SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O líder da oposição de Camarões, Issa Tchiroma Bakary, prometeu resistir até a “vitória final” na noite desta terça-feira (28), um dia após a ditadura de Paul Biya, no poder desde 1982, confirmar que o líder conseguiu seu 8º mandato consecutivo nas eleições de 12 de outubro, com 53,7% dos votos.

“A verdade das urnas é clara. Vencemos esta eleição por ampla maioria. Esta vitória não é apenas minha, pertence ao povo camaronês”, disse Tchiroma, que reivindica a vitória no pleito por 54,8% dos votos, de acordo com uma apuração própria. “Permanecemos unidos, mobilizados e continuaremos resistindo até a vitória final.”

A convocação de apoiadores ocorre no momento em que a sociedade camaronesa está conflagrada pela disputa entre os outrora aliados -ex-porta-voz do regime, Tchiroma rompeu com Biya no início deste ano antes de montar uma campanha que atraiu multidões e conquistou apoio de uma coalizão de partidos de oposição e grupos civis.

O grupo Stand up for Cameroon afirmou nesta quarta (29) que a repressão aos protestos matou pelo menos 23 pessoas desde o fim de semana, número que a agência de notícias Reuters não pôde confirmar de forma independe e que o regime não comentou.

Apesar da violência, os manifestantes não dão sinais de que vão recuar. Também nesta quarta, eles voltaram às ruas de Douala enquanto a maior cidade do país ainda estava repleta de destroços e pneus queimados e lojas começavam a reabrir gradualmente após dias de protestos.

O Ministro do Interior, Paul Atanga Nji, acusou Tchiroma de incitar a violência por declarar sua vitória um dia após o pleito. “Este candidato irresponsável, movido pelo desejo de levar adiante o plano de perturbar a ordem pública, emitiu repetidos apelos nas redes sociais incitando agitação civil”, afirmou em um comunicado.

Ele disse ainda que, em Douala, palco da maior parte dos protestos, muitas propriedades públicas e privadas foram vandalizadas e agentes de segurança ficaram feridos durante confrontos. Segundo o governador da região, mais de 200 pessoas foram presas em conexão com os protestos.

Nji afirmou também que pequenos grupos “frequentemente sob influência de drogas” saquearam lojas e incendiaram prédios públicos, sem fornecer nenhuma evidência de que os manifestantes haviam consumido substâncias ilícitas.

Segundo o Stand up for Cameroon, manifestantes presos estavam sendo mantidos em condições desumanas. “Os depoimentos dos advogados descrevem rostos inchados, hematomas e tratamento humilhante infligido a cidadãos que buscavam exercer seus direitos constitucionais”, afirmou a organização em um comunicado.

Um vídeo que circula nas redes sociais mostra forças de segurança carregando um corpo inerte para a traseira de um caminhão militar. Em outro vídeo, manifestantes gritam: “Devolvam o corpo!”. A Reuters não pôde verificar a autenticidade das ações, e as forças de segurança direcionaram todas as perguntas sobre as acusações ao regime.

Mais velho chefe de Estado do mundo em exercício, Byia pode chegar aos 99 anos de idade ainda no cargo caso a vitória se concretize. Analistas esperavam que seu controle sobre as instituições estatais e uma oposição fragmentada lhe dessem vantagem na eleição, apesar do crescente descontentamento público com a estagnação econômica e a uma grave crise de segurança.

Os resultados, porém, são alvo de uma guerra de versões diante da opacidade dos órgãos camaroneses.

Uma semana após afirmar que ganhou o pleito, Tchiroma publicou em suas redes sociais as atas que, segundo ele, comprovam os votos. O político diz ter os documentos de 18 dos 58 departamentos do país, o que representaria quase 80% do eleitorado, e afirma ter ganhado em todas essas regiões. No entanto, observadores dizem que algumas das cifras mostram taxas de participação maiores do que o número de eleitores registrados nas regiões em questão.

O Conselho Constitucional, por sua vez, tampouco é visto como uma fonte neutra, embora seja o responsável por proclamar os resultados. O órgão, cuja criação estava prevista na Constituição de 1996 e é a instância máxima de interpretação de leis e de regulação eleitoral do país, foi criado apenas em 2018 e tem todos os seus 11 membros nomeados por Biya.

Outros líderes da oposição também alegaram fraude generalizada, mas a decisão do conselho é definitiva e não está sujeita a recurso.