenças em países com uma média de bem-estar menor que 2,7.

O achado é importante por trazer evidências do peso que o bem-estar populacional tem quando o assunto é saúde pública. No entanto, o estudo não é decisivo porque não é possível traçar uma relação entre causa, nesse caso, bem-estar, e efeito, que é a queda na mortalidade por doenças crônicas.

Além disso, a pesquisa não encontrou evidências que somente o aumento do bem-estar populacional, sem considerar outros fatores, seria suficiente para diminuir a mortalidade por doenças crônicas. “O artigo argumenta que a felicidade funciona como um ativo de saúde que complementa outras intervenções estruturais e comportamentais, como redução do uso nocivo de álcool, para reduzir a taxa de mortalidade”, afirma Iulia Iuga, professora do Departamento de Finanças e Contabilidade da “1 Dezembro 1918” Universidade de Alba Iulia, na Romênia, e uma das autoras do artigo.

Essa limitação da felicidade é nítida quando se considera outra conclusão da pesquisa: mesmo em países com altos índices de bem-estar, fatores como obesidade e poluição ainda representam um alto impacto na mortalidade por doenças crônicas. “Isso significa que, embora níveis mais elevados de felicidade estejam associados a efeitos protetores, esses efeitos não compensam totalmente o impacto de condições comportamentais e ambientais adversas”, completa Iuga.

No caso desses países, com alta qualidade de vida e índices de felicidade maiores que 2,7, a autora do estudo afirma que é importante adotar políticas públicas direcionadas a esses fatores de risco persistentes. Melhorar a qualidade do ar e desenvolver estratégias de combate a obesidade são exemplos.

Já para países que pontuaram abaixo de 2,7, Iuga defende que é prioritário fortalecer instituições governamentais, aumentar gastos com saúde e diminuir a instabilidade econômica. “Essas condições permitem que a felicidade e fatores de saúde se reforcem mutuamente e, eventualmente, façam a transição para o regime de maior felicidade e menor mortalidade identificado no estudo”, conclui.