SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – A operação policial que deixou mais de 100 mortos no Complexo da Penha, no Rio de Janeiro, teve como alvo integrantes do CV— facção que nasceu em 1979 em um presídio conhecido como o “caldeirão do inferno” ou “caldeirão do diabo”.

COMO ERA O PRESÍDIO

O complexo penitenciário Cândido Mendes, em Ilha Grande (RJ), foi construído em 1884. O apelido “caldeirão do inferno” foi dado por causa de cenas de violência que aconteceram no local.

A mais de 100 quilômetros da capital, a ilha era usada, na época do império, para isolar pessoas com doenças contagiosas, como hanseníase. Ao longo do tempo, foram criados espaços na ilha para presos.

As condições eram precárias, com superlotação, doenças e relatos constantes de agressões entre internos e agentes. Preso em 1936 por envolvimento com a Intentona Comunista, o escritor Graciliano Ramos, autor de “Memórias do Cárcere”, ficou detido no local. Ele começou a redigir na cela o livro que descreve o cotidiano e as humilhações impostas aos detentos.

Em 1963, o governador da Guanabara, Carlos Lacerda, criou a Penitenciária Cândido Mendes, que depois passou a se chamar Instituto Penal Cândido Mendes. Na ditadura militar, o local recebeu presos políticos, como membros da ALN (Aliança Libertadora Nacional). A ideia era isolar os presos e dificultar as visitas.

No fim da década de 1970, detentos do presídio começaram a se unir para reivindicar melhores condições e denunciar espancamentos e maus-tratos. Com o tempo, a organização passou a adotar códigos internos de disciplina e solidariedade inspirados nos militantes políticos, que influenciaram o comportamento do grupo dentro e fora do presídio.

O grupo foi batizado inicialmente de Falange da LSN, em referência à Lei de Segurança Nacional. Depois passou a se chamar Falange Vermelha e, finalmente, Comando Vermelho —nome que apareceu pela primeira vez em um relatório policial de 1979.

FUGA E EXPANSÃO

Um ano depois, em 1980, três presos fugiram da ilha em um barco e levaram a estrutura do grupo para o continente. Entre eles estava José Jorge Saldanha, o Zé Bigode, que enfrentou 400 policiais por mais de 12 horas em confronto na Ilha do Governador — episódio retratado no filme “400 contra 1” (2010). Foi o primeiro grande embate da facção fora do presídio e o ponto de partida da sua expansão.

O CV passou a dominar os morros do Rio ao longo das décadas. O cenário começou a mudar a partir do avanço das milícias na primeira década dos anos 2000. A facção atualmente não é mais soberana, como mostram os dados do Geni-UFF (Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos, da Universidade Federal Fluminense). De acordo com os dados, a facção domina 24,2% dos bairros do Rio, ficando atrás do poder das milícias, que controlam 25,5% dos bairros carioca.

O presídio foi implodido em 1994 e deu lugar ao Museu do Cárcere. O acervo do Cândido Mendes integra o museu, administrado pela Uerj.