SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Equipamentos públicos de saúde são duramente afetados por operações policiais como a realizada nesta terça-feira (28) no Rio de Janeiro, que deixou ao menos 64 pessoas mortas.
Um relatório produzido pelo Unicef, em parceria com a ONG Redes da Maré, mostra que uma crise na saúde é gerada em dias de ações, não só devido ao fechamento das unidades básicas, mas pelo medo generalizado da população em deixar suas casas.
Segundo o governo Cláudio Castro (PL), as forças de segurança atuaram nos complexos do Alemão e da Penha contra a expansão territorial do Comando Vermelho. A operação já é considerada como a mais letal da história do estado, deixou escolas fechadas e causou caos na cidade.
O estudo focou as análises na vacinação de 15 mil crianças no Complexo da Maré, na zona norte da capital. Em dias normais de 2024, as UBSs do complexo aplicavam, em média, 187 vacinas em crianças. Nos dias de operações intensas, em que ao menos uma clínica era fechada, o número caiu quase 90%, para 20 doses. Mesmo quando todas as unidades permaneceram abertas, a vacinação caiu 77%, para 43,6 doses.
Em 2024, ocorreram 42 operações policiais com tiroteios e outras dinâmicas por 37 dias. Em 90% das operações policiais realizadas neste ano, veículos blindados circularam nas proximidades das unidades de saúde, configurando uma barreira concreta e simbólica ao acesso da população a esses serviços, diz o relatório.
No primeiro semestre de 2025, nos 118 dias “regulares”, a média de doses aplicadas por dia foi de 176,7 e a média diária de crianças vacinadas foi de 76. Em dias em que houve operação policial e em que pelo menos uma das unidades fechou totalmente, o número médio de doses aplicadas cai para 21,1, enquanto o de crianças vacinadas cai para 11. É uma redução de 85% no número de crianças vacinadas por dia, enquanto a queda de doses aplicadas sofre redução de mais de 85%.
Marcos Kalil, oficial de proteção do Unicef no Brasil, diz que a elaboração do estudo visa mostrar o impacto de um modelo não protetivo de segurança pública, que colide com os outros direitos sociais. “A segurança precisa contemplar o ponto de vista da saúde e da educação.”
De um modo geral, a cobertura de vacinação do complexo da maré é extensa, devido aos esforços da população, diz Carolina Dias, coordenadora do eixo sobre direito à saúde da Redes da Maré. Nos dias de operação, por outro lado, a comunidade é fisicamente impedida de vacinar as crianças.
“A gente perde dias em que poderíamos melhorar ainda mais essa cobertura. Perder a oportunidade vacinal dessas crianças pode sim piorar a situação de saúde coletiva”, diz Carolina.
Segundo o relatório, a solução a curto prazo é a busca ativa das crianças e das mães nos dias subsequentes. Mas, os representantes dizem que a situação sobrecarrega o sistema de saúde, já que todas as consultas canceladas e vacinas adiadas precisam ser retomadas, dobrando o trabalho.
Uma alternativa já adotada pela Prefeitura do Rio de Janeiro, em parceria com a Redes da Maré, a Fiocruz e o Ministério da Saúde, é o Saúde Digital, um projeto-piloto que disponibiliza teleconsultas nos dias de operação.
O relatório também defende ampliar a oportunidade vacinal para outros espaços, para além das unidades de saúde. “Tem o programa de saúde na escola, a gente poderia pensar como aplicar para a rede de assistência social”, diz Carolina.
O estudo diz ainda que é necessário integrar as políticas de segurança às de saúde. O representante do Unicef cita melhorias com a ADPF 635, ação conhecida como “ADPF das Favelas”, que pede medidas para garantir os direitos fundamentais dos moradores frente às operações policiais.
“A ADPF 635 determinou a criação de algumas instâncias a nível estadual e federal de governança compartilhada entre a educação e a segurança. Nós entendemos que essas instâncias precisam ser permanentes e precisam incluir a saúde”, diz.




