SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou nesta quarta-feira (29) que suas forças conduziram um teste bem-sucedido do Poseidon, conhecido como o “torpedo do Juízo Final” por suas características apocalípticas.
Foi o segundo anúncio de um ensaio com uma das superarmas anunciadas em 2018 pelo russo, que chegam a 2025 como uma realidade com graus diversos de sucesso e operacionalidade, muito segredo e propaganda.
No domingo (26), os russos disseram que um teste do Burevestnik, um míssil de cruzeiro com propulsão nuclear e autonomia teoricamente ilimitada, assim como o Poseidon, havia ocorrido com sucesso.
Com a Guerra da Ucrânia sob forte impasse e pressão americana por meio de sanções econômicas inéditas sob Donald Trump, Putin recorre novamente à lembrança de seu papel como dono do maior arsenal nuclear global e de novas armas para empregá-lo.
Tudo isso remete a 1º de março de 2018, outra era geológica na política global, quando um triunfante Putin anunciou que iria dispor de seis novos armamentos para asseverar seu lugar no mundo. “Ninguém queria nos ouvir. Agora ouçam”, disse.
Envoltas pelo natural segredo e, depois, pelas brumas da invasão da Ucrânia, as ditas superarmas ou armas invencíveis avançaram, apesar do natural ceticismo de observadores.
O teste do Poseidon, assim como o do Burevestnik, foi revelado sem provas além da palavra de Putin. O do míssil, que empresta em russo o nome da ave marinha petrel, ocorreu no último dia 21. “Nenhum país tem uma arma parecida com essa”, disse Putin.
O tom de chacota e o ceticismo generalizado do tempo daquele discurso anual à Assembleia Federal russa ficaram para trás. O presidente americano, Donald Trump, chamou o ensaio de “inapropriado” e disse que Putin deveria acabar com o conflito no vizinho “em vez de testar mísseis”.
A Otan, aliança militar ocidental que se prepara para uma guerra de fato com Moscou, já tem um nome para ele: Skyfall, algo como céu em queda em inglês.
O Burevestnik recuperou uma ideia dos anos 1960 dos Estados Unidos e da União Soviética: um míssil que voava alimentado por um pequeno reator nuclear, tornando sua autonomia infinita na prática. Não deu certo por questões técnicas e porque falhas poderiam espalhar radioatividade de forma indesejada.
Segundo o chefe do Estado-Maior russo, Valeri Gerasimov, o míssil voou 14 mil km em cerca de 15 horas. Segundo o serviço secreto da vizinha Noruega, monitores sugerem que o teste ocorreu em torno de Novaia Zemlia, conhecido campo de testes nucleares do Ártico russo na Guerra Fria.
Não houve ainda registro de emissões radioativas, o que sugere que, se de fato o míssil funciona, os russos solucionaram a questão de como fazer o fluxo de ar passar pela área do reator miniaturizado sem levar consigo partículas perigosas.
“É uma revolução, pelo que sabemos. Ele pode voar baixo, até 25 metros de altitude, seguindo o terreno. É uma arma muito difícil de ser detectada”, disse por mensagem o analista militar moscovita Micha Barabanov.
Não concorda com ele seu compatriota Pavel Podvig, referência no instituto da ONU para questões armamentistas que vê no fato de o míssil ser subsônico uma vulnerabilidade. “É uma peça de propaganda”, escreveu no X.
Uma hipótese de ambos os analistas é o de o míssil ser um instrumento para o caso de ataque nuclear maciço ao território russo, que garanta uma retaliação quando submarinos, a usual força para isso, estiverem exauridos ou anulados.
MISTÉRIO E MARKETING CERCAM ARMAS
O Burevestnik, assim como outras superarmas, tem função dupla: pode empregar ogivas convencionais ou atômicas. Putin disse que ele será posto em produção, mas aí entram os quesitos marketing e mistério.
O próprio russo já havia dito que os ensaios do míssil estavam prontos, no fim do ano passado. Antes, houve defeitos e uma explosão que matou cinco cientistas numa balsa de lançamento no mar de Barents, com picos de contaminação radioativa.
O mesmo grau de dúvida cerca outras das ditas armas invencíveis, a começar pelo Poseidon.
“Sua força excede significativamente mesmo aquela do nosso mais promissor míssil intercontinental, o Sarmat”, disse Putin. Barabanov afirma que os dados disponíveis mostram que o reator nuclear gera energia para um motor elétrico levar o míssil a 130 km/h, o dobro de submarinos.
Seu alcance é teoricamente ilimitado, enquanto o Sarmat atinge alvos a 18 mil quilômetros, sendo o mais poderoso veículo de entrega de ogivas nucleares do planeta, com talvez dez ogivas de até 750 kilotons. Já o Poseidon pode levar uma bomba de 2 megatons até inimiganáveis 100 megatons, desenhada para causar “tsunamis radioativos” perto da costa inimiga.
A Rússia já havia dito que iria colocar o Poseidon em operação este ano, apesar de ter apenas um submarino capaz de lançá-lo. Agora, na confusão usual, diz que o testou. O Sarmat é o mesmo caso: está oficialmente em operação, mas especialistas sugerem que ele só tenha feito um voo bem-sucedido em 2022.
Já dos planadores hipersônicos Avangard há estimadas 12 unidades. Ele é montado no lugar da ogiva de um míssil intercontinental e atinge velocidades enormes sem deixar a atmosfera, manobrando até chegar ao alvo.
Outra superarma, o míssil aerobalístico Kinjal, é empregado na Ucrânia. Não é, contudo, tão invencível, tendo sido derrubado em algumas ocasiões por baterias americanas Patriot de Kiev.
Por fim, daquela safra, há o canhão de defesa antiaérea a laser Peresvet, do qual especialistas julgam haver apenas cinco em operação, protegendo lançadores de mísseis.
Outros dois armamentos entraram na conta de invencibilidade do Kremlin após 2018. O míssil antinavio hipersônico Tsirkon entrou em serviço em 2023 e foi testado em lançamento por terra contra a Ucrânia.
A nova estrela da turma é o Orechnik, um míssil balístico de alcance intermediário que causou furor em novembro do ano passado ao ser lançado contra o vizinho. A Belarus diz que receberá um regimento em dezembro.




