SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O emprego de drones na reação dos traficantes do Comando Vermelho à operação da polícia do Rio na quarta-feira (28) foi o primeiro grande episódio do tipo envolvendo forças de segurança no estado. Não será o último.

O uso dos pequenos robôs voadores segue a lógica dos campos de batalha da Guerra da Ucrânia, que em três anos e oito meses mudou a forma com que o combate próximo se dá.

Até então, drones militares eram pensados como aviões. Dos famosos Predator americanos da chamada Guerra ao Terror até os modelos de ataque turcos que fizeram fama no conflito entre o Azerbaijão e a Armênia em 2020, a prevalência era de aparelhos grandes e custosos.

Esses drones seguem voando mundo afora, inclusive nos céus ucranianos, mas a diferença foi feita na gestão microscópica da guerra: modelos que custam poucas centenas de dólares foram adaptados para missões de vigilância e, logo, de ataque.

Em vez de disparar mísseis Hellfire a R$ 800 mil cada, jogam antigas granadas antipessoais soviéticas que podem custar menos de R$ 30. Se forem abatidos ou capturados, o prejuízo não excede R$ 2.500 nos modelos mais simples, ante R$ 28 milhões de um grande drone turco Bayraktar TB2.

A linha de frente, que antigamente podia ter uma “no-man land” de centenas de metros, hoje pode ter quase 50 km. O que se move dentro está sujeito a ser atingido por uma miríade de munições penduradas nos robozinhos, como a Folha de S.Paulo viu dos dois lados da fronteira.

Quando os sistemas de interferência eletrônica ficaram muito sofisticados, os russos tomaram a dianteira e adaptaram um brinquedo chinês, como a reportagem mostrou no começo do mês: um drone comandado por quilômetros de fio de fibra óptica, indevassáveis senão por meios físicos.

A realidade logo se transferiu para o crime. Cartéis de drogas no México fazem uso notório de drones. No Brasil, os primeiros relatos começaram a surgir no ano passado, com evidências de que o tráfico estava à frente da polícia taticamente.

Em janeiro e em julho, as forças estaduais apreenderam armas antidrone nas mãos de criminosos. Em ao menos uma ocasião, foram encontrados modelos da empresa ucraniana Kvertus, o KVS G-6, um canhão eletrônico que desabilita sinais de controle e vídeo de drones a até 6 km de distância.

Em abril, a empresa esteve no Rio para tentar vender seus produtos para a polícia, mas não teve muito sucesso, segundo disse à época à reportagem. Pelo visto, a concorrência já estava na frente, com os caminhos do contrabando.

Eles passam por traficantes de armas do Leste Europeu para lugares como o Paraguai e aí entram no Brasil. São produtos caros: na prateleira, um KVS G-6 sai por R$ 63 mil. Mas a via mais barata já estava em uso.

Em julho do ano passado, a polícia do Rio apreendeu um drone de R$ 20 mil da empresa chinesa DJI, líder do mercado, adaptado para liberar granadas sobre milicianos pelo CV na zona norte da cidade. Ainda assim, era um aparelho caro, e o estado disse não estar certo sobre seu uso.

O que se viu pelas imagens disponíveis foi o que parecia ser um quadricóptero de R$ 3.000 liberando uma carga incandescente. Não era uma granada, podendo ser munição traçante ou explosivos simples, mas a polícia diz que explosivos foram lançados —os dispensadores, garras que seguram o armamento, saem por R$ 120.

Tão importante quanto ter as armas é treinar alguém para usá-las. A operação Buzz Bomb, que a Polícia Federal realizou em 2024, prendeu ao menos um militar da Marinha no Rio que dava cursos para os operadores do CV, sugerindo a popularização da arma.

Anular drones sobre ambientes urbanos é um problema, pelo risco em solo. Se quiser tomar a dianteira, a polícia terá de investir nas tecnologias de captura eletrônica dos drones, que tomam controle do aparelho.

De tempos em tempos surge um boato, ou uma prova, de uma nova e poderosa arma na mão dos traficantes —lançadores de granada, metralhadoras capazes de derrubar helicópteros. Mas é provável que o futuro ofereça uma trilha semelhante à dos campos europeus.