BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Plano Clima é uma ferramenta de combate às mudanças climáticas e das principais entregas nacionais do Brasil para a COP30, a conferência sobre clima da ONU, mas corre o risco de chegar incompleto para o evento, após o Ministério da Agricultura —que ajudou a elaborar o documento— se voltar contra ele.

O impasse se dá por divergências quanto às diretrizes relacionadas à redução de emissões de CO² da área do agronegócio.

Segundo pessoas envolvidas nas negociações e documentos aos quais a reportagem teve acesso, o setor não aceitou uma proposta alternativa apresentada pelo Ministério do Meio Ambiente, e o texto ficou sem acordo.

A ministra Marina Silva, na última quinta-feira (23), acionou a Casa Civil para atuar como mediadora e tentar encontrar uma solução.

O Plano Clima precisa ser aprovado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por meio do CIM (Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima).

A única região do órgão prevista para acontecer antes da COP30 está marcada para a próxima segunda-feira (3) —mas pessoas envolvidas nas negociações admitem que há o risco de não haver solução até lá.

Procurado, o Ministério da Agricultura não respondeu. A Casa Civil afirmou que o assunto “está em tratativa, sem maiores informações para o momento”.

O Ministério do Meio Ambiente disse que o tema ainda está em discussão, mas ressaltou que o Plano Clima foi elaborado por 25 ministérios, é fundamental para a Política Nacional sobre Mudança do Clima e “funcionará como o guia das ações de enfrentamento à mudança do clima no Brasil até 2035” e o cumprimento do Acordo de Paris.

“Durante o período de consulta pública (28 de julho a 18 de agosto), diversos segmentos sociais e econômicos, entre eles, o da agricultura e pecuária, encaminharam ao todo 1.989 sugestões em relação aos planos setoriais”, afirmou a pasta, justificando as mudanças feitas.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, o Ministério da Agricultura trabalhou diretamente na elaboração do Plano Clima Setorial da Agricultura e Pecuária e aprovou a sua versão preliminar, que foi para consulta pública no início do ano.

Depois, porém, diante de críticas de entidades do setor, a pasta mudou de posição e passou a exigir mudanças no documento, inclusive em ofício enviado diretamente à ministra Marina Silva.

O Plano Clima é composto por sete diretrizes setoriais e diz quanto cada uma dessas áreas precisa reduzir em emissões de CO² para que o Brasil cumpra a sua NDC —a meta de descarbonização a que cada país se compromete junto à ONU.

No início de outubro, o Subex (sub-comitê do CIM, que cuida da parte executiva e técnica do órgão) aprovou cinco dos sete planos setoriais que compõe este documento maior.

Ficou faltando os do Agronegócio e de Conservação da Natureza, justamente onde reside o impasse: a alocação de CO² para cada área.

Cada plano setorial diz quanto aquela área tem que reduzir de CO², e quais atividades são consideradas na contabilidade, com base no ano de 2022.

No de Transportes, por exemplo, ficam fontes como aviação, navegação, uso de caminhões e ônibus, o que corresponde a 6% de todos os gases de efeito estufa produzidos no Brasil. No de Cidades, por sua vez, estão carros, motocicletas, e a construção civil, somando 7%.

Como o desmatamento corresponde a maior parte das emissões nacionais, o plano preliminar para o agronegócio ficou com 68% dessa parcela —e também com as metas de redução mais rígidas.

Mas o setor reclamou que parte dessa alocação foi injusta, e deveria ser repassada para outras áreas. Também afirmam que não foram contabilizadas atividades de reflorestamento.

O Ministério da Agricultura, que havia elaborado a versão preliminar do documento, passou a endossar as críticas, e o Ministério do Meio Ambiente propôs uma nova divisão, no final de setembro.

A alteração foi repassar a atividade de assentamentos ou áreas quilombolas, que estavam sob guarda-chuva do guia de Agricultura e Pecuária, para o de Conservação da Natureza —que antes abarcava apenas áreas da União, e que foi rebatizado para Terras Públicas e Territórios Compartilhados.

Assim, a alternativa reduziu para 49% as emissões contabilizadas no plano do agro, e aumentou de 2% para 21% no segundo.

Mas as mudanças não foram bem recebidas pelo Ministério da Agricultura, e o impasse permanece.

Nesta quinta (30), está marcado para acontecer uma reunião do Subex, instância na qual estes planos precisam ser aprovados, antes de serem submetidos ao CIM.

Com a divergência, a tendência é que os documentos fiquem travados, o que ameaça o objetivo do governo Lula de apresentar o Plano Clima completo durante a COP30, em novembro —parte do Executivo defende que seja apresentada apenas a parte consensual das diretrizes.

Um ofício do Instituto Pensar Agro, o principal articulador do setor no Congresso Nacional, defende que o plano não seja publicado, que seja criado um documento específico só para tratar de desmatamento e que haja incentivos para o setor cumprir com as diretrizes.

O documento também demonstra a preocupação que a atividade, em razão deste plano, perca sua classificação de sustentabilidade —e que é um dos trunfos dos produtores brasileiros diante de mercados de outros países.

A alternativa proposta pelo Ministério do Meio Ambiente também aumenta de 36% para 70% a meta de redução de emissões do Plano de Agricultura para o ano de 2030.

Em razão da realocação das atividades, o agora batizado Plano de Terras Públicas e Territórios Compartilhadas reduziu sua meta de 734% para 141%.