SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Tribunal Regional Federal da 4ª Região suspendeu uma decisão que determinava o fim da política de cotas para pessoas transgênero na Furg (Universidade Federal de Rio Grande) e o cancelamento das matrículas realizadas por meio dela.

Nesta terça-feira (28), o desembargador Luís Aurvalle acatou recurso da instituição e determinou que os estudantes beneficiados com a reserva de vagas continuem seus cursos até o julgamento final da apelação. Eles teriam seu vínculo encerrado em dezembro deste ano.

O magistrado entendeu que “a legislação brasileira contempla autorização para que as instituições públicas de ensino possam definir os critérios de seleção e admissão de estudantes, inclusive com a possibilidade de instituição de programas de ação afirmativa”.

A 2ª Vara Federal de Rio Grande havia determinado a anulação do ato administrativo que criou cotas para transexuais na FURG em 31 de julho. A política foi criada em 2023.

Na decisão, o juiz substituto Gessiel Pinheiros de Paiva, da 2ª Vara Federal de Rio Grande, argumenta que a ação afirmativa não foi bem fundamentada e viola a isonomia ao favorecer uma população. “Foi criada uma vantagem não justificada para uma determinada categoria de pessoas, com base em característica pessoal”, escreveu o magistrado no despacho, da última sexta-feira (25).

Ele afirma ser insuficiente a justificativa baseada no número de assassinatos de pessoas trans no Brasil, como fez a Furg. O país, segundo levantamentos de organizações sociais, é o país que mais mata essa população.

Paiva, usando dados da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), diz que ocorreram 781 assassinatos de pessoas trans entre 2017 e 2021 —a média foi de 156 casos por ano.

O magistrado compara os resultados ao número geral de homicídios no país. Estima-se, segundo o Atlas da Violência, que 616.095 pessoas foram assassinadas que entre os anos de 2011 e 2021, correspondendo a pouco mais de 61 mil pessoas mortas anualmente.

“Portanto, se constata que o número de assassinatos de pessoas trans no Brasil não possui nada de diferente (ao contrário, é ainda várias vezes menor em percentuais) do que a violência geral que assola o país, não havendo como tais dados serem considerados como relevantes para instituição de políticas afirmativas de ingresso em universidade”, concluiu o juiz.

Ele ainda ressaltou que universidades federais têm autonomia para elaborar suas próprias normas internas, mas que a autonomia para criação de políticas afirmativas não é livre e irrestrita.

A decisão determinou o fim do vínculo dos alunos aprovados por meio das cotas trans ao fim deste ano. De 2023 a 2025, a Furg reservou 30 vagas ao grupo.

A ação pública que motivou o despacho foi movida pelos advogados Bruno Cozza Saraiva e Djalma Silveira da Silva há dois anos. Nenhum deles respondeu aos contatos da reportagem.

No pedido, os homens argumentam ser a promoção de cota para trans “política ideológica que, há tempos, vem ocupando as universidades brasileiras” e não haver na lei a previsão para esse tipo de programa.

Em 2023, uma liminar da 2ª Vara de Justiça de Rio Grande suspendeu edital que criava vagas exclusivas para o ingresso de transgêneros na Furg. Dias depois, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região derrubou a decisão.